quinta-feira, 21 de junho de 2012

Países precisam ser mais solidários :: Edgar Morin

ENTREVISTA/Edgar Morin. Sociólogo francês e professor da Universidade Paris VIII defende o resgate do valor da solidariedade e o exercício da democracia para combater a pobreza

Aos 93 anos, Edgar Morin é contundente ao dizer que a erradicação da pobreza passa pelo resgate de um valor que precisa ser acordado nos seres humanos: o da solidariedade. Para o sociólogo francês, presidente do Institut Internacional de Recherche Politique de Civilisation (IIRPC), é preciso haver, de um lado, solidariedade entre as nações e, de outro, o incentivo à criação do que ele chama de democracia direta. Ou, como explicou ao GLOBO, fóruns regionais que amplifiquem a voz das populações pobres e funcionem como um elo entre elas e os governantes.

Martha Neiva Moreira

O GLOBO: A erradicação da pobreza é um dos desafios para se atingir o desenvolvimento sustentável. Ainda hoje há povos em situação de pobreza extrema e as nações não conseguem solucionar. Por quê?

EDGAR MORIN: É uma lacuna. Não se pode isolar a questão ecológica da questão social. A pobreza é um problema mundial e pressupõe a adoção de políticas que combatam a exclusão. Mas as nações parecem que estão isoladas umas das outras e não conseguem se aliar para enfrentar questões globais como esta.

Por quê?

MORIN: Por um lado, não temos ainda uma realidade supranacional capaz de impor medidas adequadas aos Estados. Por outro, os Estados estão atrelados à especulação financeira. É preciso uma reforma política para que Estados exerçam o papel para o qual foram criados: o de garantir os direitos básicos à população.

O que falta para isso?

MORIN: Mudar o modelo de civilização para suscitar o surgimento de uma nova via política para as nações e a Humanidade. Para enfrentar a pobreza e a pobreza extrema, tanto no campo quanto na cidade, é necessário uma democracia direta.

Como assim?

MORIN: É preciso criar conselhos regionais com a participação da população pobre e de profissionais de várias áreas. Os pobres não têm voz, ficam isolados na hora de decidir seus destinos. Ao incentivar a criação desses fóruns, que discutirão temas regionais, os governos estarão dando voz a essas populações e criando um elo entre o Estado e os que sofrem com a pobreza. Isso é respeito.

Há diferença entre a pobreza dos países do Norte e os do Sul?

MORIN: Os atuais pobres dos países do Norte são os que já fizeram parte do sistema industrial. Eles estavam incluídos no sistema econômico formal e agora, por causa da crise econômica, estão à margem. Mesmo à margem, é uma pobreza assistida, que conta com alguma proteção assistencial dos governos. Os pobres dos países do Sul, ao contrário, jamais foram incluídos no sistema formal. Eles nasceram excluídos, não contam com assistência e não têm acesso aos direitos básicos.

Um dos instrumentos de combate à pobreza é a participação popular. O brasileiro ocupa os espaços de participação?

MORIN: Participar da vida social é um exercício e o meio mais legítimo de fazer pressão nos governos. Mas exige prática e conhecimento das formas de participação. A democracia no Brasil é recente e ainda é preciso vencer o medo de falar. As minorias, em geral, estão frequentemente ausentes das assembleias de participação. Por isso que digo que a prática da democracia direta deve fazer parte da educação do cidadão. Só assim aprendemos, aos poucos, a tomar a palavra.

Como incentivar a participação?

MORIN: Com um modelo de educação que ensine as crianças a viver, a ter mais compreensão dos outros, entender o significado do valor do conhecimento para enfrentar as questões que se impõem. As crianças e jovens precisam pensar o que significa ser humano no contexto de sua época para que fiquem aptos a pensar soluções para os desafios que virão. Esses ensinamentos ajudam a constituir o valor da solidariedade e, hoje, para combater a pobreza, é preciso ser solidário. Falo de solidariedade entre pessoas e, sobretudo, entre países.

As nações ricas alegam que a crise econômica os impede de ajudar os países pobres...

MORIN: Há países ricos em crise, mas ainda assim eles têm meios de ajudar os pobres parando de explorar as riquezas do solo e subsolo dessas nações com suas multinacionais.

Como a Economia Verde pode resolver as desigualdades sociais?

 MORIN: A água é um bem comum e não tenho que pagar por ela. Economia Verde é a que oferece uma energia limpa, que favorece pequenos agricultores, a agricultura menos nociva ao meio ambiente, que protege a biodiversidade, mas é também aquela que deve dar trabalho para muitas pessoas.

Qual o desafio do Brasil para erradicar a pobreza?

MORIN: O Brasil é complexo. Há questões que requerem micropolíticas públicas regionais e uma dose de solidariedade entre os seres humanos.

FONTE: O GLOBO

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