segunda-feira, 21 de maio de 2012

OPINIÃO DO DIA – Vera Magalhães: a imprensa e o “azedado”

Em reunião na quinta-feira, a cúpula do PMDB desistiu de avalizar a estratégia do PT contra a imprensa e o Ministério Público na CPI do Cachoeira. Por isso Cândido Vaccarezza disse que a relação entre as siglas
tinha ''azedado''. Na conversa, da qual participou o vice-presidente, Michel Temer, o PMDB concluiu que comprar briga pelo PT era um erro. "Por que vamos entrar nisso se não queremos nos vingar de ninguém?", resumiu um dos participantes.

Vera Magalhães, Folha de S. Paulo, 20 de maio de 2012.

Manchetes de alguns dos principais jornais do Brasil

O GLOBO
Professor tem salário mais baixo do país
Usuário recorre a cheque especial 22 dias por mês
STF decide se Cachoeira vai à CPI

FOLHA DE S. PAULO
Volume de investimento do governo cai em 2012
'Puxadinho' de aeroporto é barato e veio para ficar
Congresso faz acordo para criar leis cibernéticas

O ESTADO DE S. PAULO
Mensalão e Cachoeira terão impacto em eleições, diz ministro
BNDES vai ganhar R$ 10 bi para linhas de crédito
Bom da Rio+20 é a sociedade, dizem cientistas

VALOR ECONÔMICO
CGU vê irregularidades em aplicações do FGTS
Dividendo já rende mais que juro real
Janela de oportunidade
Arcelor reduz produção de aço e adia projetos

CORREIO BRAZILIENSE
Governistas se apegam à mordomia do 14° e 15°
A dívida dos programas de creches

ESTADO DE MINAS
Basta subir na moto para tirar a carteira
Caso Cachoeira: Hora de apertar a quadrilha da contravenção

ZERO HORA (RS)
Burocracia emperra utilização de escolas fechadas no Estado
Estímulo: Pacote virá para carros e material de construção

JORNAL DO COMMERCIO (PE)
Costa vence, não leva e PT do Recife expõe racha
Dilma fará "pacote de bondades"

Um leilão sem estrelas

A PF investiga a venda do Hotel Nacional, no Rio. Um leiloeiro filiado ao PTB e um amigo de Carlinhos Cachoeira estão entre os favorecidos

Isabel Clemente e Hudson Corrêa

Uma torre redonda e envidraçada, com mais de 100 metros de altura, se destaca desde 1972 em São Conrado, bairro nobre da Zona Sul do Rio de Janeiro. Projetado por Oscar Niemeyer, o Hotel Nacional é um marco da arquitetura e já foi considerado o mais moderno da América Latina. Desde 1995, mais parece um imóvel fantasma, vítima das dificuldades financeiras de seu proprietário. Seu destino começou a mudar em dezembro de 2009, quando um leilão o transferiu da massa falida da Interunion Capitalização (dona do extinto Papa Tudo) para as mãos do empresário goiano Marcelo Limírio. Convocado a depor na CPI do Cachoeira, Limírio é parceiro de negócios do próprio contraventor Carlos Augusto de Almeida Ramos, cujo apelido dá nome à comissão de inquérito.

A ligação do novo dono do Nacional com Cachoeira seria uma coincidência não fosse o leilão outro caso de polícia. ÉPOCA descobriu que o negócio é investigado pela Polícia Federal. A Justiça autorizou a quebra de sigilo bancário de todos os investigados por suspeita de desvio de recursos da Interunion Capitalização e até lavagem de dinheiro (leia o quadro abaixo). Três coisas causaram estranheza aos policiais federais – e em duas delas estão envolvidas siglas de partidos políticos:

- O leilão foi remarcado várias vezes sem que o hotel fosse vendido. A última tentativa malsucedida, em 4 de novembro de 2009, estabeleceu um preço mínimo de R$ 118,5 milhões, com o pagamento mínimo de R$ 100 milhões praticamente à vista. No leilão seguinte, um mês e meio depois, o preço foi para R$ 85 milhões, com o pagamento inicial de R$ 21 milhões. Nessas condições bem mais amigáveis, foi arrematado por Limírio. (Ele não atendeu a reportagem de ÉPOCA por estar em viagem. Um de seus advogados negou sua participação no esquema de Cachoeira.) A queda de preço ocorreu com a aprovação da Superintendência de Seguros Privados, a Susep, órgão federal que fiscaliza 25% do mercado financeiro nacional – cujo comando, uma indicação política, vem sendo disputado pelo PT e pelo PTB desde o governo Lula. Na ocasião do leilão, o superintendente da Susep era o deputado federal Armando Vergílio, do PSD de Goiás, cujo padrinho é o deputado federal Jovair Arantes, do mesmo Estado. Líder do PTB na Câmara dos Deputados, Arantes é citado na Operação Monte Carlo da Polícia Federal, que deu origem à CPI do Cachoeira.

- Foram contratados dois leiloeiros, um em São Paulo e o outro no Rio de Janeiro, para o leilão do Hotel Nacional. O de São Paulo era Luiz Fernando Sodré Santoro, suplente do senador Mozarildo Cavalcanti (PTB-RR). Outra empresa, de propriedade da mulher de Santoro, ainda entrou no negócio. Junto, o casal recebeu R$ 3,85 milhões.

- A Polícia Federal investiga também a contratação do escritório de advocacia Mattos, Rodeguer Neto, Victoria, de São Paulo, por R$ 2,76 milhões, num processo do qual já participavam três escritórios de advocacia. Segundo ex-acionistas da Interunion Capitalização, a contratação teve como efeito apenas “arruinar o patrimônio alheio”.

A proposta de venda do Hotel Nacional, com preço mais baixo e melhores condições de pagamento, nasceu na própria Susep, segundo o liquidante José Emílio Quintas, encarregado de gerir a massa falida do Interunion. “Nada aqui foi o liquidante que decidiu ou fez sozinho. A Susep ratifica tudo”, diz ele. A Susep regula e fiscaliza o mercado segurador. Age também como fiscal das liquidações extrajudiciais das empresas sob seu chapéu, como era o caso da Interunion Capitalização. Segundo o deputado federal Vergílio, superintendente da Susep à época do leilão do Nacional, o negócio foi feito “dentro da legalidade”. “O processo ocorreu de forma transparente”, disse. De acordo com ele, o encarregado por acompanhar a liquidação da Interunion era o então diretor de Fiscalização da Susep, o petista Waldemir Bargieri. Vergílio afirma que Bargieri era da “mais alta confiança do ministro Guido Mantega (Fazenda)”.

Partiu de Bargieri o convite para Quintas assumir a liquidação da Interunion. “Mas eu não o conhecia”, diz Quintas, antes de detalhar informações sobre sua carreira técnica. Procurado, o Ministério da Fazenda informou que a escolha de Bargieri para a Susep seguiu “critérios técnicos” e negou haver ligação de natureza pessoal entre ele e Mantega.

A segunda linha de investigação diz respeito ao leiloeiro Santoro, filiado ao PTB desde 1997. Ele recebeu, com a empresa de sua mulher, R$ 3,85 milhões pelos serviços prestados no negócio. O valor chamou a atenção do ex-proprietário da Interunion, o empresário Artur Falk. Advogados de Falk afirmam que o leilão poderia ter sido realizado apenas por uma leiloeira do Rio, que já fora contratada para o serviço e pelo qual recebera R$ 425 mil. Ouvido pela polícia, o casal de São Paulo disse que as despesas do leilão ficaram em R$ 1,5 milhão. Documentos obtidos por ÉPOCA mostram que os investigadores não só consideraram alto demais o “lucro” de Santoro (R$ 2,3 milhões), como também levantaram suspeitas sobre o verdadeiro destino da quantia paga.

A cifra milionária foi motivo de bate-boca entre Falk e Santoro, numa reunião realizada pouco antes do leilão do Hotel Nacional, com pelo menos uma dúzia de testemunhas. Como a comissão milionária ficaria a cargo do comprador do hotel, e não da massa falida, Santoro questionou se Falk tinha algo pessoal contra ele. Segundo um dos presentes ao tenso encontro, Falk disse: “Sou contra pagar 4,5% a mais porque o que sobrar depois da liquidação é meu!”. O advogado José Roberto Batochio, que defende Santoro e sua mulher, diz que eles receberam “a comissão que a lei permite e ainda assumiram o risco de perder, se não houvesse venda, R$ 1,5 milhão gastos com editais e publicações”. Batochio conseguiu suspender, no Tribunal Regional Federal da 2ª Região, a quebra de sigilos de seus clientes. Mas a investigação policial continua. Sobre a escolha do petebista Santoro como segundo leiloeiro no negócio, Quintas diz que ele foi selecionado entre muitos candidatos a organizar o leilão do Hotel Nacional.

O terceiro foco de investigação é a contratação dos advogados em São Paulo. O escritório Mattos, Rodeguer Neto, Victoria foi contratado por R$ 2,76 milhões para defender a massa falida numa causa de R$ 184 milhões. O mesmo escritório de São Paulo recebeu ainda R$ 255 mil da massa falida para fazer o edital do leilão do Nacional. Um dos sócios, José Carlos de Alvarenga Mattos, afirma que o grupo trabalha há mais de 25 anos com liquidação de instituições financeiras. Ele diz que o escritório só recebeu R$ 690 mil até agora. “A gente vai receber (tudo) se houver sucesso no final da ação. O valor está dentro dos parâmetros (de mercado)”, diz Mattos. A quebra do sigilo bancário de envolvidos no leilão do Hotel Nacional, determinada pela Justiça, chamou a atenção do Ministério da Fazenda, que solicitou providências à Susep. Na semana passada, a Susep instaurou uma sindicância para averiguar os procedimentos no leilão, bem como a liquidação da Interunion, que se arrasta há 14 anos.

