sexta-feira, 29 de junho de 2012

O pacto de 2014:: Maria Cristina Fernandes

No calendário da política nacional, a campanha presidencial se inicia depois de contado o último voto das disputas municipais. Pelo açodamento com que os partidos se posicionam para a contenda de outubro, porém, parece não haver dúvidas de que é uma dupla campanha que se inicia oficialmente neste sábado com o fim das convenções.

Concorrem para isso a candidatura em São Paulo de um eterno postulante à Presidência, a atuação desmedida de um ex-ocupante do cargo e o avanço estratégico de um partido aliado ao governo que se posiciona decididamente a partir para alcançar o Planalto.

É dos êxitos e tropeços destes e de muitos outros que se pintam para a guerra em 5.565 municípios que se traçará o mapa sucessório de 2014. Uma boa parte do combustível que tem esquentado antecipadamente os motores da sucessão presidencial, no entanto, vem do gabinete instalado no terceiro andar do Palácio do Planalto.

Os mandatos presidenciais custam a definir sua cara de tantos recuos que protagonizam. O governo Dilma Rousseff ainda não chegou à primeira metade de seu mandato, mas já se mostrou. A face que, para público interno e externo, vem à tona é de um governo de embates.

Compra briga com os bancos pelos juros, enfrenta seu partido e aliados na recomposição do comando de algumas estatais, como a Petrobras, feudo de interesses longamente encastelados, e dá a partida para a busca da verdade nas entranhas da história e das planilhas da administração pública.

Das leis que a reeleição lavrou nos costumes, uma que parece ser cumprida à risca é que ninguém compra tanta briga assim se pretende se reeleger. Some-se a isso o cerco aos gastos desde os escândalos de corrupção que teria travado o governo e aumentado a insatisfação. Vai mais uma pitada de dificuldade em se fermentar o PIB e tem-se pronta a receita de tanto apetite pelo poder.

A estratégia para conter as ambições que se avolumam está traçada. A reeleição, inexistente no léxico presidencial, vai dar suas caras. A quem interessar possa, Dilma vai deixar claro que disputará 2014.

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva continua sendo seu principal conselheiro na política. Mas, ainda que as intenções de Lula não tenham ficado claras, o entorno mais próximo da presidente sabe que seu antecessor não truca ao dizer que pretende se apresentar, se a titular se retirar do jogo.

As pesquisas internas do Planalto respondem com os seguintes percentuais à pergunta "se as eleições fossem hoje, em quem você votaria para presidente?": 70% em Lula e 60% em Dilma.

Foram as brigas que a indispuseram com seus aliados, que, em parte, puseram Dilma na condição de poder roçar os calcanhares de seu mítico antecessor. Não convém, portanto, abandoná-las. Os percentuais exibem a tropa da comandante e ajudam a entabular a negociação.

Aos aliados mais afoitos de sua coligação, o recado é: vamos juntos em 2014, que dali a quatro anos o espaço lhes será franqueado. Em português para petista entender, o mote é "para ter a hegemonia não é preciso ocupar a cabeça de chapa". Tem outro ainda, também capaz de desnortear a quem se guia pela estrela vermelha: "Não temos um projeto de partido, mas de país". E esse projeto, numa cantiga feita para embalar potenciais adversários, "pode estar num aliado de nosso campo".

A mais bem-sucedida experiência do PT com essa alternância de poder no mesmo campo se dá em Belo Horizonte, onde um prefeito do PSB sucedeu a um do PT e partirá para a reeleição em aliança sem divisar adversários à frente.

Essa aliança pode prosseguir em 2014 com a candidatura do prefeito Márcio Lacerda ao governo, mas ainda não há acordo que elimine a postulação do ministro Fernando Pimentel. Esse e outros acordos são parte da construção da aliança pela reeleição presidencial.

Para além das alterosas, o casamento nem sempre dá certo. Na terra do presidente do PSB, por exemplo, o caldo entornou. O presidente do PT, Rui Falcão, e o ex-ministro José Dirceu resolveram confidenciar aos microfones e ao papel aquilo que só vinham dizendo em privado.

Falcão usou todas as letras: "Eles [o PSB] querem se firmar em cima do PT. Sobre a dinâmica do PT decidimos nós, não o governador Eduardo Campos" (Valor, 26/06). No seu blog, Dirceu foi além: "O PSB e a oposição em geral elegeram a região como ponta de lança de sua estratégia para barrar o fortalecimento político-eleitoral do PT. Quem não entendeu o processo esquece que em 2002 o deputado Anthony Garotinho foi candidato a presidente pelo PSB" (www.zedirceu.com.br).

Não é uma dupla que jogue unida em todas, mas fazem uma indissolúvel dobradinha quando se trata de manter o PT no poder até o apocalipse.

Por isso, a estratégia que está sendo cultivada ao pé do ouvido presidencial passa pela tomada do poder nas eleições internas do PT em 2013.

A aposta na renovação petista começou a ser feita no início do mandato, com a escolha de Marco Maia para a Presidência da Câmara, e ganhou corpo com a definição de lideranças do governo e de partido mantidos à borda na era lulista.


Dilma precisa deles para ter um PT alinhado com seu jogo na reeleição, e eles precisam da presidente para ganhar espaço no partido e no governo. As bravatas da semana com votações que desagradaram ao Planalto são parte do ajuste dessa aliança tácita que demandará concessões de parte a parte.

Preocupa o Planalto o açodamento desse grupo em relação à disputa pela Presidência da Câmara. Desalojar Henrique Eduardo Alves na disputa pelo cargo não está entre as brigas que a presidente pretende encampar.

Também não vê por que o PMDB tenha que cair fora da vice em 2014. A relação da presidente com o governador de Pernambuco não é e nem será jamais tão estreita quanto a de Lula, mas Dilma admira a gestão e lhe reconhece o tino. Por isso não acredita que Eduardo Campos queimaria caravelas pela vice. Ganharia mais fazendo um acordo com o PMDB para 2018. A conversa de Lula com Campos ontem em São Paulo, que precedeu a do ex e de sua sucessora, visitou este roteiro.

Como último, mas não menos importante capítulo da estratégia presidencial, o país tem que crescer o suficiente para abrigar os eleitores que entrarão no mercado até 2014. Como não dá para combinar com o resto do mundo, a questão é definir o preço de bilheteria capaz de manter a plateia do circo e o emprego do adestrador.

FONTE: VALOR ECONÔMICO

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