quinta-feira, 31 de maio de 2012

Mudanças históricas

BC reduz taxa básica a 8,5%, seu menor nível, com votação aberta. Poupança tem novo cálculo de rendimento

Gabriela Valente

BRASÍLIA e SÃO PAULO - O Comitê de Política Monetária (Copom) decidiu ontem cortar a taxa básica (Selic) de 9% ao ano para 8,5% ao ano, reduzindo os juros ao menor nível da História. A reunião foi simbólica também por outros motivos. Pela primeira vez, o voto de cada diretor seria divulgado individualmente, no entanto, isso não foi necessário, porque a decisão foi unânime. Outro fator inédito é que com o corte de ontem a nova regra para a remuneração da caderneta de poupança foi acionada.

No começo do mês, o governo anunciou que os novos depósitos na poupança não serão mais corrigidos pela antiga fórmula - 6% ao ano mais a taxa referencial (TR) - quando a Selic for igual ou menor que 8,5% ao ano. A partir de hoje, a aplicação renderá 70% da taxa básica de juros mais TR. As contas anteriores a 4 de maio foram preservadas com a regra anterior. Com a mudança, a equipe econômica evitou uma migração de aplicadores de fundos de investimento para a poupança, que tem isenção de Imposto de Renda para atrair os pequenos poupadores. E deixou o caminho aberto para o BC continuar a reduzir os juros básicos da economia, estímulo importante ao crescimento.

O Banco Central aproveitou para jogar os juros básicos no menor patamar da História, abaixo do que o antigo piso de 8,75% ao ano que vigorou no auge da crise de 2009. A sétima queda seguida dos juros vem em um cenário de crescimento baixo e aquém do esperado, inflação dentro da margem de tolerância do sistema de metas e perspectivas cada vez mais pessimistas em relação ao cenário internacional.

Crescimento está no radar do BC

"O Copom considera que, neste momento, permanecem limitados os riscos para a trajetória da inflação. O comitê nota ainda que, até agora, dada a fragilidade da economia global, a contribuição do setor externo tem sido desinflacionária", atesta o comunicado dos diretores divulgado após o encontro.

Para o economista Roberto Padovani, da Corretora Votorantim, se o Banco Central (BC) fosse seguir à risca a cartilha das metas para a inflação, não deveria cortar mais os juros porque a previsão do mercado para o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) está em 5,17%, acima do centro da meta, de 4,5% neste ano. No entanto, Padovani destaca que os diretores têm mostrado uma tolerância maior com a inflação, para não cometer o mesmo erro da crise anterior, quando demoraram demais para estimular a economia e o crescimento do país travou.

- Desde a crise de 2008, bancos centrais do mundo inteiro têm sido mais sensíveis ao crescimento. Isso não significa abandonar o sistema de metas - pondera o analista.

A previsão mais recente do BC mostra uma inflação de 4,4% ao fim deste ano. E ainda há sinais de desaceleração por causa da crise como a queda do preço das commodities . Essas previsões convergindo para o centro da meta reforçam a avaliação de que não há risco de os juros mais baixos alimentarem a inflação.

- Está tudo conspirando para o Banco Central continuar a cortar os juros e esse não é um movimento ousado - avalia o economista Sérgio Vale, da MB Associados. - A atividade está fraca e não vejo motivo de o Banco Central ser mais comedido.

Segundo Vale, mesmo o BC tendo escrito que usaria de parcimônia nas próximas decisões, estava claro que não voltaria a cortar menos do que meio ponto, por causa do cenário externo.

- O BC não tem sido muito fiel ao que escreve - observa ele.

Brasil cai ao 3º lugar no ranking mundial

Com o corte de ontem, o Brasil caiu para o em terceiro lugar no ranking dos maiores pagadores de juros reais no mundo. Projeção da Cruzeiro do Sul Corretora, considerando a inflação prevista para os próximos 12 meses, mostra uma taxa de 2,8%, agora atrás da Rússia (4,3%) e da China (3,1%). A nova colocação é histórica. Por anos consecutivos, o juro real do país foi o mais alto do mundo. Já havia caído para a segunda posição da listagem global na reunião passada do Copom.

Para o consumidor, no entanto, a diferença não deve ser sentida. Embora teoricamente o juro real reduza o custo dos empréstimos, o economista Jason Vieira, autor da projeção, afirma que a mudança não será percebida na prática. Para ele, ainda há incertezas sobre o rumo que o juro no país tomará. E, enquanto não for consolidado um novo patamar, os bancos não reduzem significativamente o custo.

- O estoque de crédito dos bancos já é grande e com custo alto, porque foi captado a taxas bem mais caras - comentou Vieira.

FONTE: O GLOBO

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