Com um patrimônio insuficiente para cumprir com suas obrigações, a Interunion sofreu intervenção em 1998. Falk foi condenado por gestão fraudulenta e entrou em atrito com os liquidantes da massa falida da empresa – cuja missão é vender o patrimônio da Interunion Capitalização para quitar as dívidas. Há milhões de reais em débitos pendentes, com o Poder Público e com credores privados, como os portadores dos títulos PapaTudo, que nunca viram a cor do dinheiro. Em 2006, Falk chegou a ser preso por tentar obstruir a Justiça. Hoje, ele tenta mais uma vez pressionar, com uma ação na Justiça, o atual liquidante, Quintas. Funcionário aposentado do Banco Central e ex-liquidante do Banco Nacional, Quintas assumiu a liquidação da Interunion em outubro de 2007. Acusado por Falk de “vários atos danosos à massa” e, por consequência, aos credores, Quintas pode ter respostas para muitas das perguntas feitas hoje pela Polícia Federal.

A prometida recuperação do Hotel Nacional é uma das bandeiras do prefeito do Rio, Eduardo Paes, que apresenta o projeto como se fosse seu. Segundo a prefeitura, a rede Intercontinental será a operadora do novo Nacional. É compreensível a ansiedade de Paes. Estrangulada por falta de ofertas, a rede hoteleira carioca tornou-se o maior desafio à realização do encontro ambiental Rio+20, em junho. É também motivo de preocupação para a Copa do Mundo, em 2014, e para a Olimpíada de 2016. Antes de poder se beneficiar do novo Hotel Nacional, porém, o Brasil precisa saber em detalhes o que, de fato, aconteceu com o antigo.

FONTE: ÉPOCA , 21/5/2012.

STF decide se Cachoeira vai à CPI

O ministro Celso de Mello avalia hoje mais um pedido de Carlinhos Cachoeira para não depor na CPI que investiga as relações do bicheiro com empresários e políticos.

Cachoeira tenta de novo evitar ida à CPI

Advogado do bicheiro diz que ele permanecerá calado se STF exigir seu depoimento, esperado para amanhã

André de Souza, Jailton de Carvalho e Gabriela Valente

BRASÍLIA. Com agenda cheia, o Congresso começa a semana sem saber se haverá o ato mais esperado de amanhã. O depoimento do bicheiro Carlinhos Cachoeira na CPMI, que investiga suas relações com políticos e empresários, pode ser adiado mais uma vez. O ministro Celso de Mello, do Supremo Tribunal Federal (STF), deve decidir hoje se mantém ou não a decisão que desobriga o bicheiro de falar à CPMI. Se o ministro mudar de ideia e determinar que Cachoeira compareça à comissão, o advogado do bicheiro (o ex-ministro da Justiça Márcio Thomaz Bastos) já avisou ontem que ele permanecerá calado.

Bastos quer mais três semanas de prazo, liberação das 90 mil horas de áudio, montagem de equipe de dez pessoas para analisar o material e acesso com mais liberdade a Cachoeira para avaliarem juntos os documentos. Integrantes da comissão, no entanto, dizem não haver motivo para o adiamento e reclamam do comportamento da defesa.

Membros da CPI dizem que defesa teve acesso às provas

Se a liminar for mantida, Bastos pedirá a cópia dos inquéritos. O ex-ministro disse que Cachoeira não tem condições de falar à CPMI sem conhecer as acusações contra ele. Integrantes da equipe de Bastos foram à CPMI, consultaram alguns dados, mas não puderam tirar cópias. Segundo o presidente da comissão, Vital do Rego (PMDB-PB), o material não pode ser reproduzido pois integra um inquérito que tramita em sigilo no STF.

Por outro lado, integrantes da CPMI reclamam que os advogados não estão aproveitando a oportunidade de ter acesso às provas em poder da comissão.

- A defesa não está se valendo desse direito (de ter acesso aos documentos). Ela está passando pouco tempo na sala da CPI. Me parece uma chicana para adiar o depoimento - disse o senador Pedro Taques (PDT-MT).

- A defesa teve todo o acesso às provas e usa esse discurso para evitar o depoimento. O Supremo não deveria acolher essa estratégia - afirmou o deputado Paulo Teixeira (PT-SP).

Na oposição, as reclamações são parecidas. Para o senador Randolfe Rodrigues (PSOL-AP), a CPMI vive um momento decisivo na expectativa de ouvir Cachoeira. Ele espera que o STF não conceda mais tempo à defesa do contraventor, ou o país estará "à beira de uma crise institucional entre Judiciário e Legislativo".

Além do depoimento de Cachoeira, o Congresso terá uma terça-feira cheia. Estão previstos o depoimento da primeira testemunha de defesa do senador Demóstenes Torres (ex-DEM-GO) no Conselho de Ética, o advogado Ruy Cruvinel, e a votação da PEC do Trabalho Escravo na Câmara dos Deputados.

No Judiciário, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) poderá concluir o pedido do PSD para receber recursos do Fundo Partidário, e o STF terá sessão para debater ritos do mensalão. Na quarta, está previsto o depoimento de Cachoeira como testemunha de defesa de Demóstenes no Conselho de Ética.

FONTE: O GLOBO

PT deve manter Vaccarezza na CPI

Isabel Braga e André de Souza

BRASÍLIA. Mesmo com o flagrante da troca de torpedos com a demonstração de fidelidade ao governador do Rio, Sérgio Cabral, o desconforto de petistas e a cobrança da oposição para sua saída, o deputado Cândido Vaccarezza (PT-SP) deverá ser mantido como integrante da CPI mista do caso Cachoeira. Hoje, senadores e deputados do PT se reúnem para discutir a estratégia de atuação na CPI e o caso Vaccarezza, mas o líder do partido, Jilmar Tatto (SP), responsável pelas indicações da Câmara, disse que ele fica e que o episódio é página virada.

Tatto ligou, no último sábado, para Vaccarezza, a fim de tranquilizá-lo e dizer que ele continuaria na CPI pela legenda. Para o líder do PT, apesar do ato infeliz, Vaccarezza não atrapalhou a estratégia da CPI de desbaratar o crime organizado. Segundo ele, Cabral sequer é citado no diálogo:

- Ele quis prestar serviço para quem não precisava. Se Cabral estivesse envolvido, tinha coisa grave. Mas não tem e ele acabou atrapalhando o coitado do Cabral - disse Tatto, acrescentando:

- Ele fica. Tem que trabalhar mais no coletivo, ouvir mais os outros. Ninguém pode imaginar que é mais sabido que todos.

Cândido Vaccarezza não retornou ontem as ligações.

FONTE: O GLOBO

Susep investiga leilão do Hotel Nacional no Rio

Órgão abriu sindicância para apurar possível irregularidade no negócio

RIO - A Superintendência de Seguros Privados (Susep), órgão do Ministério da Fazenda, abriu sindicância para apurar denúncias sobre possíveis irregularidades no leilão do Hotel Nacional, em 2009.

O hotel faz parte da massa falida da Interunion Capitalização, empresa que comercializava o título de capitalização Papa Tudo.

Após ser remarcado várias vezes, o leilão estabeleceu lance mínimo de R$ 118,5 milhões, sem acordo. Em segundo leilão, pouco mais de um mês depois, a Susep reduziu o valor para R$ 85 milhões.

O hotel acabou arrematado pelo empresário Marcelo Limírio Gonçalves, apontado pela Polícia Federal como sócio de Carlinhos Cachoeira.

Além de Limírio, o órgão pretende investigar todo o processo de condução da massa falida, incluindo procedimentos adotados, advogados envolvidos no leilão e José Emílio Quintas, responsável pela liquidação.

Segundo a revista "Época", a Polícia Federal também investiga o processo.

O relatório final com as conclusões do trabalho deve ser apresentado em 60 dias. Caso a apuração não seja concluída, o presidente da sindicância pode prorrogar o trabalho por mais dois meses.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Tesoureiro do PT terá que pagar dívida da Bancoop

Ex-dirigente da cooperativa, João Vaccari Neto não foi encontrado pela Justiça de SP

Fernando Mello

BRASÍLIA - Um dia após ser reconduzido a diretor da usina de Itaipu, o tesoureiro do PT, João Vaccari Neto, foi citado pela Justiça como responsável por uma dívida de R$ 128 mil.

A dívida é resultado de processo movido por um ex-cooperado da Bancoop (Cooperativa Habitacional dos Bancários de São Paulo), que afirma ter pago por um imóvel que não foi entregue pela entidade. Além do petista, outras duas pessoas respondem pelo valor a ser devolvido.

Na sexta, o Diário de Justiça paulista informou que Vaccari não foi localizado pelo oficial de Justiça. Um dia antes, o Diário Oficial da União havia publicado sua recondução ao cargo em Itaipu.

De acordo com a Justiça, a cooperativa, mesmo devedora, "encerrou irregularmente as suas atividades e não deixou bens suficientes" para honrar suas dívidas.

Por esse motivo, o juiz da 1ª Vara Cível de São Paulo determinou que Vaccari e outros dois ex-dirigentes respondam pessoalmente.

No âmbito criminal, o tesoureiro é acusado pelo Ministério Público de desviar recursos da entidade. A Folha deixou recado ontem para o advogado do tesoureiro, mas não obteve retorno.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Costa vence, não leva e PT do Recife expõe racha

Em prévia com disputa judicial, confrontos de militantes e acusação de fraude, João da Costa teve 7.503 votos contra 6.950 de Maurício Rands, mas direção nacional não homologou nome que vai disputar a prefeitura.

