segunda-feira, 11 de junho de 2012

O insensato:: Ricardo Noblat

- Não faço nada que não seja de comum acordo e determinado por ele (Lula) (José Dirceu, sobre o mensalão, em 13/6/2005)

Se depender de José Dirceu, ex-chefe da Casa Civil de parte do primeiro governo Lula, o bicho vai pegar antes, durante e, se necessário, depois do julgamento do processo do mensalão pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Nunca antes na história recente do país convocou-se o povo para pressionar um tribunal.

Pois bem: Dirceu começou a fazê-lo.

Rapaz ousado! Mais certo seria chamá-lo de temerário, imprudente, perigoso, tresloucado, atrevido, insolente, afoito, demente, precipitado, desaforado, petulante, desajuizado, incauto, arrogante, desvairado, impulsivo, arrebatado, insensato – e mais o quê? Pense.

E acrescente aí.

Quem se diz democrata respeita a independência dos poderes da República. Pode discordar de decisões da Justiça? É claro que sim. E até criticá-las com indignação.

Mas ao fim e ao cabo só lhe resta acatá-las. Diga-me: que democrata de verdade insufla o povo para que constranja a Justiça a decidir como ele deseja? De passagem por Brasília, em conversa com um amigo há um mês, Dirceu pareceu abatido e certo de que será condenado por ter chefiado "uma sofisticada organização criminosa" que tentou se apoderar de uma fatia do aparelho do Estado, segundo denúncia do Procurador Geral da República aceita pelo STF.

Não revelou ao amigo que cogitara exilar-se em Cuba ou na Venezuela. Uma vez condenado, viajaria denunciando a injustiça de que fora vítima. Arquivou a ideia.

Concluiu que seria difícil convencer os ouvintes de que era um perseguido político no país governado por seu próprio partido há quase dez anos.

Mas surpreendeu o amigo ao revelar que os chamados "movimentos sociais" não assistiriam inertes a sua eventual condenação. Dizse informado de que reagiriam por meio de manifestações de rua. Não descartou a hipótese de que tais manifestações acabassem antecipadas.

Tudo dependeria da data do julgamento.

O STF marcou o julgamento para agosto e setembro próximos.

Na tarde do último sábado, Dirceu aproveitou no Rio o 16º Congresso Nacional da União da Juventude Socialista (UJS), ligada ao PCdoB, e pediu aos estudantes que saiam às ruas em sua defesa. "Será a batalha final", proclamou com ar grave.

Todos sabem que este julgamento é uma batalha política. E essa batalha deve ser travada nas ruas também porque senão a gente só vai ouvir uma voz, a voz pedindo a condenação, mesmo sem provas. É a voz do monopólio da mídia.

Eu preciso do apoio de vocês — suplicou A Procuradoria Geral da República considera que há provas suficientes para condenar os 38 réus do mensalão. Com ela concordou o STF ao acolher a denúncia.

São 11 os juízes. Advogados com livre trânsito no STF apostam na condenação de Dirceu por dois a três votos de diferença.

Sabe de quem será um dos votos pela absolvição? Está sentado? Do ministro Gilmar Mendes. Por que tanto espanto? Se fosse menos mal agradecido, o PT reverenciaria Gilmar sempre que ele fosse citado.

E não valorizaria nem um pouco as suas explosões de temperamento.

Quem evitou a inclusão de Gushiken na lista dos mensaleiros? E garantiu a Mercadante o direito de ser candidato ao Senado? E salvou Palocci da acusação de ter quebrado o sigilo bancário de Francenildo dos Santos, testemunha de suas visitas a um reduto de amor e de negócios em Brasília? Gilmar, ora.

Dirceu sabe disso. Como sabe que a força da mídia é declinante, a se acreditar no que apregoa Lula. Como sabe que há provas de que o mensalão existiu. A propósito, uma vez ele observou em entrevista à Folha de S.Paulo: "Eu falei para não fazer".

Falou para quem? Por que não foi atendido?

Não podemos deixar que esse processo se transforme no julgamento da nossa geração. Não permitam julgamentos fora dos autos — apelou Dirceu. Os réus do mensalão são de várias gerações.

Os estudantes que ouviram Dirceu não são da geração dele. Em nada ajudará Dirceu a suspeita de que o STF pode julgar fora dos autos.

FONTE: O GLOBO

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