segunda-feira, 25 de junho de 2012

Bancos facilitam renegociação de dívida atrasada

Os altos e resistentes índices de inadimplência no estão fazendo com que bancos, varejistas e operadoras de cartão ofereçam condições melhores para os clientes quitarem dívidas em atraso. O parcelamento pulou de três para 12 e até 24 meses. Multas e taxas têm sido zeradas. Na Suíça, representantes dos bancos centrais alertaram para o alto endividamento no país.

Em busca do crédito perdido

Ao renegociar dívidas atrasadas, instituições financeiras alongam prazos e zeram multas de clientes

Paulo Justus, Roberta Scrivano

A nova escalada da inadimplência e o aumento do endividamento das famílias levaram bancos, varejistas e operadoras de cartão de crédito a flexibilizar as condições para recuperar o crédito em atraso. Vale um pouco de tudo: de prazo mais longo para o pagamento até a extinção da cobrança de multa ou de outras taxas, num movimento que só encontra paralelo na época do Plano Collor, quando a economia entrou praticamente em colapso depois do confisco da poupança. A taxa de inadimplência das pessoas físicas chegou a 7,64% em abril deste ano, acima dos 6,12% registrado no mesmo mês do ano passado, mostram dados do Banco Central (BC).

Segundo profissionais de mercado, o parcelamento das dívidas, que antes era de no máximo três meses, passou a ser de 12 vezes na média. Mas há casos em que o alongamento chega a 24 meses. Os juros de mora, de 10%, chegam a ser zerados em alguns casos. A mesma regra funciona no caso das multas, que antes equivaliam a 2% sobre o valor do débito.

- Nem na crise de 2008 houve tanta boa condição, talvez porque a perspectiva era de melhora mais rápida na inadimplência naquela época - afirma Jair Lantaller, presidente do Instituto Igeoc, que reúne 18 das maiores empresas de recuperação de crédito do país.

Ele acrescenta que esse movimento ganhou corpo nos últimos dois meses, com as notícias de novo repique dos índices de inadimplência.

As condições da renegociação variam de banco para banco. No Banco do Brasil, por exemplo, até meados de abril era cobrada taxa de 3% ao mês na renegociação a título de mora. Agora, essa taxa é de 2,4% mensais, diz Rodolfo Scheidemantel Neto, gerente de reestruturação de ativos do banco estatal.

- Isso muda de cliente para cliente. Mas conseguimos colocar essa taxa menor na renegociação por causa da nova conjuntura econômica e dos menores patamares da taxa básica (Selic) - explicou Scheidemantel Neto.

Taxa reduzida para quem foi demitido

Na Losango, financeira do HSBC e que também faz o serviço de cobrança, as regras de renegociação estão mais flexíveis de dois meses para cá. Se o motivo do atraso é a perda do emprego, a empresa promete oferecer melhor prazo ou taxa menos salgada. Hilgo Gonçalves, executivo-chefe da Losango, explica que a intenção da financeira é cada vez mais "buscar uma solução para cada tipo de cliente".

- A política de reparcelamento de dívidas pode ser feita em até 24 meses. Como exemplo, podemos citar um consumidor em atraso de até 180 dias, que na Losango recebe desconto nos encargos de até 75% e o novo parcelamento em um prazo de até 18 meses com taxa de 1% ao mês - conta ele.

Um reflexo das melhores condições de renegociação é o aumento do índice de recuperação de crédito. De acordo com a Boa Vista Serviços, que administra o Serviço Central de Proteção ao Crédito (SCPC), os registros retirados (quitados) de seu cadastro cresceram 15,9% nos primeiros cinco meses do ano, enquanto a entrada de novos inadimplentes subiu 12% no período.

- Os números se inverteram neste ano. Em 2011, o número de inclusão nos registros foi maior que a retirada: cresceu 22,4%, enquanto a retirada de cadastro negativo teve alta de 18,4% - diz Flavio Estevez Calife, economista da Boa Vista Serviços.

Mesmo com facilidades extras, tudo indica que a queda da inadimplência será mais gradual neste ano do que em outros períodos. Diferentemente da crise iniciada em 2008, em que a inadimplência foi causada por uma abrupta escassez de crédito na economia e depois caiu rapidamente quando o fluxo financeiro retornou, o novo patamar de calote foi causado pela expansão, por vezes desordenada, do crédito. Tanto que o Ministério da Fazenda está desenhando um pacote de medidas que deve ser batizado de "reestruturação da inadimplência". Embora o Planalto não abra os detalhes, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, declarou em uma audiência no Senado na segunda quinzena de maio que ocorrerão alterações nos sistemas de portabilidade de crédito, o que ampliaria a concorrência entre os bancos e reduziria ainda mais as taxas.

- Muitas pessoas que não tinham condições de se endividar tomaram empréstimos, o que gerou a massa de inadimplentes em 2011 - diz Luiz Rabi, economista da Serasa Experian.

O presidente do Igeoc diz que, além da perspectiva de uma maior demora para a queda dos índices de inadimplência, o próprio fato de o número de pessoas com mais de uma dívida ter crescido criou uma espécie de corrida para conquistar o inadimplente.

- Uma pessoa que tem duas dívidas com condições diferentes vai dar preferência para quitar aquela que oferecer melhores termos - afirma.

Apesar do nível de inadimplência ter crescido, o calote medido pelo Banco Central ainda não chegou ao nível mais alto. A taxa que mede os empréstimos com mais de 90 dias em atraso da pessoa física, e que chegou a 7,64% em abril deste ano, ainda está distante do pico de 8,54% atingido no auge da crise econômica, em maio de 2009.

- Hoje, o spread bancário é calculado para cobrir uma taxa de até 11% de inadimplência. Por isso, há tanta gordura para se queimar sob a forma de melhores condições de renegociação - diz Altamiro Carvalho, economista da Fecomercio-SP, lembrando que a queda dos juros também favorece.

Entre as modalidades de crédito, a situação é grave no financiamento automotivo. Em abril, a inadimplência atingiu 5,86%, o maior nível da série histórica do BC, que começa em 2000.

- A inflação reduziu o poder aquisitivo e a inadimplência subiu, mesmo com o desemprego menor - diz Décio de Almeida, da Associação de Financeiras das Montadoras (Anef).

FONTE: O GLOBO

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