Costa vence, mas PT investigará prévia

Disputa interna. Primária petista teve a vitória apertada de Costa sobre Rands (51,9% a 48,1%), mas suspeita de fraude no processo leva direção nacional a não homologar resultado

Gilvan Oliveira

A disputa interna para a escolha do candidato do PT à Prefeitura do Recife não se encerrou com o resultado da prévia de ontem, quando os filiados foram convocados para escolher entre o prefeito João da Costa e o deputado federal Maurício Rands. Segundo dados extraoficiais, Costa bateu Rands por 7.503 votos (51,9%) contra 6.950 (48,1%), uma diferença de 553 votos – apesar da autorização judicial, dados oficiais não foram divulgados. Mas a votação de nada pode valer por conta de denúncias de fraude no processo. A palavra final caberá à direção nacional petista, numa reunião marcada para o próximo dia 31.

Tão logo encerrou-se a apuração, representantes da direção nacional do partido já anunciavam que o processo estava sob suspeita por suposta manipulação na lista de votantes, o que pode levar até a anulação da primária. Nem todos os filiados estariam aptos a votar, mas todos votaram sem distinção, numa manobra que envolveu três decisões judiciais (confira na arte). No foco dessa suspeita da nacional estaria o grupo de João da Costa, vencedor da disputa.

Uma equipe de auditores da direção nacional desembarcará no Recife esta semana para analisar a lista de votantes, sem prazo para encerrar seus trabalhos. O objetivo é comparar a relação da nacional com a dos que compareceram às urnas e verificar quantos estavam aptos de fato a participar. A Secretaria Nacional de Organização da sigla havia homologado a participação de 20.131 dos cerca de 33 mil filiados, por terem quitado individualmente suas anuidades com o partido dentro do prazo estabelecido, 5 de maio. Os 13 mil restantes deveriam ter seus votos tomados em separado, para posterior verificação da quitação.

Mas os presidentes de sete das 13 zonais do PT no Recife conseguiram uma decisão liminar, no último sábado (19), estendendo a todos os 33 mil filiados a condição de votantes e de não terem seus votos tomados em separado. Alegaram que o processo de quitação coletiva, encerrado no último dia 10, havia sido completado e que não havia estrutura para a execução de duas votações.

Apesar de procurar uma postura neutra, o secretário-geral do PT e enviado da direção nacional, Elói Pietá, foi enfático ao afirmar que militantes levaram “o Judiciário ao erro” ao prestarem informações “inverídicas” quanto à quitação coletiva de 13 mil filiados. Esse pagamento, asseverou ele, não aconteceu. E quem levou esses dados ao Judiciário deve responder a um processo disciplinar no partido.

“A direção municipal não conduziu o processo como manda a nacional. Tudo isso fugiu às regras e aos costumes da democracia interna do PT”, afirmou Pietá. “É a primeira vez que há uma judicialização de processo interno do partido”, completou.

Com essa declaração, os processos disciplinares atingiriam os presidentes de zonais José Rogério Barboza, Cléiçon Pessoa, Igor Correia dos Prazeres, Rosângela Matos Miranda, Bruno Feliciano Guedes, Pedro Araújo Santos Filho e Felipe Curi da Silva.

FONTE: JORNAL DO COMMERCIO (PE)

Mutirão cobra do STF julgamento do mensalão

Manifestações ocorreram ontem em várias cidades brasileiras para recolher assinaturas pelo início da análise do processo no Supremo

O mutirão para recolher assinaturas pelo julgamento do mensalão no Supremo Tribunal Federal (STF) mobilizou manifestantes em várias cidades brasileiras ontem. Segundo um dos fundadores do Movimento 31 de Julho, o engenheiro e empresário Marcelo Medeiros, cerca de 15 mil assinaturas foram coletadas em pelo menos nove cidades do País, sendo sete capitais.

No Rio, o 31 de Julho se reuniu em frente ao Posto 9, na Praia de Ipanema, e, de acordo com Medeiros, foram recolhidas no local cerca de 1.200 assinaturas. "Gostaria que fossem 1 milhão. Teria um peso maior. Mas não desapontou. A repercussão mostra que foi um ato de cidadania muito forte." Até a tarde de ontem, 19.323 pessoas tinham aderido à petição colocada na internet.

O grupo criticou o ex-ministro petista José Dirceu e cobrou do governador Sérgio Cabral (PMDB) explicações sobre "quem pagou a farra parisiense", em referência à viagem de Cabral à capital francesa e sobre o que chamaram de "irmandade" do governador com o empresário Fernando Cavendish - dono da Delta, suspeita de envolvimento com o contraventor Carlinhos Cachoeira.

Em São Paulo, a coleta, encabeçada pelo movimento Revoltados ON LINE, mobilizou cinco ativistas em busca de assinaturas na Avenida Paulista. Os organizadores pretendiam colher as firmas no vão livre do Museu de Arte de São Paulo (Masp), mas decidiram percorrer a avenida porque no local funcionava uma feira de antiguidades.

Segundo Marcello Rios, integrante do movimento, das 9h30 às 11h30, tempo que durou a coleta, 1.373 pessoas firmaram o documento que pede celeridade no julgamento do mensalão. Os organizadores esperavam colher 500 assinaturas. "A mobilização superou as expectativas. Não teve nenhuma pessoa que recusou. Falou de julgar o mensalão, todo mundo quer assinar o papel", contou Rios.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

CPI reacende embate entre PF e MPF

Crise tem como pano de fundo a tramitação da PEC 37, que tira poderes dos procuradores e dá às polícias exclusividade para investigar

Vannildo Mendes

BRASÍLIA - A CPI do Cachoeira reacendeu uma batalha travada há anos nos bastidores entre procuradores e policiais no País. O motivo é a tramitação, em passo acelerado, da PEC 37, proposta de emenda constitucional que tira poderes do Ministério Público e dá exclusividade de investigações às Polícias Federal e Civil. Hoje, o MP pode conduzir investigações e não aceita em nenhuma hipótese perder o controle hierárquico dos inquéritos.

Os dois lados radicalizaram nos ataques e o conflito já ameaça o resultado das investigações. A crise atingiu grau elevado nos últimos dias com declarações dos delegados das operações Vegas e Monte Carlo, que acusaram o procurador-geral da República, Roberto Gurgel, e sua mulher, Cláudia Sampaio, de "segurarem", em 2009, o primeiro inquérito com provas que ligavam o senador Demóstenes Torres (sem partido-GO) à quadrilha do contraventor Carlinhos Cachoeira.

"O MP fica com esse discurso totalitário, imperial, mas o fato é que mal realiza suas tarefas e não tem preparo técnico-científico para comandar investigações nem treinamento para enfrentar bandidos na rua", disse o delegado Marcos Leôncio Ribeiro, presidente da Associação Nacional dos Delegados Federais. "O monopólio da investigação pela polícia afronta o estado de direito", rebateu o procurador Alexandre Camanho de Assis, presidente da Associação Nacional dos Procuradores da República.

Camanho acha que a PEC cria insegurança jurídica, prejudica o combate ao crime organizado no País e facilita a impunidade. "É público e notório que a polícia é a principal acusada por violações aos direitos fundamentais de investigados no País, como retratam relatórios das Nações Unidas sobre direitos humanos, especialmente nos tópicos "tortura" e "execuções extrajudiciais"", disse ele, em nota enviada à comissão que analisa a PEC.

Luz amarela. O confronto acendeu a luz amarela no Ministério da Justiça, que chegou a articular uma reunião emergencial entre o chefe do MP e o diretor-geral da Polícia Federal, Leandro Daiello Coimbra, para restabelecer a harmonia entre as duas instituições. Mas os dois lados entenderam que, sem uma manifestação do Congresso e do Supremo Tribunal Federal (STF), o gesto seria inútil e poderia até produzir efeito contrário, uma vez que as posições nas duas corporações são inconciliáveis.

Gurgel é adepto da tese segundo a qual "quem pode o mais, pode o menos". Portanto, se o MP é titular da ação penal e responsável pelo controle externo da PF, para ele cabe sim ao órgão comandar investigações diretamente. Daiello discorda, mas acha que a questão será solucionada nos foros adequados: o Congresso, que analisa a PEC 37, e no STF, onde tramita uma ação de inconstitucionalidade, movida pela Associação Nacional dos Delegados de Polícia (Adepol), contra o poder do MP de dirigir inquéritos criminais.

A PEC 37 tem apoio da Ordem dos Advogados do Brasil e conta a seu favor parecer da Advocacia-Geral da União, que reflete a posição institucional do governo sobre o tema. "Revela-se fora de dúvida que o ordenamento constitucional não reservou o poder investigatório criminal ao MP, razão pela qual as normas que disciplinam tal atividade devem ser declaradas inconstitucionais", diz o parecer da AGU, assinado em 2007 pelo então advogado-geral José Antônio Dias Toffoli.

Constituição de 1988 deu poder de investigação ao MP

O duelo entre procuradores e policiais começou com a Constituição de 1988, que permitiu que, além das Polícias Federal e Civil, o Ministério Público também realize investigações diretamente. Desde então as rusgas entre delegados e procuradores têm se acentuado a um ponto perigoso, com interferência danosa no resultado de inquéritos. A PF comanda, em média, 70 mil inquéritos criminais por ano. O MP realiza cerca de 20% desse montante em todo o País - a quase totalidade refere-se a ações civis públicas por improbidade administrativa. Na área criminal, o MP realiza menos de 1% do total conduzido pelas polícias. No Congresso, a bancada policial também leva a melhor, somando cerca de 80 membros. Isso é mais que o dobro dos 30 parlamentares egressos do Ministério Público. Em 2007, o MP adquiriu até uma máquina de grampo telefônico, o Guardião, sistema de monitoramento que revolucionou os inquéritos da PF há dez anos.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Crise põe em dúvida futuro político de Cabral

PMDB reconhece que governador sofreu desgaste com caso Cachoeira e avalia que sua capacidade de eleger o sucessor depende da eleição municipal

Wilson Tosta

RIO - A dificuldade do governador do Rio, Sérgio Cabral (PMDB), em reagir ao caso Carlinhos Cachoeira com algo além de notas oficiais, respostas curtas ou simplesmente o silêncio gera dúvidas sobre o futuro político do governador. Políticos se questionam sobre a capacidade de Cabral influir nas eleições de outubro e mesmo de fazer de seu vice, Luiz Fernando Pezão, seu sucessor em 2014.

