segunda-feira, 17 de setembro de 2012

Cidadania e direitos - Cândido Grzybowski

Embargos feitos pelo Ministério Público Federal levaram a Justiça Federal a suspender e paralisar as obras da usina de Belo Monte e da duplicação da Estrada de Ferro Carajás. Os direitos da população dos territórios ocupam o centro nessa disputa. Esta é a questão política - para além da jurídica e de modelo de desenvolvimento - que importa analisar.

Os territórios são espaços de vida humana. Não são somente naturais, mas espaços geográficos dinâmicos, com história humana passada e história em construção. Estamos diante do modo de ocupar e usar o espaço natural, o bem comum da vida, e de organizá-lo como território humano, de cidadania, de democracia em construção. Os territórios condensam questões de justiça e cidadania socioambiental, antes de serem um recurso natural a ser explorado.

Com a globalização, o capitalismo transformou o planeta todo em seu espaço de valorização. O capital que se investe num território visa à sua própria valorização, determinada por interesses da grande corporação econômico-financeira, exógena a ele. Nada a ver com a sustentabilidade da vida e da cidadania, com o bem viver das populações que se identificam com o território, nele vivem e dependem das suas possibilidades. Com a implantação de grandes obras na Amazônia, por exemplo, reinventa-se e se radicaliza a colonização, a ocupação dos territórios, não para servir à vida das populações aí existentes e respeitando as suas condições. Para o capital, os diferentes territórios, em qualquer parte do mundo, não passam de um diferencial de negócios, um "plus" na competição entre grandes empresas por mercados e por lucros crescentes. Para o capital, trata-se de ocupar os territórios com estratégias definidas fora e para fora. Mas isto só é possível com o apoio político do poder central, também exógeno ao território, com grandes financiamentos e subsídios.

Neste quadro, muda o caráter político da disputa do território. Ela adquire uma dimensão de direitos de cidadania que o extrapola. Nessa luta, está contida uma dimensão planetária, que a torna solidária com todas as diversas lutas mundo afora contra o capitalismo desterritorializado e sua lógica de racionalidade econômica de apropriação privada, mercantilização e domínio dos "comuns".

As vitórias jurídicas obtidas pelos movimentos das comunidades indígenas contra o complexo hidrelétrico de Belo Monte e pelo Movimento de Justiça Nos Trilhos contra a Estrada de Ferro Carajás devem ser celebradas como reconhecimento de direitos coletivos de cidadania. O que se disputa em Belo Monte e Carajás tem a ver com cidadania, democracia e sustentabilidade com justiça social, não só dos diretamente atingidos, mas de todos nós.

FONTE: O GLOBO

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