quinta-feira, 23 de agosto de 2012

Defesa sofre dura derrota no mensalão

Revisor segue relator, rechaça tese de que não houve desvio de dinheiro público e pede a condenação de Pizzolato e de Valério

Como nas sessões anteriores, esperava-se ontem um novo embate entre os ministros do STF que mais conhecem o processo em julgamento.Mas, na prática, o que fez o revisor, Ricardo Lewandowski, foi reforçar o voto do relator, Joaquim Barbosa. Ele foi veemente ao culpar Henrique Pizzolato, ex-diretor de Marketing do BB, pelo desvio de verba pública do banco, por meio da Visanet, para irrigar o suposto esquema criminoso. A coincidência dos votos do relator e do revisor praticamente desmonta a principal linha da defesa dos réus: a de que os recursos eram de caixa dois de campanha.

2 x 0 pela condenação

Lewandowski segue o entendimento de Barbosa e vota pela punição de ex-diretor do BB por corrupção passiva, peculato e lavagem de dinheiro. Já Marcos Valério, por corrupção ativa e peculato

Ana Maria Campos, Helena Mader e Diego Abreu

Depois de sessões marcadas por embates entre os dois ministros que mais conhecem o processo do mensalão, o revisor, Ricardo Lewandowski, e o relator, Joaquim Barbosa, falaram ontem a mesma língua. Ambos concluíram pela condenação de quatro dos 37 réus. O ex-diretor de Marketing do Banco do Brasil (BB) Henrique Pizzolato, petista histórico que atuou ao lado de Delúbio Soares na arrecadação de recursos para a campanha presidencial em 2002, foi considerado culpado pelos crimes de corrupção passiva, peculato e lavagem de dinheiro. Como Barbosa, Lewandowski também condenou o empresário Marcos Valério e dois de seus ex-sócios por desvios de recursos do Banco do Brasil por meio do Fundo Visanet e pagamento de propina a Pizzolato. Considerado o operador do mensalão pela Procuradoria Geral da República, Marcos Valério pode pagar por corrupção ativa e peculato.

No seu voto, Lewandowski adotou ontem um estilo diferente do seguido pelo relator. Barbosa tratou das denúncias relacionadas ao Banco do Brasil e à Câmara dos Deputados pela descrição dos fatos e em seguida o envolvimento dos réus. Lewandowski tratou das acusações pelos personagens e o envolvimento deles nos crimes descritos na Ação Penal 470. Os dois, no entanto, concordaram em pontos essenciais. Ambos consideraram que Pizzolato autorizou pagamentos da ordem de R$ 73,8 milhões para a DNA Propaganda, sem contrapartida contratual. Os serviços foram comprovados por meio de 80 mil notas fiscais frias.

Lewandowski também sustentou a tese, encampada por Barbosa, de que para efeito de consideração do crime de peculato basta que um funcionário público esteja envolvido em desvio ou apropriação de bem, independentemente de haver dinheiro público ou privado. Como exemplo, citou o oficial de Justiça que se apropria de algo privado sob guarda judicial. A defesa de Pizzolato havia afirmado que os recursos da Visanet são privados. "Mas esse aspecto mostra-se irrelevante para o deslinde da questão", justificou Lewandowski. Para o revisor, o dinheiro do fundo é, sim, proveniente do Banco do Brasil e, portanto, tem origem pública.

Num ponto, no entanto, houve conflito de posições: a avaliação sobre desvio de dinheiro do BB por meio da suposta apropriação indevida por parte da DNA Propaganda do chamado "bônus de volume", um incentivo que as empresas de comunicação oferecem pela veiculação de anúncios. O crédito, avalia Lewandowski, pertence à agência e não ao anunciante, como acredita Barbosa.

O revisor, inclusive, contestou laudo da Polícia Federal que atestou o desvio. "O sapateiro foi além da sandália", disse Lewandowski, no entendimento de que os peritos não compreenderam as regras do mercado. O ministro estava decidido a absolver Pizzolato e Marcos Valério nesse ponto, mas disse que mudou de ideia na véspera da sessão de ontem, à noite, quando retornava da posse da ministra Assusete Magalhães no Superior Tribunal de Justiça (STJ) e meditou sobre o voto de Barbosa.

Ele concluiu que havia outro tipo de irregularidade. A empresa de Marcos Valério teria emitido notas fiscais com pagamento de bônus de volume por serviços prestados por empresas como gráficas. A agência, então, recebeu comissão e incentivo pela terceirização de serviços, o que é ilegal. O incentivo, na avaliação de Lewandowski, só existe na relação entre veículos de comunicação e agências de publicidade.

Pacote

Um dos aspectos que revisor e relator concordaram foi o pagamento da propina a Pizzolato. A alegação da defesa do ex-diretor do BB é de que ele recebeu os R$ 326 mil de Marcos Valério em envelopes, sem saber o conteúdo dos pacotes. Depois, teria repassado a um intermediário do PT. A alegação foi duramente refutada pelo revisor. Para Ricardo Lewandowski, essa versão foi derrubada pelas provas do processo. "Apesar de o réu Henrique Pizzolato ter negado o recebimento de R$ 326 mil, afirmando que não tinha conhecimento do conteúdo do envelope trazido do Banco Rural, e não obstante ter dito que fazia apenas um favor ao corréu Marcos Valério, a verdade é que a sua versão não condiz com as provas dos autos", afirmou o revisor.

O advogado de Pizzolato, Marthius Sávio Lobato, entende que seu cliente não pode pagar sozinho por decisões colegiadas de toda a diretoria do BB, como teria ocorrido com relação ao contrato com a empresa de Marcos Valério. "Todos deveriam ser responsabilizados. Eles deveriam estar aqui nos autos. Ainda tenho a esperança de que a minha defesa seja acatada pelos demais", disse. Lewandowski também pediu a condenação de dois ex-sócios de Marcos Valério, Cristiano Paz e Ramon Hollerbach, por corrupção ativa e peculato.

"O sapateiro foi além da sandália" Ricardo Lewandowski, ministro-revisor do mensalão

Análise da notícia. Os próximos capítulos...

Quem esperava que o revisor, Ricardo Lewandowski, daria a largada nessa etapa do julgamento com clara divergência em relação às posições defendidas pelo relator, Joaquim Barbosa, se decepcionou.

Os dois ministros, que tiveram embates duros nas primeiras sessões, até agora chegaram às mesmas conclusões, com apenas pequenas diferenças pelo caminho, sobre a culpa do ex-diretor de Marketing do Banco do Brasil Henrique Pizzolato e do empresário Marcos Valério. Aos olhos dos dois ministros, ambos devem pagar por crimes graves. Como Barbosa, Lewandowski foi rigoroso.

Ainda é cedo, no entanto, para falar em sintonia de votos. Uma diferença essencial já pode ser detectada. O relator atacou na estreia de seu voto o núcleo político ao condenar o deputado João Paulo Cunha (PT-SP) e declarar que dinheiro público foi usado para pagar parlamentares escolhidos por Delúbio Soares.

Houve 50 citações ao ex-tesoureiro do PT no voto de Barbosa. Nenhuma lembrança ainda no de Lewandowski. A seguir cenas dos próximos capítulos. (AMC)

FONTE: CORREIO BRAZILIENSE

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