quarta-feira, 17 de outubro de 2012

'Há governos eleitos que tentam minar a democracia e tolher a liberdade'


Mudança de postura após eleições ameaça jornalismo, diz editor do "Post"

Gilberto Scofield Jr.

SÃO PAULO - Até ontem presidente da Sociedade Interamericana de Imprensa (SIP), Milton Coleman, vice-editor-executivo do jornal "The Washington Post", afirmou que a liberdade de expressão no continente americano avançou, mas vem sendo cada vez mais cerceada por governos eleitos democraticamente que depois alteram as leis para calar a oposição e minar a própria democracia, como ocorre em Argentina, Venezuela e Equador. O Brasil possui liberdade de expressão e de imprensa, mas também tem seus problemas, como a violência contra jornalistas.

O que dizem os relatórios produzidos pela SIP sobre a liberdade de expressão e de imprensa nas Américas?

Num sentido geral, há diferentes níveis de progressos democráticos no continente, e há países onde a situação se deteriorou. Não se pode comparar a situação no Brasil, por exemplo, com o que acontece no Equador, onde a situação da liberdade de imprensa e de expressão piorou. Ali, o desafio para os jornalistas é ficar vivo. Na Venezuela, não se aceitam críticas ao regime, e a imprensa é desmoralizada. Ali, o desafio é garantir a liberdade de expressão. Há governos democraticamente eleitos que usam instrumentos para minar a democracia tolhendo a liberdade de expressão, como Argentina, Venezuela e Equador. Isso é feito na forma de mudanças legais para sufocar as empresas jornalísticas ou seus profissionais. Ou mudanças fiscais para sufocar as empresas financeiramente.

Onde fica o Brasil nessa análise?

É a primeira vez que venho ao Brasil. O país tem uma imprensa livre e de qualidade, mas também tem problemas. No ano passado, por exemplo, quatro jornalistas brasileiros foram mortos, e o público precisa estar atento a isso. E há os países onde, apesar dos progressos, a situação se deteriorou.

Como por exemplo...

O México é um exemplo claro, com a escalada da violência ligada ao narcotráfico. O país federalizou os crimes contra jornalistas, de modo que se investiguem os casos apropriadamente, mas os assassinatos aumentam porque a violência cresceu.

O sistema interamericano, em especial o Comitê Interamericano de Direitos Humanos, corre risco? Por quê?

O sistema está em risco porque é muito difícil manter a autonomia de um organismo multilateral, como a OEA, a ONU ou a União Europeia, por exemplo. É difícil porque nenhum país quer um organismo dizendo a ele o que fazer. Mas, se fecharmos os olhos para os abusos cometidos no continente será como fechar os olhos ao Holocausto, cuja dimensão e o horror só foram devidamente percebidos ao fim da guerra. Com a desculpa de aumentar a transparência do sistema, muitos países estão dispostos a enfraquecê-lo, estabelecendo limites para que não sejam constrangidos.

Fonte: O Globo

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