terça-feira, 5 de junho de 2012

Lula é contestado pela primeira vez:: Raymundo Costa

Do mensalão à campanha de Fernando Haddad para prefeito de São Paulo, deu errado quase tudo o que o PT tentou fazer, nos últimos dias. O diagnóstico é um só: falta comando para encadear as ações delineadas pelo partido. Sem falar, o que não é menos importante, na doença do ex-presidente Lula.

Menos mal que a ofensiva contra o Supremo tenha, na realidade, oferecido alguma blindagem aos ministros para o julgamento do processo do mensalão. No caso Haddad, o insperado: a senadora Marta Suplicy transformou-se no primeiro petista a "encarar" o ex-presidente da República, desde que ele deixou o Palácio do Planalto quase na condição de um semi-deus.

A festa para celebrar o lançamento da candidatura de Haddad expôs com nitidez a fratura do PT. Marta não apareceu no palanque em que se acotovelavam os dignatários petistas. Ainda assim a festa terminou com eles discutindo o Plano B: a ex-prefeita entraria com força na campanha de rádio e televisão do candidato.

Trapalhadas do PT podem ter blindado STF das pressões

Acredita quem quiser, mas os quase 2 mil convidados à festa foram embora achando que fizeram papel de bobo: ora Marta estava chegando, ora presa num engarrafamento. Ninguém conseguia falar com ela. Seu telefone celular chamava, mas ninguém atendia. Os dos principais assessores, também.

Foi quando Eduardo Suplicy teve a brilhante ideia de enviar um SMS. Nada. Haddad mudou a ordem dos discursos. Marta falaria em primeiro lugar; Lula em seguida e Haddad faria a grande apoteose.

Estava no discurso. O ex-ministro da Educação faria um histórico dos principais feitos de Marta Suplicy à frente da Prefeitura de São Paulo. Ele cortou tudo. Para os petistas, entre os quais um grande número de prefeitos, ficou a sensação de que não há volta na campanha paulistana. Marta expôs toda amargura que sentiu ao ser retirada da campanha para prefeito de São Paulo pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Sem honrarias. Da outra vez, quando queria concorrer ao governo de São Paulo e Lula impôs o nome de Mercadante, a senadora pelo menos foi homenageada com o convite para o Ministério do Turismo. Desta vez soube que estava fora por meio de uma auxiliar de Lula no instituto que leva seu nome, o antigo Instituto da Cidadania.

Não é de hoje, ou de sábado, que Marta mostra descontentamento por ter sido excluída do processo sucessório paulistano. Ela sempre argumentou que José Serra seria o candidato tucano, e que, portanto, o PT deveria sair com quem pudesse comparar o governo do PT - o dela - com o governo da dupla Serra/Kassab. Lula não deu atenção. No fundo, o ex-presidente entende que a geração do mensalão, em São Paulo, acabou e que é necessário renovar. Marta, por seu turno, acha que a renovação não é de idade, mas de ideias e de projetos para a cidade. Marta, registraram os petistas, desde que Lula saiu do governo é a primeira petista a "peitar" o ex-presidente.

Da semana, o saldo positivo que pode ficar para o país - e também para parcelas do PT - é que diminuíram as abordagens de réus, advogados e simpatizantes sobre os ministros encarregados do julgamento do mensalão. Mas mesmo entre os ministros as conversas ganharam um tom mais moderado. Ninguém quer ser o autor de algum comentário que no dia seguinte possa parecer estampado nas páginas dos jornais. Existe um clima efetivo de desconfiança entre colegas, que já se manifestou em outras ocasiões e agora voltou com intensidade.

Até o estouro da bolha na qual estavam encerrados os dois ex-presidentes dos dois Poderes (o da República e o do Supremo), o STF era um alvo cada vez mais visível para dardos arremessados algumas vezes de longe (geograficamente falando), mas com a precisão de quem estava a apenas alguns passos de distância. É certo que o presidente do PT, Rui Falcão (que passa uma parte da semana em São Paulo e outra em Brasília), arrependeu-se por ter relacionado a CPI do Cachoeira com uma tentativa do PT de provar que o mensalão foi uma farsa. Era o que todos pensavam, mas ninguém no PT reconhecia. Mas o que dizer quando o prefeito de São Bernardo do Campo, Luiz Marinho, insiste em dizer que o ministro do STF José Antonio Dias Toffoli não tem o direito de se declarar impedido no julgamento?

Rui Falcão e Luiz Marinho apenas expuseram uma estratégia delineada no PT. O resto, é recuo tático. O bombardeio de Marinho sobre Toffoli confundiu a amizade e eventual solidariedade que o ministro deva ter pelo PT - ou com alguns dos acusados - com um voto de absolvição. Pode até ser, o que parece difícil diante da complexidade jurídica de um processo com 40 acusados, dos quais alguns devem escapar, de acordo com a análise de juristas. O certo, no momento, é que Marinho foi grosseiro, simplesmente, com Toffoli. Para dizer o mínimo.

Situação parecida é a do ministro-revisor do processo, Ricardo Lewandowski, morador de São Bernardo, amigo de Luiz Marinho e de Lula, com quem inclusive já trocou ideias sobre a conveniência de se adiar o julgamento do processo do mensalão, talvez para o próximo ano, quando os votos dos juízes podem ser proferidos sem o barulho das patrulhas partidárias no volume que certamente terá neste ano. Aliás, antes de Lewandowski apresentar seu voto, não haverá julgamento.

Pressão também sofre o ministro Ayres Brito, presidente do STF. Com a opinião pública decididamente favorável a que se ponha um ponto final à novela, o ministro tem se mostrado favorável ao julgamento ainda este ano. Mas segundo réus do mensalão, Ayres acha que, com isso, escreverá seu nome na história. Na prática, segundo criticam os que ainda podem ser considerados bons emissários junto ao revisor, em vez de passar para a história como ministro que atendeu à opinião pública, apenas se curvou diante da "opinião publicada", como o PT costuma diferenciar a rua que o aplaude daqueles que criticam o partido.

FONTE: VALOR ECONÔMICO

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