Há cerca de 10 dias, em sua primeira declaração após a divulgação de imagens de suas viagens aos exterior com o empresário Fernando Cavendish, dono da Delta - acusada de ligações com o contraventor Carlinhos Cachoeira -, Cabral respondera a poucas perguntas de forma vaga e saíra com rapidez. Até então, se manifestara por escrito.

Dirigentes do PMDB ouvidos pelo Estado reconhecem que Cabral sofreu desgaste pessoal com o episódio. Segundo os peemedebistas, o caso gerou, apenas na capital, uma perda de avaliação positiva entre 300 mil a 400 mil eleitores. O estrago, porém, teria sido maior na classe média da capital. "Na classe média mais informada, certamente teve um impacto, hoje somos um País de classe média", avalia o cientista político Geraldo Tadeu Monteiro, presidente do Instituto Brasileiro de Pesquisa Social.

Até o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, um aliado e amigo a quem Cabral deve o pacote de obras de seus governos, parece convencido do enfraquecimento político do governador - e o demonstrou em conversa recente com o prefeito Eduardo Paes (PMDB).

Segundo testemunhas, na entrega de títulos de doutor honoris causa ao ex-presidente, Paes e Lula conversavam quando o senador Lindbergh Farias (PT), potencial candidato ao governo do Rio, passou pelos dois. "Vai dar trabalho em 2014", disse Paes, apontando para o senador. Lula concordou e acrescentou: "É, mas o Pezão está superado".

O PMDB, contudo, aposta na boa avaliação de Paes na capital (estável em cerca de 50%) e na proximidade de inaugurações de obras para tentar obter um bom resultado na eleição de outubro. Já a capacidade de Cabral de eleger seu sucessor, avaliam os peemedebistas, dependerá muito mais desse resultado que da repercussão do caso Cachoeira.

Decepção. O governador foi arrastado para o escândalo por sua amizade com Cavendish. Até agora, não apareceu nenhuma evidência de um possível envolvimento seu com Cachoeira, mas a empresa do amigo empresário somou contratos de R$ 1,49 bilhão em obras com o Estado.

Pessoas próximas ao governador dizem que ele se mostra decepcionado com Cavendish. Essas pessoas descrevem um Cabral acabrunhado e contrariado com ataques que considera pessoais. É o caso das críticas do deputado Anthony Garotinho (PR-RJ), em seu blog, onde as imagens de Cabral com Cavendish foram divulgadas primeiro.

Na semana passada, a CPI do Cachoeira evitou convocar Cabral e outros governadores para depor. Mas uma mensagem enviada pelo deputado Cândido Vaccarezza (PT-SP) para Cabral, garantindo que ele não seria chamado, revelada pelo SBT, gerou mais exposição e desgaste. "A relação com o PMDB vai azedar na CPI. Mas não se preocupe você é nosso e nós somos teu (sic)", escreveu o parlamentar, no torpedo enviado pelo celular e que foi parar na mídia.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Governador tem carreira apoiada em seus padrinhos

Do pai ao ex-presidente Lula, Cabral contou com diversos políticos que ajudaram sua ascensão aos cargos públicos

Wilson Tosta

Uma característica da carreira política do governador Sérgio Cabral Filho (PMDB) é sua dependência de padrinhos. Do pai, o jornalista e crítico de música popular Sérgio Cabral, ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o peemedebista teve uma galeria de políticos que, em diferentes momentos de sua vida, alavancaram sua ascensão aos cargos públicos e às vezes ajudaram no seu exercício.

Quando esse apoio falhou, Cabral Filho não demonstrou capacidade de reagir sozinho. Foi o que ocorreu, por exemplo, em 1996, quando os problemas de popularidade do governador Marcello Alencar (PSDB) contaminaram sua candidatura a prefeito do Rio e, na prática, levaram à sua derrota.

Em 1987, com ajuda do pai, Cabral assumiu seu primeiro cargo público: diretor de Operações da TurisRio, no governo Moreira Franco. Três anos depois, ainda sob influência do pai, elegeu-se deputado estadual, com votação modesta: 12 mil votos.

O primeiro mandato tímido, centrado no Clube da Maior Idade e nos Albergues da Juventude, não foi empecilho para que, quatro anos depois, recebesse 168 mil votos, pelo PSDB de Alencar. A votação forte e o apoio do governador lhe deram a Presidência da Assembleia Legislativa (Alerj), em 1995, posto que ocupou até 2002.

Em 1998, depois da conquista do governo por Anthony Garotinho (então no PDT), Cabral aliou-se ao novo governador. Descartou o tucano, que propunha privatizar a Cedae, a companhia de saneamento fluminense. Sob seu comando, a Alerj derrubou o projeto. Alencar retaliou, acusando-o de adquirir, ilicitamente, uma casa de luxo em Mangaratiba. Cabral disse que obtivera o dinheiro para a compra por prestar serviços de comunicação a uma consultoria.

Em 2002, já no PMDB, foi eleito senador com apoio de Garotinho. Em 2006, Cabral concorreu ao governo estadual. No segundo turno, aliou-se a Lula, que tentava a reeleição. O resultado mais importante do encontro não foi eleitoral (os dois venceram), mas político: com o apadrinhamento de Lula, o Estado do Rio recebeu um vistoso pacote de investimentos e obras federais, que em 2010 ajudaram na reeleição de Cabral com dois terços (66%) dos votos válidos, no primeiro turno.

Apoio à reeleição de Lula deu início à aliança com PT

O tom cúmplice da mensagem de Cândido Vaccarezza a Sérgio Cabral remete à relação próxima de petistas com o governador do Rio estabelecidas no fim de 2006. Na ocasião, o apoio de Cabral à reeleição de Lula abriu caminho para uma aliança inédita no Rio, que transformou a seção fluminense do PT em cliente do PMDB local sob tutela da direção nacional do petismo e do Planalto. Do ponto de vista prático, foi bom negócio para os dois lados. Cabral recebeu verbas em quantidade inédita e ganhou a amizade de Lula. E os petistas fluminenses obtiveram cargos essenciais para manter empregados ativistas que, desde o governo de Anthony Garotinho (1999-2002), o fazem carregar o apelido jocoso de "partido da boquinha", por sua fome por empregos públicos.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Delta gere contratos de lixo em 12 cidades e no DF

Raphael Di Cunto

SÃO PAULO - No fim de 2004, decreto do prefeito de Duque de Caxias, José Camilo Zito (PP), rescindiu contrato com a Locanty para coleta de lixo e limpeza urbana da cidade. Ao assumir, seu sucessor, Washington Reis (PMDB), assinou contrato emergencial com uma empresa que havia lhe doado R$ 12 mil para a campanha e que não tinha nenhuma experiência prévia nesse tipo de serviço: a Delta Construções.

Sete anos depois, a Delta virou uma das maiores do setor. Este ano, os contratos em que a empresa gere ou participa movimentariam R$ 700 milhões, segundo levantamento do Valor com o mercado e as prefeituras. No ano passado, quando parte dos serviços ainda não estava em execução, a Delta teve faturamento total de R$ 2,7 bilhões, de acordo com o balanço da companhia.

A empresa, que é investigada por uma Comissão Parlamentar Mista de Inquérito no Congresso pelas relações com o bicheiro Carlinhos Cachoeira e corre risco de perder os contratos, hoje executa limpeza urbana ou coleta de lixo em São Paulo, Rio, Campinas, Distrito Federal, Cuiabá, Palmas, Porto Alegre, Piracicaba, Anápolis (GO), Itanhaém (SP), Nova Iguaçu (RJ) e Catalão (GO) e administra o aterro de Goiânia.

A qualidade dos serviços, alvo de reclamações na maioria das cidades em que a Delta passou, não impediu a empresa de crescer no setor, conhecido pela difícil fiscalização e por irrigar campanhas políticas. "Em pouco tempo, a Delta se tornou um dos principais players, à frente de empresas tradicionais", afirma fonte que trabalhou com serviços urbanos em várias prefeituras.

Depois de Duque de Caxias - cidade que abandonou no começo de 2012, ao ser contratada emergencialmente pela vizinha Nova Iguaçu -, venceu licitação para coleta de lixo em Palmas por R$ 14 milhões. Mais do que o dinheiro, o contrato rendeu à empresa certificado, considerado falso pela Polícia Federal, que a habilitava a disputar contratos em grandes cidades (leia ao lado).

No fim de 2006, venceu o primeiro grande contrato, como integrante do Consórcio Tecam, em Campinas (SP), e no ano seguinte ganhou outro de R$ 23 milhões, sem licitação, no governo do Distrito Federal, na época controlado pelo ex-DEM José Roberto Arruda, que renunciou ao mandato para não ser cassado.

Em São Paulo, a companhia ficou em terceiro na disputa pela varrição, mas venceu ao barrar judicialmente a primeira colocada e a segunda desistir - a empresa queria a correção do valor pela inflação, mas a prefeitura se disse legalmente impedida de aumentar o valor da proposta.

Ganhou a Delta, que recebeu do prefeito Gilberto Kassab (PSD) R$ 147,8 milhões, segundo levantamento do PT na Câmara Municipal.

O grande salto, porém, ocorreu em 2011, quando o Consórcio Soma, liderado pela Delta e formado pela Cavo e Corpus, venceu a licitação para a limpeza urbana de toda a região sudeste da cidade de São Paulo, num megacontrato que unificou limpeza das bocas de lobo e ecopontos, varrição de vias públicas e manutenção das lixeiras, eliminando pequenas e médias empresas.

