quarta-feira, 22 de agosto de 2012

Exigências elitizam poupança

Depósito inicial pode ser de até R$ 1 mil, aponta pesquisa

Pesquisa em 35 agências no Rio mostra que bancos estão exigindo até R$ 1 mil para abrir uma caderneta, opção tradicional para quem começa investindo pequenas quantias. Com a redução dos juros, bancos estão direcionando clientes para produtos que garantem mais lucros.

Caderneta agora mais restrita

Bancos, incluindo a Caixa, exigem aplicações mínimas de até mil reais para abrir poupança

Lucianne Carneiro

Ícone de aplicação simples e ao alcance do pequeno investidor, a poupança está se tornando menos acessível: bancos estão exigindo depósito mínimo entre R$ 50 e R$ 1 mil de quem pretende abrir uma caderneta. Os valores mínimos foram encontrados pelo GLOBO em dezenove de 35 agências no Rio dos cinco maiores bancos do país - Caixa Econômica Federal, Banco do Brasil, Itaú Unibanco, Bradesco e Santander.

Para especialistas no setor bancário, com a redução das taxas de juros no país ao seu menor patamar histórico, as instituições financeiras viram seus ganhos com empréstimos reduzirem, o que pressionou as margens de lucro e levou as empresas a direcionarem ainda mais o foco para produtos com maior retorno, como os fundos de investimentos. Além disso, a preocupação com os custos aumenta, tornando mais rígidas as metas para o desempenho das agências.

Segundo o professor da FEA/USP e responsável pelo site comdinheiro.com.br, Rafael Paschoarelli, está ocorrendo migração dos recursos de pequenos investidores e da classe média dos fundos de investimentos para a caderneta.

- Os bancos querem vender outros produtos, que deem mais margem financeira que a poupança - diz o economista.

Nas sete agências da Caixa consultadas pelo GLOBO, foi exigido mínimo de aplicação de até R$ 100. Entre todos os bancos, o maior valor (mil reais) foi encontrado numa agência do Itaú Unibanco no Leblon. Nas demais agências do banco consultadas, o valor era de R$ 200 ou R$ 250. Quatro agências do Santander pediram entre R$ 50 e R$ 100, enquanto outras três não exigiam depósito mínimo. Em cinco agências do Bradesco, a abertura de poupança é franqueada a todos, mas duas solicitaram valores mínimos de R$ 50 e R$ 70. No Banco do Brasil, não há piso para depósito, mas três de sete unidades pediram apresentação de comprovante de renda.

Não há regulamentação nem do Banco Central (BC) nem do Conselho Monetário Nacional (CMN) sobre o tema, mas tradicionalmente não existia aplicação mínima na poupança.

- A poupança é um produto popular e não deveria ter valor mínimo de investimento. Os bancos estão sentindo a pressão das taxas de juros em suas margens financeiras e querem ganhar com outras receitas - afirma João Augusto Salles, analista da Lopes Filho & Associados.

Instituições selecionam cliente, diz analista

Para Luis Miguel Santacreu, da agência classificadora de risco Austin Rating, algumas instituições já são naturalmente mais seletivas em relação a novos clientes, mas o novo cenário aumentou a atenção dos bancos para seus custos:

- Juros menores tornam maiores os desafios das despesas e o gerente é muito cobrado. Os bancos talvez não queiram que qualquer um seja correntista porque talvez não seja interessante nem operacionalmente, porque sobrecarrega as agências, nem financeiramente, porque esse cliente de poupança não usa todos os produtos e serviços da instituição.

Na avaliação do presidente do Sindicato dos Bancários do Rio, Almir Aguiar, a exigência de valores mínimos de aplicação da poupança está ligada às metas das instituições financeiras.

A manicure Rejane de Souza Santos foi uma das candidatas a clientes prejudicadas. Com R$ 50 nas mãos, foi à Caixa com o objetivo de abrir uma caderneta, mas não conseguiu:

- Disseram que eu precisava de R$ 500 para abrir a poupança. Cheguei a ligar para a Ouvidoria da Caixa, mas disseram que cada agência pode determinar o valor.

O GLOBO esteve na agência indicada por Rejane, mas o funcionário não confirmou a exigência de R$ 500 para a abertura da caderneta. Mas, no Serviço de Atendimento ao Consumidor (SAC), informaram que cada agência tem liberdade para fixar o valor mínimo.

Bancos dizem que casos são pontuais

A aplicação financeira mais tradicional do país vem recebendo grande volume de recursos desde que o BC começou a baixar os juros básicos da economia, reduzindo a rentabilidade de fundos. Como não tem cobrança de taxa de administração ou Imposto de Renda, a caderneta oferecia ganhos mais altos, já que tinha garantido rendimento de TR mais 0,5% ao mês. Para contornar a situação, o governo alterou o cálculo de remuneração para 70% da taxa básica, quando esta atingir 8,5% ao ano ou ficar abaixo disso, o que aconteceu em junho. Em julho, a captação líquida (depósitos menos retiradas) foi de R$ 6,048 bilhões, um recorde.

Procurados, Caixa, Bradesco e Santander informaram que foram casos pontuais e que não há investimento mínimo para quem quer abrir uma poupança. O Itaú Unibanco afirmou que a aplicação inicial para a modalidade é de R$ 50. Já o Banco do Brasil disse que segue circular do BC para evitar lavagem de dinheiro no que se refere à comprovação de renda.

FONTE: O GLOBO

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