sábado, 2 de junho de 2012

Estagnação e investimento em queda aprofundam crise

A economia brasileira ficou estagnada no primeiro trimestre. O Produto Interno Bruto (PIB) teve expansão só de 0,2% em relação ao quarto trimestre. O investimento caiu e o arrocho fiscal ajudou a piorar o quadro. Além disso, a seca cortou a produção de soja e derrubou o resultado da agropecuária. Com isso, o governo já planeja usar as estatais para impulsionar o crescimento nos próximos meses e os economistas prevêem novas reduções de juros. Bancos e consultorias mudaram suas projeções e já apostam que o PIB deve crescer entre 1,5% e 2,5% este ano.

O PIB patina (de novo)

Investimento em queda e arrocho fiscal fazem país estagnar, já sob efeito da crise global

PÉ NO FREIO

Fabiana Ribeiro, Henrique Gomes Batista, Clarice Spitz, Roberta Scrivano e Vivian Oswald


RIO, SÃO PAULO E BRASÍLIA - O ano de 2012 não começou bem para a economia brasileira. O IBGE divulgou ontem que o Produto Interno Bruto (PIB, conjunto de bens e serviços produzidos no país) cresceu apenas 0,2% no primeiro trimestre de 2012 em relação aos três últimos meses do ano passado. Mesma taxa do trimestre anterior. Resultado influenciado por uma forte queda na agropecuária (-7,3%) e nos investimentos, que caíram 1,8% na esteira da crise global, a maior redução desde primeiro trimestre de 2009. O resultado não foi pior pelo desempenho do consumo das famílias, que cresceu 1%. Assim, o PIB somou R$ 1,033 trilhão no período - resultado aquém do esperado por agentes financeiros e pelo próprio governo.

- Nós não falamos nem em crescimento quando há 0,2% de alta, da mesma forma que não falamos em queda quando há uma baixa de 0,2%. O PIB ficou mais para estável - afirmou Rebeca Palis, gerente de Contas Nacionais Trimestrais do IBGE.

O resultado do começo do ano põe em xeque a eficácia das medidas de estímulo à economia, que estão sendo tomadas desde agosto do ano passado. As desonerações vieram junto com uma política fiscal restritiva, o que teve impacto forte nos números da economia. O governo fez as contas e concluiu que o país poderia ter crescido 0,4% no trimestre, em vez de 0,2%. Em tese, sem o arrocho fiscal, que segurou os gastos do orçamento, o crescimento teria sido o dobro.

Diante da taxa do primeiro trimestre, o resultado deste ano pode ser ainda pior do que o crescimento do ano passado, que foi de 2,7%. Analistas reviram ontem suas projeções e aumenta a expectativa de que a economia brasileira cresça perto de 2%. Mas, até para isso, o país precisa acelerar: se for mantida a velocidade do primeiro trimestre, o PIB cresceria apenas 0,8% neste ano, segundo as contas da LCA Consultores.

- É um ritmo muito fraco, que torna praticamente impossível fechar o ano com crescimento de 3%. Para isso, os próximos três trimestres teriam de crescer 1,7% em média. O PIB brasileiro completou o terceiro trimestre consecutivo de virtual estagnação -disse Bráulio Borges, economista-chefe da LCA Consultores.

Taxa de investimento caiu para 18,7%

O PIB brasileiro também foi fraco em relação ao primeiro trimestre do ano passado, crescendo 0,8%, o menor avanço desde o terceiro trimestre de 2009, praticamente metade das estimativas do mercado de 1,5%. Também na comparação, o investimento encolheu 2,1%, sendo o único item a se retrair sob a ótica da demanda. Com isso, a taxa de investimento do PIB, que era de 19,5% no primeiro trimestre de 2011, caiu para 18,7%.

Os analistas foram surpreendidos pela indústria e pela agropecuária. Após a produção industrial, divulgada na quinta-feira pelo IBGE, ter apresentado novos números negativos do segmento, o PIB indicou que a indústria chegou a crescer 1,7% no primeiro trimestre ante ao quarto trimestre de 2011 - acima, inclusive, dos serviços (0,6%). Mas, na comparação com o começo do ano passado, a alta foi de apenas 0,1%, com a indústria de transformação apresentando retração de 2,6%.

Fernando Bueno, dono da indústria Bitzer, que produz compressores para refrigeração comercial e de fábricas, amargou redução de 13% em seu faturamento no primeiro trimestre deste ano. O resultado até maio não mudou muito a tendência, com queda acumulada no período de 12%. Como seu produto é destinado a indústrias e unidades comerciais, ele atribui o menor movimento neste ano à escassez de investimento por parte dos seus clientes.

- A falta de perspectiva de ganho é geral. Sendo assim, meus clientes não estão investindo e não têm comprado novos compressores - disse Bueno.

Outra surpresa sai da agropecuária, com queda de 7,3% nos primeiros três meses do ano. Na comparação com igual trimestre do ano passado, a redução foi ainda maior, de 8,5%. De acordo com o IBGE, houve queda na produção nas safras de soja (-11,4%), arroz (-13,8%) e fumo (-15,9%), além de recuo na produtividade.

- Pelo que investimos, era para o país ter sua maior safra, mas por problemas climáticas, como a seca, teremos um ano ruim. Somente em soja, perdemos 8 milhões de toneladas, ou o equivalente à produção de Goiás - afirmou Rosemeire Santos, economista da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), temendo pelo setor: - Isso, somado à queda dos preços dos alimentos no mundo e com a inadimplência que está fazendo os bancos diminuírem os empréstimos, podem comprometer ainda mais os investimentos do setor.

Entidades já afirmam que a economia não deve conseguir crescer nem 3% neste ano. A Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) prevê alta entre 2% e 2,5% no ano. A Confederação Nacional das Indústrias (CNI) e o Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi) não cravam um número, mas estimam que o incremento não chegará a 3%.

- O conjunto das medidas, ou seja, juro baixo, câmbio, redução do IPI e as desonerações, deve trazer algum resultado no segundo semestre. Creio que o segundo trimestre ainda virá fraco - avaliou Júlio Gomes de Almeida, diretor do Iedi.

Setor bancário encolheu 0,8%

Dentro de serviços, o único setor a registrar taxa negativa foi o de intermediação financeira, segmento que corresponde a 11% do setor e 7,4% do PIB, e teve recuo de 0,8% na comparação anual. O segmento, que liderou o crescimento nos momentos de grande avanço do PIB, pode estar refletindo, segundo Rebeca, um crescimento menor do crédito, a queda dos juros que reduzem os lucros dos bancos e o aumento da inadimplência, que acaba elevando as provisões bancárias para empréstimos duvidosos. As atividades imobiliárias e de aluguel, por sua vez, ficaram praticamente estáveis, com alta de apenas 0,1%.

O IBGE divulgou também revisões na evolução do PIB no ano passado. No quarto trimestre de 2011, a taxa de expansão mudou de 0,3%, calculada anteriormente, para 0,2% na nova estimativa, em comparação ao trimestre anterior. No primeiro trimestre de 2011, a taxa de expansão mudou de uma alta de 0,6% para crescimento de 0,9%.

FONTE: O GLOBO

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