domingo, 27 de maio de 2012

A cobiça de Cachoeira pelas obras do Entorno

Gravações da Polícia Federal revelam a articulação do bicheiro para assumir o PAC nas cidades ao redor do Distrito Federal, um pacote de investimentos estimado em R$ 7 bilhões

Josie Jeronimo, Denise Rothenburg

Em uma das conversas com Cachoeira, Abreu (D) diz que não pode romper com Perillo

Antes mesmo de ser oficialmente lançado, o chamado Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) do Entorno já havia sido dividido em um consórcio de empresas em que a Delta Construções teria o comando do grupo. Dados das investigações da Polícia Federal cruzados com apurações da CPI criada para apurar a rede de influência de Carlinhos Cachoeira revelam que, além de o bicheiro pressionar políticos aliados para emplacar a Delta como líder do consórcio, o contraventor queria indicar obras para o projeto executivo do pacote de investimentos federais estimado em R$ 7 bilhões.

O ex-diretor da Delta Cláudio Abreu, em uma das escutas, explica a Cachoeira que o projeto para analisar a viabilidade de uma das obras custa aproximadamente R$ 4 milhões e pergunta ao bicheiro se ele fará parte do grupo. "Eu falei com o chefe (Fernando Cavendish) e ele falou assim, que era para você guardar esse dinheiro, era pra você aplicar lá no Entorno. Que o projeto lá vai exigir uns quatro milhões e meio. Ah, eu vou te adiantar, é porque está nós, você, a Galvão e a Odebrecht, né? Os cara tava querendo dividir os 25% seu em participação e nos íamos consultar você pra saber, você quer ficar é com a gente, né? (sic)", questiona Cláudio Abreu.

Gravações realizadas com autorização judicial em análise na CPI mostram que as mudanças ocorridas no âmbito do Ministério dos Transportes, com a queda de Alfredo Nascimento, puseram freio nas pretensões da quadrilha. O Planalto mandou parar a análise de projetos de viabilidade na construção de trechos rodoviários e de linha férrea que interessavam ao grupo de Cachoeira. Com a perda de influência da quadrilha, as outras empreiteiras que brigavam pela dianteira nos projetos do PAC do Entorno tomaram a frente nos projetos. A mudança de planos fez com que a relação entre o grupo do contraventor e o governador de Goiás, Marconi Perillo, estremecesse, pois o comando das obras supostamente foi uma promessa do tucano à época da eleição, quando encontrou dificuldades financeiras para reagir ao concorrente Iris Rezende (PMDB-GO) e pediu apoio da empreiteira.

Em uma das conversas com o bicheiro, Cláudio Abreu reclama de Perillo com Cachoeira, mas afirma que Cavendish o orientou a não romper relações com o governador. Em outra gravação, o ex-diretor da Delta afirma que chegaram até a dizer que o senador Demóstenes Torres (sem partido-GO) era sócio oculto da empresa para melhorar a correlação de forças com as outras empreiteiras. As reclamações de Cachoeira chegaram ao ouvido de Demóstenes. "Doutor, tô recebendo uma notícia aqui, daquele negócio do Entorno lá, vou largar mão daquilo, viu? A Odebrecht falou lá que tem acordo com todo mundo, viu? Eles que mandam, eles querem ser o líder, aí eu falei pro cara aqui, agora eu vou abrir mão".

O lobby da empreiteira pelos bilhões do governo no projeto do Entorno interferiu, até mesmo, nas prioridades definidas nos projetos executivos elaborados pelos governos do Distrito Federal e Goiás. Enquanto o executivo goiano aposta em grande obras viárias e ferroviárias, com a construção e duplicação de rodovias, nova roupagem para a criação do chamado "Expresso Pequi", linha férrea ligando Brasília e Goiânia, o Distrito Federal optou por defender a construção de um anel viário que ligasse grande parte das cidades e a melhoria de estruturas prediais da área de saúde e programas habitacionais. A remodelagem do "Expresso Pequi" era considerado o carro-chefe do governo goiano no projeto executivo do PAC do Entorno. No âmbito do Ministério dos Transportes, a Valec já havia se movimentado para iniciar pesquisas de viabilidade da proposta.

Depoimento

O ex-diretor da Delta Centro Oeste Cláudio Abreu também comparecerá a CPI nesta semana. Ele é esperado na quarta-feira, às 10h. Ele não deve responder às perguntas dos parlamentares, como fez Cachoeira na última terça-feira. A ministra do STF Carmen Lúcia concedeu liminar reconhecendo seu direito de ficar calado. Cláudio Abreu está preso e é investigado por usar a empresa para favorecer aliados do bicheiro.

"Eu falei com o chefe (Fernando Cavendish) e ele falou assim, que era para você guardar esse dinheiro, era pra você aplicar lá no Entorno. Que o projeto lá vai exigir uns quatro milhões e meio"
Cláudio Abreu, ex-diretor da Delta no Centro-Oeste, em conversa com Carlinhos Cachoeira interceptada pela Polícia Federal

Contrato de gaveta

A CPI instalada no Congresso cruza informações dos contratos da Delta com a quebra de sigilo de outras empresas de construção civil envolvidas no esquema. Os parlamentares foram alertados de que a empreiteira costumava utilizar o CNPJ de outras empresas para concorrer em licitações e depois assinava contratos de gaveta para transferir serviço para a Delta. Em uma das gravações da Polícia Federal, Carlinhos Cachoeira e Cláudio Abreu falam sobre a utilização do CNPJ da empreiteira Construtora Rio Tocantins (CRT), do empresário Rossine Guimarães, que também é sócio do contraventor. "Podemos usar a CRT na conversa aí, entendeu, depois vamos fazer o contrato, com outra empresa, com a Delta, entendeu, põe a Delta na frente de tudo e a gente tem um contrato de gaveta, entendeu?", revela Cachoeira em um dos grampos.

FONTE CORREIO BRAZILIENSE

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