quarta-feira, 2 de maio de 2012

Deslocamento ainda sutil do poder no PT:: Rosângela Bittar

Fatos políticos que ocorreram nos últimos cinco anos têm provado que há, realmente, apesar das negativas, um deslocamento de poder no PT. Como existe, ainda, equilíbrio entre as forças, a mudança é sutil. Ora algo confirma que os controles mudaram de mãos e localizam-se mesmo fora de São Paulo, ora o tradicional grupo Articulação paulista mostra a força de seus nervos.

Desde 2005, com o mensalão, o PT, majoritariamente localizado em São Paulo, colhido por aquele escândalo, passou a atuar mais discretamente. Os envolvidos ficaram na retaguarda enquanto outros do próprio grupo, preservados no processo, apresentaram-se às tarefas públicas. Assim, por exemplo, deixaram de ter papel secundário políticos como Cândido Vacarezza e Paulo Teixeira, assumindo funções públicas e formais de representação do PT, principalmente no Congresso Nacional.

Mesmo ali, entretanto, os petistas da Bahia, do Rio Grande do Sul, de Pernambuco, foram emergindo com mais vontade. O PT de Minas Gerais e do Rio de Janeiro, de onde se esperava que fossem sair as lideranças principais na substituição dos paulistas, não teve condições de fazê-lo. São regionais problemáticas, principalmente a de Minas, profunda e radicalmente divididas, com interesses e métodos políticos absolutamente conflitantes, e acabaram dando lugar aos nordestinos e sulistas.

Enquanto o ex-presidente Lula chefiou o governo, o grupo paulista pareceu ter mais fôlego do que tem agora. Conseguiu manter seu poder no Executivo e os cargos do governo no Legislativo. Ainda assim outras bancadas foram assumindo maior protagonismo. Até que, com a presidência Dilma Rousseff, ela própria uma petista recente, que precisou da ajuda de todos, do grupo paulista, principalmente, para ter seu nome vendido à militância Brasil afora, a Bahia, Sergipe, Pernambuco e Rio Grande do Sul sentiram-se mais confortáveis para avançar.

Não só na Esplanada, como no Congresso. O deputado Marco Maia (RS) conquistou a presidência da Câmara, a ex-senadora e ministra da Pesca, Ideli Salvatti foi alçada a ministra das Relações Institucionais, o PT do Paraná ocupou dois cargos maiorais na República, o de ministro das Comunicações e o de ministra Chefe da Casa Civil, com Paulo Bernardo e Gleisi Hoffmann.

Até que esse processo de mutação gradativa atingiu a liderança do governo. A presidente Dilma não tinha, como se define hoje no PT, "empatia" com o deputado Cândido Vacarezza, não o havia apoiado para a presidência da Câmara, menos ainda aceitou seu nome para ministro da Articulação Política, mas Vacarezza, que não está sozinho no mundo da política, foi instado a resistir.

Quando a presidente conseguiu substituí-lo, o fez por Arlindo Chinaglia que, embora de São Paulo, integra o grupo petista para cujo lado tem soprado o vento mais favorável do poder. Dilma, de acordo com um integrante do PT, tem seu modo de fazer as coisas e "o partido tem que respeitar". Esse modo seria o seguinte: "Há uma determinação, clara, dela, de reduzir o grau de demanda do Congresso, apertar, fazer menos o que os partidos querem, fazer mais o que o país quer". Essa seria uma maneira diferente daquela que estava em vigor e o PT teve que aceitar.

A avaliação que se faz no partido é que, não governando o Estado nem a cidade de São Paulo, perderam naturalmente força. São Paulo tem 30 milhões de eleitores e os delegados do PT em Congressos Nacionais da legenda são representativos desse contingente, têm peso e liderança. Mas, admitem, São Paulo não pode ter mais o domínio como tinha.

Ciente do diagnóstico, o PT paulista estaria tratando de promover dois tipos de renovação. O de gerações, que seria a cessão da linha de frente pelo pelotão dos quase setentões, como Lula, José Dirceu, José Genoíno, Marta Suplicy, Luiz Gushiken, Eduardo Suplicy, entre outros fundadores. Essa troca levaria ao outro tipo de renovação, o de candidatos em eleições, modernizando as opções e as expectativas para o eleitor, o que se inicia nas atuais campanhas da sucessão municipal.

Um exemplo de que o deslocamento de poder ainda não é total é o equilíbrio obtido pelo partido na CPI mista que investigará as ligações do empresário de jogos de azar Carlos Cachoeira com políticos, governos e empresas privadas. O PT foi o principal articulador da criação da CPI e o fez para atingir três alvos, já declarados, como expôs reportagem do Valor no último fim de semana: o procurador-geral da República, Roberto Gurgel, o governador de Goiás, Marconi Perillo, e a revista semanal Veja. Nos três casos por razões relacionadas ao mensalão, associação feita publicamente pelo atual presidente do partido, Rui Falcão.

O grupo paulista tem interesse em circunscrever o aprofundamento das apurações a esses três aspectos, uma vez que considera suficientemente provadas no inquérito da polícia federal as demais implicações. O deputado Cândido Vacarezza inclusive ladeou o ex-presidente Fernando Collor no trabalho inicial da comissão para promover a convocação do procurador-geral Roberto Gurgel, uma primeira missão frustrada.

Mas o outro PT que, tendo número e posição na CPI, representa outros interesses, converge com o primeiro grupo na questão dos limites. O governo conseguiu ter o presidente, Vital do Rego (PMDB) e o relator, o deputado Odair Cunha, do PT de Minas Gerais, sem os quais ninguém é convocado ou convidado a depor e nenhum documento é requisitado. Também interessa ao governo limitar as investigações. Acha que a polícia já fez tudo e os governistas devem evitar a expansão para evitar novas vítimas, principalmente do próprio Executivo. O que se pretende é tirar a empreiteira Delta do alvo: só do PAC ela recebeu, segundo dados do Contas Abertas, R$ 3 bilhões.

Numérica e politicamente frágil, e atingida nas investigações, a oposição não tem muito o que fazer diante de tantos e tão qualificados interesses em impor limites. Deve acertar o presidente da Câmara que deu, à CPI, uma sobrevida de três meses.

FONTE: VALOR ECONÔMICO

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