sexta-feira, 12 de outubro de 2012

Para onde apontam as eleições e a crise? - Washington Novaes


São inquietantes, carregados de perplexidades e interrogações, os sinais advindos das eleições do último domingo, assim como dos julgamentos já conhecidos no âmbito do "mensalão", no Supremo Tribunal Federal (STF). Que querem dizer exatamente? Para onde apontam? Com que consequências?

Pode-se começar perguntando o significado e o desdobramento do fato de 35 milhões de eleitores se haverem recusado a votar no País todo - abstendo-se de comparecer às urnas, anulando o voto ou votando em branco. Isso representa mais de um quarto do eleitorado. Significa um questionamento crescente do sistema eleitoral em vigor? Prosperará? Tornar-se-á majoritário? Que transformações exigirá no âmbito dos partidos?

Na cidade de São Paulo, esses votos discordantes superaram os dos candidatos colocados em primeiro e segundo lugar (Agência Estado, 10/10).

Por outro ângulo, a Justiça Eleitoral vê-se às voltas com a impugnação de milhares de candidatos denunciados no âmbito da Lei da Ficha Limpa - por sua vez, fruto de iniciativa popular, levada ao Congresso Nacional com mais de 1 milhão de assinaturas. E também nesse terreno judicial, as condenações no STF de denunciados no "mensalão" põem em xeque a mais antiga prática dos partidos e esteio de sua atuação eleitoral, que é o caixa 2, com contribuições abertas ou ocultas de grandes interessados em projetos e obras públicas. Por onde caminhará isso?

Também se pode dizer que, no fundo, o quadro não mudou. PMDB, PSDB e PT continuam a dominar a relação dos eleitos em todo o País - embora isso não signifique exatamente uma adesão do eleitorado a visões políticas e métodos administrativos diferenciados. Também se multiplicam as siglas políticas e algumas "pequenas" parecem emergir. Talvez não seja precipitado afirmar que o Brasil está assistindo ao início de uma transformação em seu panorama político. No conjunto dos mais de 5.500 municípios as circunstâncias variam. Mas, nos dias em que vivemos, novos formatos e a rapidez da comunicação costumam produzir mudanças profundas em curto espaço de tempo. Principalmente num país com baixo índice de militância partidária ou de fidelidade a uma agremiação. De qualquer forma, já começam a tomar corpo na internet - é um exemplo - movimentos de coleta de assinaturas para fazer votar no Congresso uma reforma política, principalmente a introdução do voto distrital. (Misto? Ou sem reservar vagas privilegiadas para os "caciques" de cada legenda?)

Há muitas evidências da fragmentação do quadro: só um partido - o PSB, em Belo Horizonte e no Recife - conseguiu eleger, com o cabeça de chapa, mais de um prefeito nas capitais no primeiro turno. Outros prefeitos escolhidos no primeiro turno nas capitais tinham como lançadores diferentes partidos - em Goiânia, PT; em Palmas, PP; em Porto Alegre, PDT; no Rio de Janeiro, PMDB; em Aracaju, DEM e em Maceió, PSDB -, que reuniram diversos aliados. No segundo turno estarão envolvidos na disputa 12 partidos.

Eleições municipais em capitais populosas costumam ter características próprias, relacionadas com o quadro nacional, embora dependentes também de fatores locais. Nas cidades de menor população esses fatores locais são mais pronunciados. Mas é impossível não observar a fragmentação do quadro. E perguntar que consequências isso terá no plano nacional, no quadro partidário, nas futuras eleições gerais. De que modo influenciará o comportamento do Congresso e, nele, o das bancadas que apoiam o governo ou dele divergem. Como se traduzirá isso tudo na votação de temas delicados e polêmicos, como, por exemplo, a reforma fiscal, o Código Florestal, o novo Código Penal e outros? Talvez até mesmo na formação do Ministério, na composição de órgãos federais e/ou estaduais - basta ver a convocação urgente do líder do PMBD para discutir com a presidente da República esses temas, 12 horas depois de encerrada a votação.

Ao longo da campanha evidenciou-se, principalmente nas maiores cidades, que o eleitorado já não se satisfaz com promessas vagas em torno de transporte, segurança, educação. E ficou claro que a imensa maioria dos candidatos não tinha planos diretores efetivos, nem projetos amplos de descentralização administrativa, transferência das decisões, da aplicação e fiscalização de verbas, para conselhos comunitários. E tampouco questionaram caminhos para megaproblemas, como modelos de transporte baseados no automóvel. Que se fará no espaço urbano, já comprometido por esse modelo, que se espalha pelas cidades médias?

Se o Executivo e o Legislativo se verão às voltas com os novos tempos, o Judiciário também não escapará. A intensa exposição aos meios de comunicação no julgamento do mensalão - mesclado ao quadro eleitoral - terá, igualmente, reflexos profundos, numa área até aqui quase fechada, acessível apenas aos profissionais do Direito e seus eventuais constituintes.

E tudo isso acontece numa hora em que nossas políticas internas começam a demonstrar fragilidades diante de fatores internos e externos. Como mantê-las escoradas fundamentalmente no crescimento do consumo interno, se o próprio mercado de trabalho já dá mostras de estagnação, retrocesso até? Se o endividamento familiar está muito alto? Se mecanismos como o crédito consignado - base principal da expansão do consumo - parecem tender ao esgotamento? Se o produto interno bruto (PIB) está em declínio? Se nossos parceiros "emergentes" também estão às voltas com as crises econômica e política nos países industrializados? Se estes reduzem as importações?

A sensação é de que tudo mudará muito. Como disse há mais de meio século o cardeal belga Suenens - já citado aqui -, o que levava um século para acontecer hoje sobrevém em apenas uma década, o que levava uma década acontece em um ano. Isso, dito em 1968. Imagine-se hoje, com internet. É preciso ter muita pressa, para não ser atropelado pelos acontecimentos.

Fonte: O Estado de S. Paulo

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