A concorrência é questionada na Justiça por uma das excluídas, a TCM Transporte e Coleta de Resíduos. A companhia alega cerceamento da concorrência e diz que o Soma não comprovou capacidade técnica.

"Há atestados falsos de programas de educação ambiental que a Delta diz ter executado em Itanhaém e Poá, mas que não constam dos contratos nem ordens de pagamento das prefeituras", afirma Helen Alves, advogada da TCM, que pede a rescisão do contrato de R$ 1,04 bilhão. O Ministério Público investiga.

A Prefeitura de São Paulo disse, em nota, que colabora com a apuração e nega favorecimento. "A documentação entregue por todas as concorrentes era legível e estava autenticada", afirma. As prefeituras de Poá e Itanhaém não responderam.

A J&F Holding, que assumiu o controle da Delta, informou que faz auditoria e não comentará os contratos da gestão anterior. A nova controladora, porém, indica que deve manter a expansão no setor, ao escolher como presidente Humberto Junqueira Farias, que comandou a Cavo, tradicional no ramo do lixo, de 2000 a 2006.

FONTE: VALOR ECONÔMICO

PT e PMDB transpõem conflitos da base governista para a CPI

Caio Junqueira

BRASÍLIA - Os principais problemas da relação entre o Palácio do Planalto e sua ampla base aliada foram transpostos para os trabalhos da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) que investiga o empresário Carlos Augusto Ramos, o Carlinhos Cachoeira. PT e PMDB estão em constantes divergências sobre temas da comissão, os partidos médios têm demonstrando posições independentes das do governo, e a barganha política entrou em algumas transações.

A diferença é que nos plenários da Câmara e do Senado as emendas parlamentares, os cargos no Executivo e os apoios políticos nas eleições municipais deste ano permeiam as negociações para votar os projetos de interesse do governo. Já na CPI esses componentes passam pelas conversas sobre qual encaminhamento deve ser dado aos requerimentos de convocação de pessoas a depor e quebras de sigilo bancário, fiscal e telefônico dos suspeitos apontados pela Polícia Federal na Operação Monte Carlo.

O relato foi feito por um parlamentar petista com grande interlocução no Planalto. Sem mencionar nomes, ele disse que requerimentos de convocação do jornalista da "Veja" Policarpo Júnior e do procurador -geral da República, Roberto Gurgel, foram objeto desse tipo de proposta. "Ou o PT apoiaria o partido do interlocutor nas eleições, ou não haveria apoio a essas demandas petistas", afirmou, sob reserva, ao Valor.

Mas é na relação entre os dois principais partidos da base que a semelhança -e desavença- é maior. Os petistas reclamam da "falta de solidariedade" dos pemedebistas em suas reivindicações na CPI. Algo que, segundo eles, ocorreu na reunião administrativa da CPI ocorrida na quinta-feira.

Primeiro, o PT tentou aprovar um pedido para que a Polícia Federal remetesse à comissão as interceptações em que Policarpo é citado. A maioria dos parlamentares -PMDB à frente- se opôs. Na sequência, o senador Ricardo Ferraço (PMDB-ES) se manifestou contra o requerimento que limitava a investigação da construtora Delta à região Centro-Oeste. Em sessões anteriores, o PMDB também se negou a apoiar a convocação de Gurgel -outro anseio petista. Na visão do PT, o partido do vice-presidente Michel Temer corre o risco de ficar isolado na comissão e ter problemas quando um dos seus correligionários estiver no foco das atenções.

Foi nesse contexto que o deputado Cândido Vaccarezza (PT-SP) foi flagrado passando mensagem pelo celular ao governador do Rio, Sérgio Cabral (PMDB), dizendo: "A relação com o PMDB vai azedar na CPI, mas não se preocupe, você é "nosso" e nós somos "teu"". A mensagem, contudo, soou como prova de que há um acordo em curso entre PT, PSDB e PMDB para blindar os governadores de seus partidos. Respectivamente, Agnelo Queiroz (DF), Marconi Perillo (GO) e Cabral, todos ligados aos investigados na Operação Monte Carlo..

O PMDB reconhece a divergência com o PT na CPI e avalia que ela decorre do fato de a agenda do governo no Congresso não ser a mesma que os petistas estão tentando impor na CPI, para a qual têm sido acompanhados pelo senador Fernando Collor (PTB). "Temos compromisso de governo com o PT. Mas a agenda que está em debate na CPI não é de governo, é ideológica. E não somos obrigados a defender essa agenda", disse o vice-líder do PMDB na Câmara, Eduardo Cunha (RJ).

O líder do partido na Casa, Henrique Alves (RN), disse que a orientação que deu aos dois deputados de sua bancada indicados à CPI - Íris de Araújo (GO) e Luiz Pitiman (DF) - era de que os trabalhos não deveriam visar "vingança pessoal". "Não vamos cercear a imprensa. Qual a prova de ilícito grave que comprometa esse jornalista? Nenhuma. Esse foco não é o do PMDB", declarou.

Outros integrantes da bancada aumentam o tom contra os petistas. Relatam um desânimo geral na base com o tratamento privilegiado que o Planalto dá aos petistas na concessão de cargos e emendas parlamentares, o que fará com que nas eleições deste ano o PT dispare no número de prefeituras conquistadas. Reclamação, aliás, existente desde a entrada oficial do PMDB na base aliada, ainda no governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. "A manutenção dessa situação faz com que não nos empenhemos em ficar colocando a cara para os interesses do PT na CPI. Não vamos ser massa de manobra do PT. As bases deles estão sendo atendidas e as nossas agredidas", disse um pemedebista.

O PT identificou esse movimento e trabalha para revertê-lo. "O que falta na CPI é a formação de uma maioria. Falta um núcleo majoritário que combine as intervenções conjuntas e as leve adiante", afirmou o líder do PT na Câmara, Jilmar Tatto (SP). Segundo ele, a construção dessa convergência tem sido diária e deverá, em breve, surtir os efeitos desejados.

FONTE: VALOR ECONÔMICO

Volume de investimento do governo cai em 2012

Com economia fraca, União gasta 5,5% a menos; cresce temor de queda do PIB

Num cenário de economia desaquecida, o governo federal não consegue destravar o ritmo dos investimentos, que tiveram queda de 5,5% nos primeiros quatro meses de 2012 em relação ao mesmo período do ano anterior, relatam Dimmi Amora e Natuza Nery.

No governo, as previsões para o ano são pessimistas. O temor é que a redução dos juros e o estímulo ao crédito não sejam suficientes para puxar o crescimento.

Investimento do governo federal tem queda em 2012

Com economia desaquecida, gasto nos primeiros quatro meses do ano cai 5,5%

Investimento no PAC cai 24% em relação a 2011; assessores de Dilma já falam em
PIB abaixo de 3%

Dimmi Amora, Natuza Nery

BRASÍLIA - Em um cenário de desaceleração econômica, o governo federal reduziu o ritmo dos seus investimentos e trava, por falta de decisão, obras que podem ser realizadas pelo setor privado.

O primeiro quadrimestre registrou queda de 5,5% nos gastos com novas obras públicas, compras de equipamentos e bens permanentes em relação ao mesmo período do ano passado, que já havia sido considerado fraco. O valor caiu de R$ 11,1 bilhões em 2011 para R$ 10,5 bilhões.

No governo, as previsões são pessimistas. Interlocutores da presidente Dilma Rousseff temem que as reduções de juros e as medidas para alavancar o crédito não deem conta, sozinhas, de impulsionar o crescimento.

Reservadamente, já se fala em um PIB abaixo dos 3% em 2012 -semelhante ao projetado pelos Estados Unidos, um dos países mais atingidos pela crise internacional.

A depender dos números até dezembro, Dilma chegará ao terceiro ano de mandato com taxa de crescimento semelhante à média do governo Fernando Henrique Cardoso (1995-2002), de 2,3%.

A performance do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) também segue aquém do desejado. Os investimentos caíram 24% no quadrimestre -R$ 5,5 bilhões contra R$ 4,2 bilhões em 2011.

Os principais responsáveis pela redução nos gastos federais são órgãos ligados ao Ministério dos Transportes, onde a queda nos pagamentos de obras chegou a 55%.

A queda sofre efeitos da "faxina" na pasta. Os dois órgãos que mais gastam em obras, Dnit (Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes) e Valec (estatal de ferrovias), mudaram os ritos de contratação após o escândalo que derrubou o ex-ministro Alfredo Nascimento.

O ministério reforçou os mecanismos de controle, mas não fez nenhuma licitação importante desde a posse dos novos gestores.

Outro fator para a redução dos investimentos é o fato de o Executivo ter reforçado a contenção dos gastos públicos para atingir as metas de superavit primário.

Mobilidade

O financiamento de obras de infraestrutura de mobilidade urbana também vai mal. Em 2010, a previsão para este ano era ter R$ 43 bilhões em investimentos em transportes, sendo R$ 28 bilhões financiados pelo governo.

No entanto, devido a atrasos de governos estaduais, municipais e do próprio governo federal, apenas R$ 400 milhões foram desembolsados até o mês passado pelos bancos financiadores.

O ritmo das obras também sofre efeito do atraso nos anúncios de marcos regulatórios e decisões prometidos pelo atual governo em praticamente todos os setores da infraestrutura concedidos à iniciativa privada.

Por isso, decisões de novos investimentos por concessionários do setor elétrico, portos, estradas, ferrovias e aeroportos estão engavetadas.

