quinta-feira, 11 de outubro de 2012

OPINIÃO DO DIA – Celso de Mello: ‘o mensalão maculou a República’ (LVXIII)


 Esses atos descaracterizaram por completo o modelo de democracia consensual, que legitima no contexto das agendas sociais, tanto do poder Executivo quanto do Legislativo, as negociações, que são legítimas.

Jogo político motivado por práticas criminosas perpetuadas à sombra do poder. Isso não pode ser admitido e tolerado.

Estamos tratando de macrodelinquência governamental, da utilização abusiva, criminosa do aparato governamental ou do aparato partidários por seus próprios dirigentes.
Condenam-se tais réus porque existem provas idôneas e processualmente aptas a revelar e demonstrar que tais acusados não só tinham o poder de evitar e fazer cessar o itinerário criminoso, mas agiram também com uma agenda criminosa muito bem articulada.

Para constrangimento dos cidadãos honestos, há políticos, governantes e legisladores que sustentando-se e abusando do aparato governamental corrompem eles próprios o poder da República.

Celso de Mello, ministro do STF, em seu voto na sessão de 10/10/2012

Manchetes de alguns dos principais jornais do Brasil

O GLOBO 
Após condenação, PT corre para conter dano eleitoral SP:
Haddad sai na frente
Prisão imediata entrará em pauta
País elegeu 118 prefeitos 'pendurados'
Dividido, BC corta taxa de juros

FOLHA DE S. PAULO 
Haddad começa 2º turno 10 pontos à frente de Serra
Dirceu pede que petistas reajam à mídia e à Justiça
Ministro diz que mensalão é 'projeto criminoso de poder'
Barrados pela Lei da Ficha Limpa elegem familiares
Dividido, Banco Central diminui taxa de juros em 0,25 pontos

O ESTADO DE S. PAULO 
O alcance de uma sentença
As ameaças da Aneel
O maior déficit é de confiança
O FMI condena a expansão excessiva do crédito

VALOR ECONÔMICO 
Mercado reavalia o risco regulatório de concessões
BC reduz juro a 7,25% e encerra ciclo de cortes
No topo Água divide os votos em Manaus
O que tirou Russomanno da disputa em SP

BRASIL ECONÔMICO 
Copom reduz taxa básica para 7,25%, com três votos contrários
Petroleira russa investe em óleo da Bacia do Solimões
Cade aprova, com restrições, a incorporação da Webjet pela Gol
Segundo turno

CORREIO BRAZILIENSE
De engraxate a presidente do STF
PT faz defesa de Dirceu e Genoino
Placar pela condenação de Dirceu, no Supremo, fecha em 8 a 2
Dividido, BC reduz juros ao menor patamar da história

ESTADO DE MINAS 
Perigo além das curvas
Condenado, Genoino deixa o governo
Presidente eleito
O mapa dos votos até a Câmara de BH

ZERO HORA (RS)
Tarso prepara concessões de obras ao setor privado
BC contraria expectativa e corta juro
Receita vai detalhar regras de free shops

JORNAL DO COMMERCIO (PE) 
Trânsito mais livre no caminho da praia
Para Dirceu, condenado foi o PT
Barbosa eleito novo presidente do Supremo
PSB exige Dilma em 2014 para manter a aliança
Taxa de juros

Após condenação, PT corre para conter dano eleitoral


Cúpula do partido se solidariza com Dirceu e Genoino, que deixa cargo na Defesa

Presidente do STF conclui votação e diz que mensalão foi tentativa de golpe do PT para se perpetuar no poder; Celso de Mello fala em "utilização criminosa do aparelho de Estado"

Com aval de José Dirceu, o PT decidiu ontem não reagir à condenação de seus dirigentes pelo STF para não atrapalhar o desempenho nas eleições. Tanto Dirceu quanto José Genoino, no entanto, foram aplaudidos na reunião do Diretório Nacional do partido. Emocionado, Genoino disse ser inocente e "não se envergonhar de nada". Ele deixará o cargo de assessor especial do Ministério da Defesa. Na conclusão de mais um item do julgamento, o presidente Ayres Britto disse que o mensalão foi um golpe na democracia.

