domingo, 10 de junho de 2012

"Cachorrão" para a diretoria do BC:: Elio Gaspari

O professor Ademar Fonseca, titular de Mecânica da Faculdade de Engenharia da PUC do Rio, tinha o apelido de "Cachorrão". Ele deu zero a um aluno que resolveu um problema em cinco páginas e errou a colocação da vírgula na última conta. Quando o jovem reclamou, recebeu uma aula para toda a vida: "Uma ponte não pode ter oito metros ou 80 metros. Você mergulha em uma questão complexa, depois, quando você termina, você se afasta e olha o jeitão da coisa. Pelo jeitão, você vai ver se é 8 ou 80."

A doutora Dilma deveria criar uma "Diretoria do Cachorrão" no Banco Central. O encarregado teria a atribuição de olhar o "jeitão" dos banqueiros.

Em geral, um banco quebra meses depois de o mercado saber que ele estava "virado". Assim foi com o PanAmericano, com o Cruzeiro do Sul, com a Lehman Brothers e assim será com o próximo. As autoridades monetárias têm centenas de funcionários qualificados estudando os números do mercado, mas é comum que desprezem o "jeitão" dos banqueiros. Nos Estados Unidos, Bernard Madoff, o ilustre fundador da Nasdaq, deu um golpe de dezenas de bilhões de dólares, apesar de ter sido denunciado sete anos antes. Tinha casas em Londres, Paris, Nova York e Palm Beach, jatinho e iate de US$ 7 milhões. Se Cachorrão soubesse disso, acreditaria na denúncia. Richard Fuld, o responsável pela explosão da Lehman Brothers, mandara que o elevador do prédio fosse programado para ir direto ao 33 andar quando ele estivesse a caminho do banco. Nesse caso, Cachorrão pediria que prestassem atenção na inteligência do doutor.

Um dia Amador Aguiar (1904-1981), o maior gênio da banca brasileira, viu uma Mercedes no estacionamento da diretoria do Bradesco. Chamou o dono e disse-lhe que aquele tipo de carro estava fora do alcance dos funcionários da casa.

Rafael Palladino, presidente do Banco PanAmericano, quebrado em 2010 numa operação para lá de esquisita, tinha um belo apartamento e uma imobiliária em Miami. Seu diretor financeiro morava num teto de R$ 14 milhões. Coisa de classe média emergente se comparada com as extravagâncias do doutor Luís Octavio Indio da Costa, dono do banco Cruzeiro do Sul, com sua carteira de 300 mil empréstimos irregulares, num total de R$ 1,3 bilhão. O magnata tem dois helicópteros da grife Eurocopter, com dez lugares cada, coisa de R$ 60 milhões. Isso e mais um iate de 110 pés, com cinco suítes, avaliado em R$ 30 milhões. Nas suas festas apresentavam-se Elton John, Bono Vox e Tony Bennett.

Bastava que o Banco Central olhasse para o "jeitão" do doutor para que se acendesse a luz amarela. Acender a vermelha seria preconceito contra rico, mas deu no que deu. Cachorrão chamaria o diretor de Fiscalização do BC e haveria de constrangê-lo apontando o risco que corria.

Seria pedir demais que a "Diretoria do Cachorrão" ficasse encarregada de recuperar pelo menos uma parte do que os clientes perdessem. As casas, barcos e chinelos dos Madoff foram a leilão em 2010. Onze pares de cuecas entraram num lote que saiu por US$ 1.700.

Uma incrível história de amor

Boa notícia para quem leu "Sussurros" ou "Tragédia de um povo", do historiador inglês Orlando Figes. Ele acaba de publicar "Just send me a word" ("Escreva-me - Uma história de amor e sobrevivência no Gulag"). Depois de ter escrito uma das melhores histórias da revolução bolchevique e a melhor narrativa do cotidiano dos campos de prisioneiros do comunismo, Figes achou em Moscou um baú com duas mil cartas (37 quilos de papel). Nelas estavam contados oito anos da paixão de Lev Mischenko por Svetlana Ivanova. Eles se conheceram aos 18 anos, na Universidade de Moscou, onde estudavam Física. O pai dela era um bolchevique. Os dele foram liquidados durante a Revolução. Em 1941 Lev foi para a guerra, os alemães capturaram-no e mandaram-no para Buchenwald. Quando retornou, em 1946, tomou outra cana, na construção de uma ferrovia no Círculo Ártico. As cartas foram a razão de viver dos dois. Esperavam-se, sem saber quando se encontrariam. Trocavam poesias, Lev falava da emoção que sentia ao ouvir trechos da "Traviata" e pedia apenas "cartas, cartas, cartas".

Lev foi libertado em 1954, mas não podia morar em Moscou. Viveu um ano escondido na casa de "Sveta". Casaram-se no ano seguinte, aos 38 anos, e viveram felizes para sempre, cultivando um círculo de amizades que remontava aos tempos do Gulag. Ele, como físico no Laboratório de Raios Cósmicos, ela, como pesquisadora de borracha sintética. Figes encontrou-os em 2008. No ano seguinte Lev morreu, e dois anos depois Svetlana se foi. Estão sepultados lado a lado.

Numa demonstração da elegância dos ingleses, o historiador Simon Montefiore ("A corte do czar vermelho") saudou o livro de Figes, apesar de ele ter sujado seu verbete derrubando livros alheios em resenhas anônimas na Amazon. Descoberto, pôs a culpa na mulher e passou pela humilhação de reconhecer que mentira, atribuindo sua conduta à depressão provocada pela pesquisa nas memórias do Gulag.

- O e-book de "Just send me a word" está por US$ 14,99.

O "jeitão" dos Filipelli

Bruno Filipelli casou-se na sexta-feira no castelo Odescalchi, nas cercanias de Roma. Ele é filho do deputado Tadeu Filipelli, ex-vice-governador de Brasília na gestão de Joaquim Roriz, defensor de emendas que facilitam a vida de sonegadores.

Como dizia a secretária da Receita Lina Vieira, quem paga imposto se sente "um otário". E casa filho em festa barata.

Mensalão

O julgamento do mensalão promete a emoção de uma cobrança de penâlti aos 44 do segundo tempo.

O primeiro réu a ser julgado será o comissário José Dirceu.

O jogo começará com o relator Joaquim Barbosa marcando 1 x 0 pela condenação. Em seguida, votarão, nesta ordem: Rosa Weber, Luiz Fux, Dias Toffoli (caso não se declare impedido), Cármen Lúcia, Ricardo Lewandowski e Cezar Peluso. Admitindo-se que a esta altura se chegue a 5 x 2 a favor de José Dirceu, existe a possibilidade de a absolvição de José Dirceu vir a ser decidida já no voto de Gilmar Mendes.

Se ele votar pela condenação, o jogo prossegue, com mais três votos: Marco Aurélio, Celso de Mello e Ayres Britto.

Partir para cima

O comissariado petista acredita que pode "partir para cima" do Supremo Tribunal, inclusive jogando sua militância nas ruas.

É impossível prever quantos companheiros estão dispostos a acompanhar essa palavra de ordem. (Plateia transportada em caravanas de ônibus não conta.)

Certo mesmo é que, se fizerem isso, comprometerão o desempenho de seus candidatos nas urnas. Pior: demarcarão uma linha divisória que poderá influenciar a política brasileira por muitos anos. Até hoje o mensalão é um capítulo da crônica petista, "partindo para cima" do Supremo, será seu título.

FONTE: O GLOBO

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