sábado, 29 de dezembro de 2012

Meta fiscal cada vez mais longe

Em novembro o setor público teve déficit de R$ 5,5 bi, o pior resultado para o mês da série histórica. Apesar do artifício de descontar obras do PAC, ainda seria preciso superávit de R$ 17 bi em dezembro para fechar 2012 na meta

Muito longe da meta fiscal

Nem com artifício contábil governo consegue cumprir objetivo de superávit para pagar juros

Geralda Doca, Danilo Fariello e Henrique Gomes Batista

BRASÍLIA e RIO As contas do setor público consolidado, que reúne União, estados, municípios e empresas estatais, registraram déficit de R$ 5,5 bilhões no mês passado. Foi o pior resultado para novembro da série histórica do Banco Central (BC) e o primeiro déficit mensal desde março de 2010, que tinha sido de R$ 159 milhões. No ano, o governo conseguiu acumular um superávit primário (diferença entre receitas e despesas para pagamento de juros) de R$ 82,7 bilhões, o que corresponde a 2,06% do Produto Interno Bruto (PIB) - também o pior desempenho para o período desde novembro de 2009, quando a crise financeira internacional atingia o país em cheio.

Ao divulgar os dados referentes a novembro, o chefe do Departamento Econômico do BC, Tulio Maciel, disse que o déficit é expressivo e reflete crescimento das despesas em ritmo "muito maior" do que as receitas. Faltando apenas um mês para fechar o ano, os números indicam que o governo está cada vez mais distante do cumprimento da meta de superávit primário, que é de fazer uma economia de R$ 139,8 bilhões em 2012, o equivalente a 3,1% do PIB. Para isso, faltam nada menos que R$ 57 bilhões.

Governo poderia abater até R$ 40 bi

Mesmo recorrendo ao artifício de abater da meta os gastos com o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), haverá dificuldades para fechar as contas neste ano. No último relatório de despesas e receitas do Orçamento, o governo informou que pretende abater R$ 25,6 bilhões, o que reduziria a meta para R$ 114,2 bilhões - valor ainda distante dos R$ 82,7 bilhões de superávit registrados de janeiro a novembro.

Mas, o governo pode abater até R$ 40,6 bilhões (projeção do gasto total do PAC) da meta de superávit. Porém, de acordo com dados do Tesouro Nacional, foram aplicados até novembro R$ 28,4 bilhões. Mesmo que descontasse os R$ 40,6 bilhões, o governo ainda precisaria registrar superávit de R$ 17 bilhões em dezembro.

Apesar disso, Maciel garantiu que a meta será cumprida.

- A meta para o ano será cumprida com ajustes - disse Maciel, acrescentando que o Tesouro Nacional projeta um superávit "robusto" em dezembro.

Maciel destacou que o resultado do setor fiscal não deve ser analisado de forma isolada, mas dentro de um contexto global. Ele citou como vilões o baixo crescimento da economia neste ano; a queda na arrecadação, devido principalmente às desonerações para o setor produtivo; e a necessidade de ampliar os investimentos.

- Vejo um desempenho fiscal favorável, nessas circunstâncias - minimizou Maciel, acrescentando que 2012 foi um ano difícil.

Para Felipe Salto, economista da Consultoria Tendências, há claramente piora no resultado das contas públicas. Ele considera isso preocupante porque a questão fiscal foi um grande avanço do país. No médio prazo, disse, a relação dívida bruta/PIB, um indicador importante da economia, tende a subir.

- Significa que o governo está confirmando que a política fiscal tem uma nova roupagem, mas expansionista e que não segue mais a geração de superávits primários e o cumprimento de metas fiscais.

Já Raul Velloso, especialista em contas públicas, não vê problemas no curto prazo, na redução do superávit, principalmente num ano em que a economia não está crescendo. Mas ele critica a "mágica" com o abatimento dos gastos do PAC, alegando que isso traz falta de credibilidade. Defende que o governo apenas assuma o esforço possível de obter em tempos de crise externa.

Velloso disse também que o governo está equivocado ao ampliar os gastos correntes, em detrimento dos investimentos, que realmente ajudam na retomada da atividade econômica.

- Esse é o ponto fraco nessa história. Por enquanto, dá para reduzir o superávit primário sem maiores problemas porque a relação dívida/PIB está em declínio.

Ontem pela manhã, o Ministério da Fazenda divulgou que, em novembro, o governo central (Tesouro, Previdência e Banco Central) registrou o primeiro déficit primário mensal desde maio de 2010, com resultado negativo de R$ 4,3 bilhões, contra superávit de R$ 9,9 bilhões registrado no mês de outubro.

Com esse resultado, o governo precisa de superávit primário superior a R$ 10 bilhões em dezembro, sem considerar o resultado dos governos regionais e estatais. No acumulado no ano comparado a 2011, o resultado caiu quase um terço, de R$ 91,5 bilhões de janeiro a novembro do ano passado, para R$ 60,4 bilhões no mesmo período deste ano. A meta original do ano era de R$ 97 bilhões e, com o desconto dos investimentos do PAC, caiu a R$ 71,4 bilhões.

- O resultado de novembro está dentro da expectativa, na margem um pouco pior - disse o secretário do Tesouro Nacional, Arno Augustin, para quem o superávit de dezembro superará os dois dígitos, indicando a possibilidade de se atingir a meta do ano.

Colaboraram para o elevado déficit em novembro os desembolsos do Regime Geral da Previdência Social (RGPS). No mês em que foi pago o 13º salário, o RGPS teve déficit de R$ 5,4 bilhões. A queda na arrecadação de tributos também colaborou com o déficit. As receitas do governo central caíram R$ 8,1 bilhões de outubro para novembro, enquanto as despesas permaneceram estáveis.

Margarida Gutierrez, professora de economia da UFRJ, acredita que o governo só consegue atingir o resultado fiscal com o desconto dos investimentos do PAC se apelar para subterfúgios:

- A única manobra possível é a antecipar o recebimento de dividendos de estatais e BNDES. A nova regra do Conselho Monetário Nacional (CMN), de quinta-feira, pode ajudar nisso.

Manobra já foi feita em 2010

Margarida lembra que em 2010 o governo já fez uma manobra para alcançar a meta fiscal, quando incluiu a cessão onerosa de campos de petróleo para a Petrobras.

- Isso é um absurdo, não existe em nenhum lugar do mundo. O resultado fiscal está ruim porque o governo fez muitas desonerações, o que é bom; e elevou os gastos de custeio, o que é ruim. A arrecadação foi fraca com o crescimento medíocre (da economia) - disse.

Fonte: O Globo

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