PT: hora de reduzir danos

Partido se solidariza com réus do mensalão e diz que o importante agora é ganhar as eleições

Tatiana Farah, Thiago Herdy

SÃO PAULO Um dia depois da condenação dos dirigentes petistas pelo Supremo Tribunal Federal (STF), o diretório nacional do partido se reuniu ontem, com a presença de dois dos réus, o ex-ministro José Dirceu e o ex-presidente do PT José Genoino, e decidiu que uma eventual reação do partido ao julgamento do mensalão só será feita depois do segundo turno das eleições. O PT está em campanha em 22 cidades, sendo seis capitais, entre elas São Paulo. Ex-presidentes do PT, Dirceu e Genoino participaram da reunião do diretório e foram aplaudidos pelos companheiros de partido.

- O importante agora são as eleições - disse Dirceu ontem aos dirigentes petistas.

Em resolução divulgada após a reunião, os dirigentes sequer citam o nome dos políticos condenados e não contestam a decisão dos ministros do Supremo. Eles criticam o uso do julgamento por seus adversários, afirmando que o objetivo do processo é "criminalizar o PT". Em texto de oito parágrafos, destinaram apenas um para tratar do tema:

"Nosso desempenho nas eleições municipais ganha ainda maior significado quando temos em conta que ele foi obtido em meio a uma intensa campanha promovida pela oposição de direita e seus aliados na mídia cujo objetivo explícito é criminalizar o PT. Não é a primeira nem será a última vez que os setores conservadores demonstram sua intolerância; sua falta de vocação democrática, sua hipocrisia, os dois pesos e medidas com que abordam temas como a liberdade de comunicação, o financiamento das campanhas eleitorais, o funcionamento do Judiciário; sua incapacidade de conviver com a organização independente da classe trabalhadora", diz o texto.

Mais adiante, os dirigentes concluem: "aos ataques e manipulações contraporemos a defesa enfática de nosso projeto estratégico", deixando claro que o partido ainda não decidiu abraçar a defesa da inocência de José Dirceu ou mesmo a tese defendida na terça-feira por ele, segundo a qual teria sido vítima de um "julgamento de exceção" e sem contar com a "presunção da inocência".

Dirceu participou da reunião e fez dois breves discursos, ambos orientando o partido a priorizar o processo eleitoral e adiar qualquer decisão sobre a eventual defesa pública da legenda aos principais réus do mensalão. No final da tarde, divulgou em seu site uma nota de agradecimento aos militantes e pediu mais uma vez foco nas eleições.

"Agora, o que conta e interessa é o segundo turno nas capitais e demais cidades, começando por São Paulo. Vamos às ruas e à luta para consolidar nossa vitória do primeiro turno, apoiando nossos candidatos ou aliados", escreveu o petista, que, anteontem, afirmou que levará aos últimos recursos sua defesa no processo.

Antes de Dirceu falar aos petistas, o ex-deputado José Genoino leu uma carta, na qual afirma ser inocente. Alguns dirigentes chegaram a chorar com Genoino.

A fala de Dirceu, no entanto, foi mais pragmática. Ele defendeu que, a despeito do julgamento do mensalão, o PT aumentou em 12% sua presença nas prefeituras do país na comparação com 2010 e que crescer ainda mais deveria ser, no momento, a prioridade do partido. Suas declarações soaram como uma senha para que nenhum petista, principalmente candidato, sinta-se na obrigação de defendê-lo.

- Esta é uma disputa política de médio e longo prazos. Vai ser feita no determinado momento - disse o deputado Paulo Ferreira (PT-RS), referindo-se à defesa do PT no mensalão.

Ferreira, no entanto, não se conteve ao criticar a condenação dos petistas no STF:

- São condenações profundamente injustas. Nenhum deles é quadrilheiro.

Apesar de prometer dedicar a vida à sua "sede de justiça" e à defesa de sua inocência, Dirceu não contará com os principais companheiros do partido em sua luta pública, pelo menos por agora. Entre petistas, há quem duvide que até mesmo depois das eleições o partido atue com veemência na sua defesa. Caso do deputado federal Jilmar Tatto (PT-SP), para quem o ex-ministro deve usar todos os mecanismos possíveis para tentar provar sua inocência, mas sem que o partido abrace sua tese:

- O fato concreto é que já tem uma decisão, e ela está transitado em julgado. A história do Zé Dirceu é de quem resiste, e ele não vai seguir de cabeça baixa, o que não significa que ele não vai aceitar a decisão, até porque não tem outra alternativa. O Zé vai tentar provar sua inocência. O PT vai continuar sua história, sua vida, independentemente da ação de indivíduos.

