sábado, 16 de junho de 2012

Rio+20 e Mundo+50 :: Cristovam Buarque

A Rio+20 começa sob o risco de ser apenas um evento comemorativo da Rio 92, e com a chance de ser um marco para o Mundo+50. Para o Rio ser uma cidade marcante, divisor de águas na história mundial, como Bretton Woods, será necessário que a Rio+20 seja não apenas um evento comemorativo do passado, mas uma reunião que traga propostas alternativas capazes de reorientar os destinos da Humanidade e construir um futuro diferente da continuação do passado.

Será preciso que os chefes de Estado e de governo afirmem que a civilização está doente, mostrem os riscos que enfrentamos e proponham caminhos para os próximos 50 anos, com a reorientação do atual modelo de desenvolvimento.

Devem deixar claro que a sinergia histórica entre a democracia política, o crescimento econômico, a inovação técnica e o bem-estar social foi quebrada. O progresso baseado no crescimento econômico está esgotado devido ao surgimento de alguns novos fatores na realidade sociopolítico-econômica: os limites ecológicos, apresentando custos e riscos ao aumento da produção; a independência como o sistema financeiro funciona sem vínculos com o setor produtivo e sem controle de fronteiras; a megaconcentração de renda e de patrimônio em mãos de poucas pessoas do mundo; a revolução científica e tecnológica que começa a fazer desnecessário o emprego; o esgotamento da capacidade de financiamento público para o sistema de bem-estar social; o endividamento dos governos, mesmo em países desenvolvidos. Soma-se a isso a legítima, mas impossível, exigência de grandes contingentes populacionais à voracidade do consumo.

Na definição de novos rumos para o mundo global em marcha, chefes de Estado e de governo devem levar em conta esses fatores que limitam o crescimento e oferecer alternativas sociopolítico-econômicas diferentes do progresso. Precisam reconhecer o esgotamento do projeto civilizatório baseado no crescimento da produção; deixar claro que a solução para o futuro não está apenas em usar insumos verdes; continuar atendendo à mesma voracidade do consumo graças ao aumento desenfreado da produção.

Muito mais do que se reunir para definir como continuar o mesmo progresso, apenas substituindo a energia fóssil por economia verde e definindo mecanismos para pequenas distribuições de renda aos mais pobres, será preciso acenar para um novo conceito de progresso: valorizar o bem-estar e mesmo a felicidade mais do que o nível de renda, produção e consumo; submeter o crescimento econômico ao equilíbrio ecológico e à manutenção da diversidade; modificar o PIB de maneira a valorizar o tempo livre e as atividades culturais; reorientar a primazia do consumo de bens privados para o uso de bens públicos; parar de considerar a produção de armas como avanço civilizatório.

Se a Conferência quer ser mais do que um evento de alguns dias comemorativos do passado, se quer durar décadas, deve formular um Programa Mundial para a Reorientação do Avanço da Humanidade. Agora, o caminho não é a reconstrução industrial, como foi concebido em Bretton Woods pelo Plano Marshall. Desta vez, o caminho está em transformar a própria mentalidade do desenvolvimento desigual e insustentável, mesmo usando economia verde, para um desenvolvimento harmônico, entre os seres humanos e deles com a Natureza.

O caminho para isso estaria em uma espécie de Plano Mundo+50, que defina regras mundiais para o controle internacional do uso dos patrimônios da Humanidade de cada país; determine uma política fiscal internacional para penalizar ou incentivar a produção, conforme seu impacto ecológico; ofereça acesso aos povos aos benefícios da ciência e tecnologia; assegure um fundo mundial que possa oferecer recursos para financiar programas de transferência de renda condicionada à educação; e garanta a formação e a remuneração de professores, a construção e a aquisição de equipamentos para as escolas. Deveria também adotar as medidas para implantar um Tribunal Internacional para Julgar os Crimes Contra o Futuro da Humanidade, a fim de combater a destruição do meio ambiente, o empobrecimento de populações, a destruição da diversidade biológica e cultural.

Esse seria o caminho para reorientar o progresso, redefinindo-o, e não apenas mudando os insumos usados na produção. Isto faria da Rio+20, assim batizada pelo passado, um Mundo+50, olhando o futuro.

Cristovam Buarque é senador (PDT-DF).

FONTE: O GLOBO

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