sexta-feira, 24 de agosto de 2012

Lewandowski vota pela absolvição de João Paulo Cunha

Juliano Basile, Maíra Magro e Fernando Exman

BRASÍLIA - O revisor do processo do mensalão no Supremo Tribunal Federal (STF), o ministro Ricardo Lewandowski, votou ontem pela absolvição do deputado João Paulo Cunha (PT-SP) por todos os crimes de que ele foi acusado, abrindo divergência com o relator, Joaquim Barbosa. Lewandowski concluiu que João Paulo, único entre os 37 réus que disputa as eleições deste ano, deve ser inocentado das práticas de corrupção passiva, peculato e lavagem de dinheiro. O deputado é candidato a prefeito de Osasco.

Já Barbosa havia condenado o parlamentar pelos três crimes. O revisor também absolveu o publicitário Marcos Valério e seus sócios Ramon Hollerbach e Cristiano Paz das acusações de corrupção e peculato na Câmara dos Deputados. Barbosa havia condenado os três. O julgamento sobre João Paulo, Valério e seus sócios será retomado na segunda-feira, quando os demais ministros da Corte vão apresentar os seus votos.

O relator e o revisor discordaram em todos os pontos quanto a João Paulo. Para Barbosa, o deputado cometeu crime de corrupção passiva ao receber R$ 50 mil de Valério. O dinheiro foi sacado por sua mulher, em 2003, quando a agência SMP&B, de Valério, venceu licitação para serviços de publicidade da Câmara, presidida, na época, por João Paulo. "Não há dúvida quanto a isso", disse Lewandowski, referindo-se ao saque. "Mas, desde logo, verifica-se que esses R$ 50 mil tinham referência clara com a pesquisa eleitoral que se pretendia fazer na região de Osasco", completou, aceitando o argumento da defesa.

Na quinta-feira, Barbosa defendeu a tese de que o destino dos R$ 50 mil é irrelevante para caracterizar o crime. Ontem, Lewandowski discordou frontalmente. Para ele, a comprovação do uso do dinheiro por João Paulo para pagar pesquisas eleitorais teria mostrado que o valor não foi propina dada pela SMP&B para ganhar a licitação na Câmara. "A verdade processual é que João Paulo recebeu para custear pesquisas processuais", disse o revisor. "O Ministério Público apenas lançou a tese abstrata de que João Paulo teria dado tratamento privilegiado à SMP&B, mas não logrou produzir uma prova sequer nem um mero indício de que João Paulo tenha interferido nos trabalhos da comissão de licitação ou influenciado seus membros para dar tratamento privilegiado à SMP&B", enfatizou.

Barbosa considerou que Valério mantinha contatos frequentes com João Paulo e que a SMP&B "subcontratou" os serviços de publicidade para, segundo ele, desviar o dinheiro. Lewandowski disse que essa premissa do relator foi "equivocada". "A denúncia de que houve subcontratação de 99,9% dos serviços não corresponde à realidade", rebateu Lewandowski. Segundo o revisor, o Tribunal de Contas da União (TCU) e a Polícia Federal atestaram que a SMP&B executou os serviços. "O valor foi gasto com propaganda em respeitados veículos de comunicação de todo o país", disse o revisor, passando a citar quanto cada órgão de imprensa recebeu.

O revisor também argumentou que, apesar de João Paulo presidir a Câmara, não foi ele, mas o diretor-geral da Casa, quem liberou valores para a agência de Valério. "Quem autorizava os pagamentos era o diretor-geral. Em outras palavras, João Paulo Cunha não era o executor do contrato de publicidade entre a agência e a Câmara."

Nem os sucessivos encontros de Valério com João Paulo, a caneta Mont Blanc que o parlamentar recebeu do primeiro e as passagens para o Rio de Janeiro que o publicitário pagou para a secretária do deputado levaram o revisor a concluir que houve uma troca de favores entre os dois. Na visão de Lewandowski, o que aconteceu foi a autorização dada por Delúbio Soares, então tesoureiro do PT, para João Paulo sacar R$ 50 mil para bancar pesquisas de campanha.

Ao fim do voto de Lewandowski, Barbosa anunciou que faria uma réplica. "Todas as respostas às duvidas trazidas pelo revisor encontram-se em meu voto. Deixo de apresentá-las dado o adiantado da hora. Reservo-me para trazê-las na segunda-feira", disse Barbosa. "Então, eu peço que o presidente me reserve um espaço para responder às eventuais dúvidas. Se houver uma réplica deve haver uma tréplica", disse Lewandowski.

O presidente, ministro Carlos Ayres Britto, disse que Lewandowski teria o direito de usar a palavra, mas que cabe ao relator "a função de ordenar o processo". Para ele, a função do revisor seria apenas complementar à do relator. Lewandowski discordou e ameaçou deixar o STF durante a réplica de Barbosa. "Se ficar assentado que não terei a tréplica, talvez, possa me ausentar do plenário quando vossa excelência (Barbosa) for fazer as suas razões." Britto encerrou a sessão, deixando os debates para segunda-feira.

Para os advogados de defesa, o voto de Lewandowski sobre João Paulo foi o prenúncio de que ele e outros ministros também podem absolver esse e outros réus. "É um excelente começo. A linha de defesa vem muito confirmada nesse voto", afirmou Alberto Zacharias Toron, advogado do deputado. Para ele, o revisor "lavou a alma" de seu cliente. "Esse voto lavou a alma do deputado, pôs as coisas em seu devido lugar e, agora, vamos esperar pelos demais ministros do STF para ver quais votos eles vão sufragar", concluiu Toron.

Segundo Antonio Carlos de Almeida Castro, advogado do publicitário Duda Mendonça, Lewandowski procurou identificar se há contrapartida aos saques - uma questão essencial para comprovar as acusações de corrupção. "O revisor mostrou que é importante verificar se houve ato de ofício", afirmou. Outros réus estão em situação parecida, como os que fizeram saques alegando que o dinheiro seria para verba de campanha.

Antes de votar as acusações contra João Paulo, Lewandowski e Barbosa haviam concordado que quatro réus envolvidos no desvio de dinheiro público através do fundo Visanet devem ser condenados. São eles Henrique Pizzolato, ex-diretor de marketing do Banco do Brasil, Valério, Paz e Hollerbach. Os dois também votaram pela absolvição de Luiz Gushiken, seguindo a conclusão do Ministério Público que não encontrou provas de que o ex-ministro da Comunicação Social teve contatos com Pizzolato.

"Agora, a situação se extremou", avaliou Marcio Thomaz Bastos, que defende José Roberto Salgado, ex-diretor do Banco Rural. Assim que o STF terminar de votar as acusações de desvio na Câmara e no BB, os réus do banco vão ser os próximos a serem julgados.

FONTE: VALOR ECONÔMICO

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