quinta-feira, 30 de agosto de 2012

O BC independente? - Antônio Correa de Lacerda

Amanhã, 31 de agosto, completa um ano que o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central do Brasil (BC) surpreendeu muitos ao reduzir em 0,5 ponto porcentual a taxa básica de juros (Selic), então em 12,5% ao ano, dando início a um ciclo continuado de novas reduções que a trouxeram ao nível atual, de 7,5% ao ano. A decisão de então do Copom gerou muita controvérsia.

De um lado, economistas, contrários à medida, a julgavam descabida e de elevado risco. Para estes, o nível de inflação no País exigia taxas de juros ainda altas e a sua redução seria um risco para a estabilidade. Do outro lado, a minoria, via a decisão como tardia, ainda conservadora, mas acertada. Isso porque o País estava na contramão da tendência internacional, com taxas de juros muito altas e um espaço enorme para sua redução.

Decorrido o primeiro ano, o cenário previsto pelo BC, expresso nas Atas das reuniões do Copom, revelou-se mais acertado que o dos seus críticos. A deterioração decorrente da crise europeia e o baixo crescimento dos EUA foram impactantes para a desaceleração do crescimento econômico da China. O enfraquecimento da economia mundial gerou uma sobreoferta de produção e uma desinflação, especialmente nas commodities metálicas.

Vale destacar que os bancos centrais das economias centrais adotaram, desde o final de 2008, um movimento simultâneo de redução de suas taxas básicas de juros, ao mesmo tempo que ampliaram a liquidez nos mercados. Vivemos um longo ciclo de taxas de juros reais negativas. O Federal Reserve (Fed, o banco central dos EUA) já manifestou que não pretende alterar suas baixas taxas de juros pelo menos até 2014.

Há uma longa discussão sobre a chamada independência dos bancos centrais. Na visão ortodoxa, eles deveriam ter total autonomia diante dos governos. Trata-se de uma discussão um tanto defasada em relação à situação do mundo atual. O que tem ocorrido, na prática, é que os bancos centrais vêm atuando de forma coordenada com seus governos nacionais, assim como com seus equivalentes em outros países, visando a combater os efeitos da crise e evitar o seu agravamento.

Especialmente para os países em desenvolvimento, a passividade diante do quadro internacional ou uma interpretação equivocada dos sinais representaria custos onerosos sobre o nível de atividade, custo do financiamento da dívida pública e níveis reais de suas taxas de câmbio. Para o Brasil - que, em 2008, quando dos efeitos da crise do mercado subprime norte-americano, já havia cometido o erro de não baixar rapidamente as taxas de juros básicas, e pagou um alto preço por isso - era preciso, diante do agravamento da crise europeia em 2011, ousar com responsabilidade e agir. Isso, a despeito das resistências de alguns setores do mercado.

Daí a importância da autonomia e da independência do BC. Aqui, elas não estão relacionadas ao Executivo, mas às pressões do mercado. É preciso que as autoridades monetárias decidam e implementem as medidas de política econômica, tendo em vista o que é mais adequado para o conjunto da economia.

Outra mudança importante e bem-sucedida foi a da remuneração da caderneta de poupança, fator sempre apontado como impeditivo para a queda dos juros, que foi conduzida com competência e sem gerar quebras de contratos.

Porém ainda estamos longe de imaginar que a batalha chegou ao fim. Na verdade, ela só começou. Foi rompido um paradigma importante que permitiu ao Brasil atingir uma taxa básica real de juros mais próxima da média de países semelhantes. Houve progressos, mas é preciso avançar nas demais condições imprescindíveis para que os ganhos sejam perenes e sustentáveis no longo prazo. Entre outros desafios, temos de enfrentar a distorção representada pela indexação de contratos e tarifas. Um resquício do período de inflação crônica que precisa ser removido, pois também representa um limitador para a redução dos níveis inflacionários e, portanto, das taxas de juros.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

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