sexta-feira, 24 de agosto de 2012

Ainda o mistério do desemprego - Vinicius Torres Freire

Qual seria a influência dos benefícios sociais no baixo nível da taxa de desemprego?

Está claro, faz agora quase dois anos, que a setores diferentes da economia brasileira caminham em ritmos desiguais. Tão desiguais que a coisa toda parece esquisita e meio difícil de entender, quando não parece mesmo preocupante.

O caso mais óbvio e ora de menção quase tediosa é o da indústria, que produz no mesmo nível em que o fazia lá por volta de 2007. Ou seja, a indústria parou, o conjunto da economia seguiu.

Mas, como se observa nesta coluna faz também um tempo, a disparidade mais impressionante é aquela entre a taxa de desemprego e o ritmo geral da economia.

Como se está cansado de saber, o desemprego é historicamente baixo, talvez o mais baixo em quase 40 anos, embora a comparação seja difícil de fazer, e não só por causa das mudanças nas estatísticas, mas na geografia econômica brasileira.

A taxa de desemprego baixou enquanto a economia passava de um crescimento de mais de 7% (2010) para um ritmo inferior a 2%, como neste ano.

Economistas levantam hipóteses diferentes, todas aparentemente com algum razão.

Primeiro, pensou-se que empresários represavam empregados difíceis de achar e caros de treinar pois esperavam uma retomada rápida da economia depois da freada de 2011.

Segundo, observou-se que o país passa por uma mudança demográfica. A oferta de trabalhadores é agora menor.

Terceiro, notou-se que a economia passa por uma mudança ("estrutural" ou não): o setor de serviços infla e absorve os trabalhadores empregáveis (ou desempregados) da indústria avariada.

Quarto, imaginou-se até que a economia brasileira talvez esteja crescendo um pouco mais do que dizem as estatísticas oficiais, que não seriam capazes de captar o crescimento veloz do setor de serviços. Portanto, a disparidade entre desemprego baixo e crescimento não seria assim tão grande.

Esta última parece a hipótese mais fraca. As demais são todas razoáveis, mensuráveis e, de qualquer modo, não excludentes.

O que é mais difícil de ouvir, até de economistas "liberais", é que talvez o aumento do valor e do número das transferências sociais de algum modo limite a oferta de trabalhadores.

Transferências sociais: pagamentos de benefícios como aposentadorias, em especial as "rurais", Bolsa Família e outras do gênero. Dados o valor e o aumento do número de benefícios, haveria uma fatia de trabalhadores potenciais que permaneceria fora do mercado de trabalho, à espera de oportunidades que compensassem o valor do benefício.

É apenas uma hipótese. Não, não se trata de dizer que o "Bolsa Família estimula a vagabundagem" ou outras simplificações sórdidas desta espécie.

O Bolsa Família existe, entre outros motivos, porque parte imensa da população está involuntariamente excluída de mercados, seja por falta de treinamento profissional, desconhecimento de oportunidades, geografia, descasamento entre necessidades do mercado e capacidades do trabalhador etc.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

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