Em alguns casos, a falta de decisão já afeta o financiamento das empresas, que enfrentam dificuldades para conseguir empréstimos necessários a seus projetos.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Dialética da originalidade:: José de Souza Martins

Fernando Henrique, ganhador do Prêmio Kluge, abordou criativamente nossa diversidade histórica

O Prêmio John W. Kluge, de 2012, concedido pela Biblioteca do Congresso, de Washington, ao sociólogo Fernando Henrique Cardoso, é-lhe outorgado "por uma vida de realizações no campo dos estudos humanísticos e das ciências sociais que não são abrangidos pelo Prêmio Nobel". Foi intenção do falecido magnata da comunicação, que dá nome ao prêmio e o criou, equiparar essa premiação à concedida pela Academia Sueca, fixando-o no montante equivalente, que é de US$ 1 milhão. Fernando Henrique Cardoso é o primeiro sociólogo e o primeiro brasileiro a recebê-lo. Anteriormente, foram premiados quatro historiadores, dois filósofos e um teólogo, sendo dois americanos, um francês, um irlandês, um polonês, um chinês e uma indiana.

O comitê do Prêmio Kluge ressaltou na obra de Cardoso o equilíbrio da profundidade da análise em relação com a evidência empírica. Ele é o primeiro ganhador do prêmio cuja obra científica é marcada pela interdisciplinaridade, abrangendo a sociologia, a ciência política e a economia, de que resulta uma análise sociológica original e profunda. No anúncio da premiação, o diretor da Biblioteca do Congresso ressaltou: "Sua aspiração fundamental é a busca da verdade sobre a sociedade do melhor modo que possa ser determinada, ao mesmo tempo que permanece aberto à revisão de conclusões na medida em que novas evidências se acumulam em decorrência de novas pesquisas ou de mudanças na realidade política e econômica".

Como ocorre com o Prêmio Nobel, a premiação de Cardoso é reconhecimento da qualidade da produção científica no Brasil na área das ciências sociais. Sua obra é o coroamento da linha de trabalho científico da chamada "escola sociológica paulista", que resultou da contribuição de cientistas como Claude Lévi-Strauss, Roger Bastide, Florestan Fernandes, Antônio Candido, Gioconda Mussolini, entre outros, da maioria dos quais Cardoso foi aluno e com os quais trabalhou.

Na obra de Fernando Henrique Cardoso, a interdisciplinaridade permitiu-lhe tratar de maneira criativa a diversidade histórica da sociedade brasileira e seu desenvolvimento desigual. Sua tese de doutorado sobre Capitalismo e Escravidão no Brasil Meridional é um marco na adoção do método dialético em estudos sociológicos. Ele conseguiu estabelecer, com originalidade, a relação entre capitalismo e escravidão, apesar do desencontro histórico que os opõe, e articular um caminho para a compreensão sociológica das determinações profundas de nosso crônico atraso social, político e econômico.

Por essa época, um dos temas dos cientistas sociais brasileiros era o do nosso atraso, o que chamavam de resistências à mudança. O grupo de Florestan Fernandes, na USP, do qual Cardoso fazia parte, dedicou-se aos diferentes agentes dessa resistência - operariado, jovens, Estado, empresariado. Coube a Cardoso realizar a pesquisa sobre os empresários e conhecer como eles próprios compreendiam mal seu papel histórico no desenvolvimento brasileiro. Ele termina seu livro sobre Empresário Industrial e Desenvolvimento Econômico com uma indagação que expõe o problemático impasse do Brasil de então e é o elo com seus estudos posteriores sobre a dependência: subcapitalismo ou socialismo?

Obrigado ao exílio no Chile pelo golpe de Estado de 1964, compreendeu que a nova realidade política e econômica, que se tornava a de toda a América Latina, pedia reinterpretação sobre as leis e tendências na cambiante situação histórica. Com Enzo Faletto, desenvolve uma das interpretações teóricas da chamada dependência. No seu entender, a dependência não fechava o caminho ao desenvolvimento econômico num cenário de consolidação do mercado interno e de globalização da economia. Ainda havia na situação de dependência lugar para uma práxis desenvolvimentista e transformadora, para crescimento econômico e desenvolvimento social. Sua versão da teoria, que se tornou referência de pesquisadores em muitos países, é um dos pontos destacados em sua biografia intelectual pelo comitê do Prêmio Kluge.

Uma característica da obra de Cardoso é a do conhecimento sociológico sobre a competência social de cada categoria para no conjunto da sociedade traduzir suas possibilidades históricas em realidade política, na construção da nação moderna e democrática. Ressalta a nota da premiação que o acerto de suas análises se confirmou na política modernizadora que imprimiu ao Estado quando ocupou a Presidência da República e na continuidade política que suas ações tiveram nos governos que o sucederam. Florestan Fernandes, seu professor, dizia que, não sendo a sociologia uma ciência experimental, a verificação do acerto de suas análises se dá na política.

No anúncio da premiação de FHC e na enumeração das razões em que se baseia, o diretor da Biblioteca do Congresso expõe uma biografia intelectual que em boa parte lembra o título de um livro de Max Weber, decisivo na formação de Fernando Henrique Cardoso: Ciência e Política - Duas Vocações, a vocação como chamamento e missão.

José de Souza Martins, sociólogo, professor emérito da USP, é autor de Uma arqueologia da memória social: autobiografia de um moleque de fábrica (Ateliê Editorial)

FONTE: ALIÁS / O ESTADO DE S. PAULO, 20/5/2012.

Mafiosos:: Ricardo Noblat

"O corrupto vai para a cadeia. Mas e o empreiteiro, o corruptor? Nunca se conseguiu." (Senador Pedro Simon, PMDB-RS)

Intrigante! Ou não é? O deputado Cândido Vaccarezza (PT-SP), membro da CPI do Cachoeira, usou o celular para mandar uma mensagem ao governador Sérgio Cabral (PMDB-RJ) onde dizia: "A relação com o PMDB vai azedar na CPI. Mas não se preocupe, você é nosso e nós somos teu (sic)". Ora, com o que mesmo Cabral deveria se preocupar? E por quê? 

Cabral não é personagem relevante nem sequer marginal do objeto que a CPI se oferece para investigar: eventuais práticas criminosas desvendadas pelas operações Vegas e Monte Carlo, da Polícia Federal, com o envolvimento do bicheiro Carlinhos Cachoeira e de agentes públicos ou privados.

Políticos a mancheias, entre eles os governadores de Goiás e do Tocantins e auxiliares do governador do Distrito Federal, são citados nos milhares de telefonemas trocados por Cachoeira com integrantes de sua quadrilha, e grampeados pela Polícia Federal.

E Cabral? Não. Cabral não é citado.

Resta farto material apreendido pela polícia na casa de Cachoeira e de outros, que ainda está sendo periciado antes de ir ou não parar no Supremo Tribunal Federal — e dali na CPI. A respeito de tal material ainda não se pode dizer nada.

Mas naquele de posse da CPI não há uma única referência direta nem indireta ao governador do Rio.

De volta, pois, à intrigante pergunta que suplica por uma resposta: com o que mesmo Cabral não deveria se preocupar se ele "é nosso" (ou seja: do PT de Vacarezza) e se "nós" (o PT de Vaccarezza) é dele? O uso do "nosso" e originalmente do "teu" denuncia uma relação de cumplicidade e de proteção mútua entre o PT e Cabral.

Pode até azedar, como antecipa Vaccarezza, a relação do PT com o PMDB, o partido de Cabral. Mas Cabral não deve se preocupar. A frase construída pelo ex-líder do PT na Câmara é de deixar a máfia siciliana com inveja. Por que ela não a imaginou antes? E por que não a incorporou aos ritos secretos de admissão de novos mafiosos? Provocado a decifrar a mensagem enviada a Cabral, Vaccarezza não o fez. Escapou: "Sou amigo do PMDB.

Nossas relações nunca serão azedadas". A mensagem teria sido escrita "num momento de irritação" de Vaccarezza com o PMDB. Irritação por quê? Vaccarezza não diz. Só garante que ninguém será blindado pela CPI. Você acredita? Bem, anote aí por que Vaccarezza estava irritado com o PMDB quando se correspondeu com Cabral: o partido resistiu a apelos de Lula para forçar a mão e comprometer a VEJA com os crimes de Cachoeira.

Por anos, Cachoeira foi informante da VEJA. Lula acusa a revista de ter deflagrado escândalos que atingiram seu governo.

Anote aí o que de fato preocupa Cabral e o leva a pedir proteção: uma investigação ampla dos negócios da empreiteira Delta do seu compadre e parceiro de luxuosas viagens ao exterior, Fernando Cavendish.

Cabral é padrinho das filhas gêmeas dele. Cavendish anda ameaçando entregar podres de políticos e de partidos que financiou.

O mineiro Marcos Valério, um dos cérebros do mensalão, ameaçou contar o que sabia se fosse depor na CPI dos Correios. Depôs e não contou. Retomou a ameaça ao notar que começara a ficar sem dinheiro. Cabeças estreladas do PT pediram a Lula que o socorresse. Desconheço o que aconteceu, mas Marcos Valério não ficou sem dinheiro.

Cavendish não corre o risco de passar aperto. No ano passado, apesar da receita da Delta ter caído apenas 10%, de R$ 3 bilhões para R$ 2,7 bilhões, o lucro despencou 85,5%, de R$ 220,3 milhões para R$ 32 milhões.

Um dos motivos foi o aumento do pagamento de dividendos a acionistas, que subiu de R$ 13 milhões para R$ 64 milhões.

Esperto Cavendish, não? Junto dele, Cabral é um bobo.

Tudo bem: extraiu vantagens da companhia generosa de Cavendish, o sedutor de nove entre dez políticos à cata de dinheiro para pagar dívidas de campanhas ou se eleger.

Agora, a popularidade de Cabral caiu. Menos do que ele calculou. Seu futuro político tornou-se opaco.

