quinta-feira, 27 de setembro de 2012

Joaquim x Lewandowski: duelo acirra ânimos no ST


Relator é duro com revisor do mensalão por absolver ex-dirigente do PTB de dois crimes,em decisão que mais adiante pode favorecer Dirceu. Colegas tiveramde intervir para pôr fim à discussão.

Ministros intervêm em bate-boca no STF

Presidente do Supremo e Marco Aurélio interrompem discussão áspera entre o relator e o revisor do processo


Helena Mader, Diego Abreu


As rusgas entre o relator do mensalão, ministro Joaquim Barbosa, e o revisor do processo, Ricardo Lewandowski, já viraram rotina durante o julgamento do caso. Mas o intenso bate-boca protagonizado ontem pelos dois magistrados constrangeu os colegas da Corte, que tiveram que intervir para acabar com a discussão. Por trás do acalorado debate estava o entendimento divergente dos dois magistrados a respeito de um importante aspecto da denúncia da Procuradoria Geral da República, que embasa a tese de que o ex-ministro José Dirceu seria o "chefe da quadrilha" do mensalão.

Lewandowski absolveu o ex-dirigente do PTB Emerson Palmieri das acusações de corrupção passiva e lavagem de dinheiro. O revisor entendeu que o réu não tinha conhecimento do esquema. Segundo a denúncia da PGR, Palmieri teria acompanhado o empresário Marcos Valério e o advogado Rogério Tolentino, corréus na ação, em uma viagem a Lisboa. O objetivo da visita à capital portuguesa seria um encontro com representantes da Portugal Telecom, supostamente agendado a mando de Dirceu. Nessa reunião, os três réus teriam tratado do pagamento de R$ 24 milhões ao PT, para que a Portugal Telecom fosse beneficiada na compra da Telemig.

A confusão no plenário começou quando Lewandowski explicava seus argumentos para absolver Emerson Palmieri. "Ele (Emerson Palmieri) está na lista de recebedores de recursos feita por Marcos Valério e confirmada por Delúbio Soares", argumentou Joaquim Barbosa, que interrompeu o revisor.

Lewandowski, que normalmente reage com calma aos questionamentos do colega, ontem se irritou e rebateu. "Se vossa excelência não admite a controvérsia, deveria propor ao STF que abolisse a figura do revisor. Quer que eu coincida com todos os pontos de vista de vossa excelência?", questionou Lewandowski. O presidente da Corte, Ayres Britto, saiu em defesa do revisor. "Preceitos normativos admitem interpretação diferenciada, também os fatos admitem interpretação diferenciada. A análise passa pela subjetividade do analista", comentou Britto.

Diante da intervenção do presidente, Joaquim Barbosa fez uma afirmação que contribuiu para esquentar ainda mais o clima na Corte. "Como ministros do Supremo, não podemos fazer vista grossa dos autos", disse o relator. Marco Aurélio Mello, um dos mais antigos do STF, se revoltou com a afirmação. "Somos 11 juízes, ninguém faz vista grossa. Seja razoável, ministro", pediu Mello. "Cuidado com as palavras. Vossa excelência está em um colegiado de alto nível, então vamos respeitar os colegas. Vossa excelência não está respeitando a instituição", acrescentou Mello, que reclamou ainda da "agressividade" das palavras do relator.

Sem ilegalidade


Ricardo Lewandowski adiantou seu entendimento de que não vê nenhuma ilegalidade na viagem dos três réus a Lisboa, nem na reunião dos acusados com representantes da Portugal Telecom. "O próprio presidente da empresa disse em depoimento que não havia nenhum objetivo de natureza política", explicou o revisor. Segundo ele, Valério teria agendado o encontro por conta de seu interesse em manter os contratos publicitários da Telemig, caso a Portugal Telecom fechasse a compra da telefônica. Para ele, o objetivo da viagem não era pedir propina para o PT — argumento central da PGR para embasar a tese de que Dirceu era o chefe da quadrilha.


Joaquim Barbosa fez questão de questionar o argumento do revisor e disse que a viagem dos três corréus a Portugal é "bizarra" e "esdrúxula". Ele afirmou que Marcos Valério falou em nome do PT durante a visita a Lisboa. "Três pessoas saem do Brasil, nenhuma delas é representante do Estado brasileiro. Ao chegar lá, um cidadão de nome Marcos Valério se diz representante do partido que está no poder. Temos que examinar essa esdrúxula viagem. Qual era o objetivo dessa viagem? Esses fatos estão muito bem esclarecidos e é nosso papel interpretar o que está por trás dessa bizarra viagem a Portugal", afirmou o relator.

Fonte: Correio Braziliense

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