sábado, 25 de agosto de 2012

Obras em rodovias ficam só no papel

Quatro anos após a privatização pelo governo Lula, algumas das principais rodovias do país continuam sem as obras necessárias, apesar de todos os pedágios estarem sendo cobrados desde os primeiros meses. Na BR-101, entre Niterói e a divisa com o Espírito Santo, nenhum dos 176,6km de duplicação prometidos foram entregues. Na rodovia Régis Bittencourt, na altura da Serra do Cafezal, em São Paulo, só 4 de 30 quilômetros previstos foram duplicados. A obra, que deveria ser entregue em 2013, ficou para 2016. No local, este ano, houve oito mortes em 249 acidentes. Na BR-381 (Fernão Dias), trecho em obras foi simplesmente abandonado. A espanhola OHL alega dificuldades com licenças

Obras ainda na promessa

Quatro anos após licitações de estradas do governo Lula, melhorias não foram entregues

Rennan Setti, Lino Rodrigues, Michel Filho e Gustavo Stephan

Velhos problemas

CAMPOS DOS GOYTACAZES, Rio e São Paulo Passados quatro anos do início da concessão de sete trechos de rodovias federais licitados pelo governo Lula, em três das principais vias do país, muitas obras que já deveriam ter sido entregues ainda se arrastam, deixando um rastro de problemas e riscos para os usuários. O GLOBO percorreu os 320 quilômetros da BR-101 que foram concedidos à Autopista Fluminense, entre Niterói e a divisa com o Espírito Santo, e constatou que nenhum dos 176,6 quilômetros de duplicação prometidos foi entregue. Nos trechos paulistas da Régis Bittencourt (que liga São Paulo e Curitiba) e da Fernão Dias (São Paulo-Belo Horizonte), também há atrasos nas obras.

Nas três estradas, os motoristas começaram a pagar pedágio poucos meses após o início das concessões - as tarifas para carro de passeio variam de R$ 1,40 nas seis praças da Fernão Dias a R$ 3,10 nos cinco postos da BR-101. Segundo a OHL Brasil, que controla a Autopista Fluminense, o principal motivo para os atrasos na BR-101 é a dificuldade para obter licenças ambientais. A espanhola OHL também é responsável pela Régis Bittencourt, onde diz ter investido R$ 80 milhões; e pela Fernão Dias, estrada na qual, segundo a empresa, há 68 obras, com cerca de 830 trabalhadores.

Custo de transporte dobra

No Norte Fluminense, que concentra 80% da produção de petróleo do país e tem na BR-101 o seu cordão umbilical com o Porto do Rio, a concessão da estrada é motivo de frustração. Empresários, caminhoneiros e moradores admitem que o asfalto e a sinalização da estrada melhoraram, mas compartilham a sensação de que os pedágios vieram sem a contrapartida das intervenções prometidas, algumas delas esperadas há décadas. Aliada ao crescimento do tráfego provocado pelo desenvolvimento da indústria petroleira e pela construção do Superporto do Açu, de Eike Batista, a lentidão nos investimento torna a viagem cada vez mais longa, imprevisível, cara e arriscada.

O contorno de Campos - uma demanda que data dos anos 70 e prevê retirar a BR-101 da área urbana do município - já deveria estar pronto segundo o edital original, mas sequer tem um traçado definido. A construção de marginais na Avenida do Contorno, em Niterói, era esperada para 2011 mas só teve autorização para começar na semana passada. Os avanços que o GLOBO viu foram a pavimentação, hoje com poucos buracos; o acostamento, presente ao longo de toda a via e em bom estado; e a sinalização, que é abundante e adequada.

Mas os empresários reclamam que o atraso na duplicação provoca prejuízos. Segundo Lucas Vieira Filho, gerente administrativo da alemã Schulz - que produz tubos e conexões de aço para a indústria e tem duas fábrica em Campos -, o custo de transporte praticamente dobrou nos últimos anos devido aos engarrafamentos.

Licença ambiental atrasou

Em média, cinco caminhões deixam o pátio da Schulz diariamente rumo ao Porto do Rio. Se há alguns anos o trajeto era feito em menos quatro horas, hoje leva-se ao menos seis horas pela Ponte Rio-Niterói. Como a Ponte proíbe o tráfego de carretas antes das 22h, os motoristas seguem pela Rio-Magé; e a viagem acaba levando até 12 horas, a um custo de R$ 150 a mais em pedágio.

- Às vezes, a matéria-prima não chega a tempo, o que afeta a produção. Costumamos pagar uma diária a mais de contêiner para não perder espaço no navio caso nossos tubos demorem a chegar - diz Vieira. - O edital de concessão privilegiou o menor custo, mas permitiu que os prazos das obras fossem muito elásticos.

Segundo a Polícia Rodoviária Federal (PRF), os acidentes fatais diminuíram no período de concessão, mas o número de ocorrências aumentou. Na terça-feira, a equipe do GLOBO viu dois carros destroçados na altura de Casemiro de Abreu. Um Vectra que seguia no sentido Rio foi surpreendido por um Celta na contramão. A motorista do Celta quebrou o fêmur esquerdo; a vítima do outro carro saiu ilesa.

- O pedágio é uma mina de ouro, mas muita gente continua morrendo na rodovia e as obras de duplicação só acontecem em pouquíssimos quilômetros - diz a empresária Heloísa Raposo, de 64 anos, que integra a Associação de Parentes das Vítimas da BR-101 e perdeu uma filha em um acidente na via.

Segundo o diretor superintendente da Autopista Fluminense, Alberto Gallo, o que está atrasando as obras de duplicação é a dificuldade para obter licenças ambientais. O projeto abrange 176,6 quilômetros e deve ser concluído até 2017. Hoje, ele está dividido em três trechos, mas há obras em apenas um: entre Macaé e Campos. A concessionária promete entregar um pedaço de 12 quilômetros até setembro e o restante, em 2013. O trecho entre Rio Bonito e Casemiro de Abreu depende da Licença de Instalação (LI) do Ibama.

Na Régis, 249 acidentes

Na Régis Bittencourt, o trecho da Serra do Cafezal, entre as cidades de Juquitiba e Miracatu, aguarda a duplicação de 26 dos 30 quilômetros previstos no contrato de concessão, vencido pela espanhola OHL em 2007. A demora na obras, cujo investimento é de R$ 650 milhões, é uma das causas do grande número de acidentes. Só este ano, foram 249 no trecho, com oito mortos. Em 2011, foram 444, com 16 vítimas fatais.

O caminhoneiro Sérgio Tomiazzi, que enfrenta o sinuoso trecho da serra do Cafezal pelo menos duas vezes por semana, sente na pele a demora na entrega das obras.

- Melhorou bastante com a terceira pista, mas esse trecho de serra ainda é muito perigoso. Muitos colegas abusam da velocidade. Fazem ultrapassagens perigosas e colocam a vida de pessoas em risco. Se a obra estivesse pronta, nada disso aconteceria - diz Tomiazzi.

FONTE: O GLOBO

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