FONTE: O GLOBO

“Pague-se, mas que ladrões!”:: Wilson Figueiredo

“Pague-se, mas que ladrões!”, segundo a tradição oral, exprime o desabafo com que Floriano Peixoto, o primeiro vice-presidente e, logo depois, o segundo presidente da República, liquidou a fatura levada à sua mesa por algum ministro. Merece até ponto de exclamação. Certamente relativa a algum fornecimento ou obra pública, eram os primeiros passos da República no terreno minado. O estilo direto era o próprio presidente e, lamentavelmente, não veio a ser o padrão da República. Passados 123 anos, o mandato parlamentar trocou a característica de representar os cidadãos pela imperdível oportunidade de enriquecimento pessoal. Pesquisa de opinião pública localizou este ano o Congresso Nacional no desconfortável último lugar na confiança dos brasileiros.

Floriano, pelo que se sabe e pelo que se lê, não era de muitas palavras. Mas a mão pesada e a franqueza do temperamento marcaram o começo da era republicana. O que se passa hoje no primeiro nível da vida nacional não honra a cidadania, e o que se ouve à boca pequena, se vê na televisão, o rádio propaga e o noticiário dos jornais não deixa cair, leva a pensar no que está à frente, com razoável previsibilidade: o brasileiro não esconde a sensação de que nunca se roubou tanto, e que roubar se tornou esporte nacional. Há quem fale de cleptomania coletiva.

Passados todos esses 123 anos do golpe de Estado de 15 de novembro, o que mudou mesmo foi a imprudência de experimentar a reeleição. Depois de tudo que ocorreu desde o fim da República Velha, em 1930, o Brasil desfruta do melhor e mais prolongado recomeço, entre motivos crônicos que aguçam contradições políticas e sociais já históricas.

Floriano Peixoto, o primeiro vice a chegar à Presidência da República, tanto quanto o primeiro presidente, não atendeu à exigência da Constituição, que nasceu da Constituinte dois anos depois. Nenhum dos dois, presidente e vice, era ungido pelo voto do cidadão brasileiro. Foi pelo voto indireto. Não houve pecado original, mas as consequências do pecado venial deixaram marcas. Com a renúncia de Deodoro antes da metade do mandato de quatro anos, Floriano não atendeu à exigência constitucional e assumiu a Presidência assim mesmo, para ganhar tempo, baseado no princípio anterior à Constituição, e que só definiu a República em 1891.

O charme do nacionalismo republicano (e a oportunidade), desde logo, ungiu Floriano, e, até hoje, sua resposta ao oferecimento de ajuda militar, quando da revolta da Esquadra, faz o brasileiro sorrir. O embaixador de Tio Sam à época quis saber como o Brasil receberia o desembarque de marinheiros americanos para manter a ordem nas ruas do Rio. Floriano, curto e grosso, foi mais ele: “À bala”. Não importa o fato, a versão também faz história por fora. O repique do antiamericanismo se multiplicou na campanha em defesa do petróleo nos anos 50 e, a partir daí, se esgotou praticamente nos anos 60.

A era do “rouba mas faz” exprimiu bom humor e não foi desautorizada por Ademar de Barros, que continuou a se eleger governador de São Paulo. Desde que realizasse obras, o governante estava desobrigado de dar explicações ao moralismo ranzinza. A realização de obras públicas capazes de encher os olhos consagrou o sofisma de que a margem de roubo faz parte dos custos. Estão por aí as consequências.

O rendimento eleitoral do moralismo teve seu ponto mais alto nas eleições de Jânio Quadros, a prefeito, governador e presidente. Atirou pela janela o mandato presidencial e se defenestrou por erro de cálculo. A volta aos padrões democráticos, depois da última ditadura, pode ter mantido à distância riscos operacionais das liberdades públicas, mas falhou na implantação e na exigência da moralidade administrativa, que pede mais do que discursos de posse.

Numa sociedade sem condições de dar conta das necessidades apenas com os meios de que a democracia dispõe, o espetáculo da impunidade merece atenção diferente de tudo que já se viu, e ainda não acabou. Falta o principal.

FONTE: JORNAL DO BRASIL

Popularidade e eleições :: Renato Janine Ribeiro

Faltam cinco meses para as eleições, e o quadro é o seguinte. A presidente da República tem forte popularidade. Mas seu partido, o PT, parece ter poucas chances na competição pelas principais capitais. Está fora de cena no Rio e talvez Belo Horizonte. Já em Porto Alegre e São Paulo, pela primeira vez desde que existe o segundo turno (1988), até corre o risco de ficar fora da final.

Como conciliar dados assim antagônicos, um favorável e outro contrário ao PT? Comecemos notando que esse cenário desmente os comentários que ouvimos de adversários figadais: tucanos, que acusam o governo federal de mexicanizar o país, querendo abolir toda oposição; petistas, que se regozijam de ver a oposição minguando e já anunciam sua extinção. Nenhum deles tem razão. É verdade que muitos, inclusive eu, pensamos que a principal oposição, a que o PSDB comanda, com apoio do DEM e PPS, está sem muito projeto ou rumo. Mas ela tem votos. Pode ser que, se voltar ao poder, não saiba bem o que fazer. Só que uma parte razoável dos eleitores está disposta a votar nela. Ou seja, nem a oposição morreu, nem o Brasil vai ter um partido só. Como sempre, o exagero não é bom conselheiro.

Mas, com todos os riscos que implica uma previsão a quase meio ano das eleições, o que o quadro atual indica para nossa política? Primeiro, que a popularidade presidencial não se traduz automática ou integralmente em votos. Lula foi o presidente mais popular de nossa história, pelo menos desde que esse dado importa - isto é, desde que o povo passou a ser ator em nossa política, o que não aconteceu no Império, na República Velha ou na ditadura militar. Mas, de cada cem cidadãos que o aplaudiam no final de mandato, quarenta não votaram em sua candidata, no primeiro turno, e quase trinta escolheram o rival dela na decisão das eleições. De lá para cá, Dilma superou a frieza com que o povão a recebeu de início e ainda lhe somou o respeito da classe média e rica, granjeando um nível elevado de respeito. Parabéns. Mas isso se traduz em votos? Não é óbvio.

Em que prefeituras o PT estará apostando em 2010?

Continua havendo uma estranha política em nosso país. Por um lado, o PT governa, na escala federal - mas a partir de um único cargo, o maior da estrutura política brasileira, porém ainda assim solitário: a Presidência da República. Com um vice que não é confiável, isso significa depender demais de uma só pessoa, Dilma Rousseff. O PT é tudo e pode tornar-se quase nada.

Por outro lado, as forças políticas minoritárias, que não conseguem afrontar a presidência, mostram os músculos nos Estados e municípios. Mais nos Estados do que nas cidades. Aliás, muitos municípios de tamanho médio passaram para o PT estes anos. Graças à Presidência da República ele as conquistou, à medida que políticas as mais variadas - sociais, econômicas, universitárias - beneficiavam cidades que, antes, se sentiam abandonadas. Mas o PT avançou pouco no plano dos Estados. Hoje ele, que é fraco nos três maiores PIBs, governa o quarto e o sexto, Rio Grande do Sul e Bahia. Mas em São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro, nem chega ao segundo turno.

Uma razão para o semi-isolamento do PT é sua característica de partido que, sem ser extremista, está num dos polos da política brasileira. Ele foi para o centro desde que ganhou a Presidência, em 2002 - mas ninguém com algum peso está à sua esquerda. Por isso, ele não pode jogar um lado contra o outro. O PSDB pode aliar-se com o PMDB ou o DEM. Só não namora o PT. Já este não pode se aliar com o PSDB ou o DEM. Só lhe resta, dos partidos grandes, o PMDB, a agremiação menos definida do país. O próprio PSD, ao dizer seu fundador que não é de direita, de centro nem de esquerda, se mostra um PMDB mais explícito que o original em sua vagueza. Daí que o PT só ganhe eleições quando a polarização das coisas o coloca como finalista, e o êxito de suas políticas no âmbito respectivo cai bem junto aos eleitores. Por isso, ele perdeu governos que conquistara - Rio Grande do Sul, Mato Grosso do Sul e Distrito Federal. Por isso, conservou o governo federal e a Bahia. Um esgotamento de material o levou à derrota em Porto Alegre, até então sua vitrina, e dificulta sua volta ao poder naquela cidade.

Felizmente, estamos longe do partido único. Mas o caminho do PT é curioso. Até 2002, muitos esperavam uma ascensão gradual do PT: prefeituras, Estados e, finalmente, a Presidência. Lula conseguiu inverter a ordem. Contudo, nas eleições para os Estados ocorridas desde então - 2002, 2006 e 2010 - o PT avançou pouco. Mas prospera nos municípios pequenos e médios (nem tanto nas capitais). No fundo, é aquela mesma estratégia com uma modificação. A mudança foi ter começado pela presidência, que governa a economia e é decisiva para programas sociais. Economia e sociedade afetam diretamente os municípios. Dizia Ulysses Guimarães: as pessoas não moram nos Estados ou na União, mas nos municípios. É neles que a ação do PT mais dá retornos. Na verdade, no Brasil, não sabemos bem o que são os Estados. Não são os componentes originais da Federação. Não foram eles que a criaram; foi ela que lhes deu autonomia. Desde a colônia, a força no Brasil é municipal. As competências legislativas das Câmaras, municipal e federal, são notórias. Já as assembleias estaduais têm menos a fazer. Talvez por isso, conquistar municípios seja uma boa estratégia de longo prazo. Consolida a presidência, dá apoio nas bases, prepara - um dia - a eleição de mais governadores, que são personagens importantes na política nacional, líderes em seus Estados mas, no fundo, afetam menos a vida das pessoas que um bom (ou mau) prefeito.

Renato Janine Ribeiro é professor titular de ética e filosofia política na Universidade de São Paulo.

FONTE: VALOR ECONÔMICO

Nota paulista:: Melchiades Filho

A tímida largada de Fernando Haddad na capital pode induzir a uma avaliação errada sobre as possibilidades eleitorais do PT no Estado de São Paulo.

O partido montou sólida estratégia para tentar replicar nas prefeituras o apoio que costuma atrair nas campanhas a governador (de 30% a 35%). Hoje a legenda administra 68 dos 645 municípios paulistas -menos de 18% da população.

A primeira medida foi ampliar a presença da sigla no Estado. No dia da votação, em outubro, haverá diretórios petistas em 589 cidades, 184 a mais do que na ressaca das eleições de 2008. Comissões provisórias cuidarão de outras 52. Ou seja, em todo o Estado, apenas quatro municípios estão a descoberto.

A segunda medida foi lançar o máximo de candidatos próprios. Relatório entregue neste mês a Lula informa que já estão fechadas 311 chapas com o PT na cabeça. Projeta "alguma chance" de sucesso para 226 delas - e "muita" para 111.

O comando petista chegou a duas conclusões: a Presidência da República não será sua para sempre, ainda que outro mandato de Dilma pareça hoje ao alcance da mão, e a polarização com o PSDB está em vias de esgotamento -a campanha de reeleição de Geraldo Alckmin, em 2014, seria seu espasmo final.

Um novo adversário surgirá, talvez de dentro da atual coalizão federal -quem sabe o PSB do governador de Pernambuco, Eduardo Campos.

Nesse novo cenário, será mais do que desejável ter o controle do segundo e quinto maiores Orçamentos do país: São Paulo e sua capital.

Daí a necessidade de Dilma esquecer a promessa de não envolvimento e viajar para posar ao lado de Haddad. Daí o empenho do PT em digerir o ex-rival Gilberto Kassab, resgatar parceiros de mensalão e dar visibilidade a novos nomes, como Haddad e o ministro Alexandre Padilha (Saúde). Como o passado, o futuro do PT é muito paulista.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

O poder do ódio:: José Roberto de Toledo

Boa dose das decisões políticas é gestada no fígado. Para muitos eleitores, mais grave do que não eleger seu candidato preferido é ver um político que odeia ganhar a eleição. Votam em adversário "menos pior" para evitar mal maior. A decisão sugere pragmatismo, mas é difícil precisar onde termina o raciocínio e começa a racionalização - a justificativa lógica construída após o ato feito. O voto útil nasce pingando bile.

É mais comum do que gostamos de admitir. Basta lembrar das tardes de domingo. Quantas vezes cada um de nós ouviu um grito de prazer escapar da janela do vizinho - quiçá da nossa - quando o time rival toma um gol? Imperativos fazem coro com expletivos e saturam o ar de animosidade. O futebol se alimenta de paixões devotas e ódios consagrados. Com a política é igual. Saem as janelas e estádios, entram as redes sociais e blogs.

Por isso não convém menosprezar o poder do ódio nas eleições. De tão decisivo, tornou-se presença obrigatória nas pesquisas de intenção de voto. Foi revestido de circunstância para soar menos cru. A pergunta clássica nos questionários é: "Em quais destes candidatos você não votaria de jeito nenhum?". A causa subjacente às respostas é ojeriza, repulsa, antipatia, mas pode chamar de rejeição.

É muito difícil um candidato ganhar as graças do eleitorado. Mais difícil do que isso, só livrar-se da bile eleitoral. Uma vez impregnada, não sai nem lavando. A rejeição é persistente como um pernilongo. Podemos não lembrar por que sufragamos este, mas não esquecemos a razão pela qual não votamos naquele. O eleitor amadurece e envelhece abraçado ao seu rancor (apud João Antônio).

A rejeição pode inviabilizar políticos famosos e populares. Em São Paulo há casos notórios. O mais recente é de Marta Suplicy.

A petista começa quase toda eleição que disputa como favorita. Foi assim nas brigas pela Prefeitura em 2000 e 2008, e na corrida por uma das duas vagas no Senado em 2010. Marta sai na frente, mas raramente termina em primeiro lugar. Elegeu-se senadora atrás de Aloysio Nunes (PSDB), e perdeu no segundo turno para José Serra (PSDB) em 2004 e para Gilberto Kassab (então no DEM) em 2008. Culpa da rejeição.

Antes dela, houve Paulo Maluf (PP). Até desencantar nos pleitos majoritários, Maluf tentou ser prefeito, presidente, governador. Por mais eleitores que tivesse, sempre era barrado pela rejeição dos demais. Em 1992, quando conseguiu vencer um segundo turno, pareceu ter iniciado um novo ciclo. Mas a maré não durou e o ex-prefeito nunca mais ganhou um mata-mata. A rejeição voltou dobrada.

Como a bile eleitoral vai influir na disputa para prefeito de São Paulo? A pesquisa Ibope mostra que, por ora, Serra é o mais rejeitado pelos eleitores de 7 dos outros 9 pré-candidatos. Ao menos metade dos eleitores de Celso Russomanno (PRB), Paulinho da Força (PDT), Netinho (PC do B), Gabriel Chalita (PMDB) e até de Soninha (PPS) diz que não votaria em Serra. Quando elegeu-se prefeito de São Paulo, em 2004, Serra tinha apenas 15% de rejeição (Datafolha). Hoje, segundo o Ibope, 35% dos paulistanos dizem que não votariam no tucano de jeito nenhum.

Por causa da rejeição, Serra está mais perto de seu teto de votos do que seus adversários diretos. Teria menos chance que os demais de ganhar novos eleitores caso um dos seus adversários desistisse. Esse é o risco de largar muito na frente quando se é tão conhecido quanto ele e a rejeição é alta: há mais espaço para cair do que para subir.

As próximas pesquisas mostrarão se a trajetória do tucano será igual à de 2004, quando largou no patamar em que está hoje, subiu e terminou o primeiro turno com 10 pontos a mais do que quando começou a campanha, ou se repetirá Geraldo Alckmin (PSDB) em 2008, que também começou com cerca de 30% de intenção de voto, foi caindo, caindo e terminou quase com metade do cacife inicial. Tudo vai depender dos adversários com menos rejeição, se eles conseguirão sair do anonimato.

Para Fernando Haddad (PT), a única vantagem de ser tão desconhecido é que a maioria dos eleitores de outros candidatos não sabe quem ele é e, por isso, não pode rejeitá-lo. Mas essa taxa vai crescer à medida que mais gente descobrir que Haddad é o candidato do PT. Ele terá mais facilidade de assimilar a rejeição do partido do que ganhar a confiança de seus eleitores. Conquistar o voto depende de competência, o ódio vem por inércia.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

A estadista em construção:: Luiz Carlos Bresser-Pereira

Primeiro, foi a demissão de ministros comprometidos com a corrupção; depois, a firmeza que vem mostrando em baixar os juros, enfrentando para isso muitos interesses, inclusive os dos seus eleitores, pequenos poupadores; há alguns dias, foi o discurso na instalação da Comissão da Verdade em que fez uma bela defesa dos direitos humanos e do seu caráter suprapartidário; agora, é sua decisão histórica de, aplicando a Lei de Acesso à Informação, publicar os salários dos servidores do Executivo.

Todos atos que mostram coragem e firmeza, sugerindo que a presidente brasileira é uma estadista em construção.

Sua decisão que me levou a esta conclusão foi a da última semana -a de tornar pública a remuneração dos servidores públicos. Saber quanto recebem os servidores públicos eleitos e não eleitos é um direito inconteste dos cidadãos. Mas é um direito que sempre foi negado aos brasileiros.

Quando fui ministro da Administração Federal, decidi publicar os vencimentos dos servidores públicos no "Diário Oficial". Caiu uma tempestade sobre mim. Servidores indignados vieram me falar sobre seu "direito à privacidade".

Nas democracias, em relação ao dinheiro público, não há direito à privacidade; não há o "direito" de receber valores absurdos que nada têm a ver com o nível de seu cargo.

Alguns poderão dizer que meu entusiasmo em relação à presidente é apressado. De fato, é cedo para dizermos que Dilma Rousseff preenche as condições muito raras que definem um estadista. Mas estou dizendo que ela está "se construindo" como estadista. Ela está demonstrando a firmeza e a coragem que são necessárias.

Mas não basta isso. Conforme disse classicamente Maquiavel, além da "virtù", o príncipe necessita da fortuna. "Virtù" não significa apenas virtude, e sim competência para governar, discernimento ao tomar decisões, capacidade de fazer compromissos e, finalmente, bom êxito em seu governo. O que depende também da sorte -da fortuna.

Estadista é o governante que tem a visão do todo, olha para o futuro e tem a coragem de buscá-lo, confrontando os interesses de muitos, inclusive dos seus seguidores. É quem conhece seu país, sabe quais são seus grandes problemas e contribui para resolvê-los.
Os estadistas são geralmente identificados nas guerras em defesa de seu país, mas podem sê-lo em momentos decisivos de seu desenvolvimento econômico e social.

O estadista brasileiro do século 20 foi Getúlio Vargas, porque comandou a revolução nacional e industrial brasileira. A presidente Dilma poderá ser uma nova estadista, agora em um contexto democrático, se lograr vencer os dois grandes males brasileiros: a corrupção de suas elites e a armadilha da alta taxa de juros e do câmbio sobrevalorizado.

Em seu discurso na instalação da Comissão da Verdade, a presidente declarou: "A verdade é algo tão surpreendentemente forte que não abriga nem o ressentimento, nem o ódio, nem tampouco o perdão... é, sobretudo, o contrário do esquecimento". Deixo essa bela frase como fecho desta coluna. Muitos serão ainda os desafios que Dilma terá que enfrentar; não sabemos quanta fortuna terá, mas já sabemos que terá "virtù".

FONTE: FOLHA DE S. PAULO