Ao sair da reunião ontem, Dirceu foi alvo da manifestação de sete pessoas ligadas a uma associação de policiais reformados, que gritaram palavras de ordem contra ele.

Fonte: O Globo

Gurgel contesta Dirceu e diz que STF observou direitos dos réus


"É tremenda bobagem", diz Barbosa sobre recurso de condenados à OEA

Vinicius Sassine, André de Souza

UM JULGAMENTO PARA A HISTÓRIA

BRASÍLIA O procurador-geral da República, Roberto Gurgel, rebateu ontem a afirmação do ex-ministro José Dirceu de que foi condenado por um "juízo político e de exceção". O ex-ministro da Casa Civil no primeiro governo Lula foi condenado por 8 votos a dois por corrupção ativa no esquema do mensalão, na sessão de ontem do Supremo Tribunal Federal (STF). Gurgel saiu em defesa da decisão da Corte:

- A afirmação (de Dirceu) é absolutamente despropositada. O STF se esmerou em assegurar direitos e garantias previstos na Constituição federal. Está longe de ser um tribunal de exceção. É, na verdade, um exemplo magnífico de observância de direitos e garantias.

"Réus são tratados como tais"

Já o ministro relator do caso, Joaquim Barbosa, classificou as declarações de Dirceu como alegações de um réu.

- Não costumo comentar afirmações de políticos. Esse não é meu papel. Ele é réu, mas réu eu trato como réu. Só isso. Os réus são tratados como tais por mim. Agora, se um determinado réu resolve politizar um julgamento, isso é problema dele.

Questionado sobre a possibilidade de os réus recorrerem a cortes internacionais, como foi cogitado pelo deputado federal Valdemar da Costa Neto (PR-SP), Barbosa comentou:

- Isso é uma tremenda bobagem.

Depois da maioria de votos pela condenação, Dirceu divulgou em seu blog uma "carta ao povo brasileiro". No texto, o ex-ministro se disse injustiçado e afirmou: "Os autos registram para sempre a ausência de provas e minha inocência. O Estado de Direito Democrático e os princípios constitucionais não aceitam um juízo político e de exceção."

Para o procurador Roberto Gurgel, as condenações estão se baseando em provas concretas da participação dos réus no esquema do mensalão. Ele criticou a ideia de as defesas de recorreram à Organização dos Estados Americanos (OEA) contra as condenações:

- Jamais houve perseguição do Ministério Público. A acusação está solidamente amparada em provas. As defesas pretendem que esse não seja um julgamento definitivo, mas é, sim - disse Gurgel.

O procurador-geral não quis emitir opinião sobre a análise do item de formação de quadrilha, prevista para ocorrer no plenário do STF nas próximas semanas. Dirceu é acusado pelo Ministério Público de ser o chefe da quadrilha do mensalão. O procurador-geral também preferiu não se manifestar sobre o pedido de prisão imediata dos réus, o cálculo do tamanho das penas e a possibilidade de adoção de medidas para evitar a fuga de condenados do país.

- Vamos aguardar o fim do julgamento - afirmou Gurgel.

Fonte: O Globo

Ayres Britto: mensalão foi um golpe na democracia


Celso de Mello aponta "utilização criminosa do aparelho de Estado", e Dirceu é condenado por 8 votos a 2

André de Souza, Carolina Brígido

BRASÍLIA - O Supremo Tribunal Federal (STF) confirmou ontem a condenação por corrupção ativa do núcleo político do mensalão, formado pelo ex-ministro da Casa Civil José Dirceu, pelo ex-presidente do PT José Genoino e pelo ex-tesoureiro petista Delúbio Soares. Ontem, votaram o presidente da Corte, Ayres Britto, e Celso de Mello.

Os dois aproveitaram seus votos para refutar as críticas de que o STF não estaria conduzindo o julgamento de forma justa e imparcial. Para ambos, o processo está repleto de provas de que Dirceu era o chefe do esquema. Dirceu acabou condenado por 8 votos a 2; Genoino, por 9 a 1; e Delúbio, pela unanimidade dos ministros. Também foram condenados pelo mesmo crime Marcos Valério e outros quatro réus ligados a ele.

Para Celso de Mello, não há como aceitar o argumento das defesas de Dirceu e Genoino de que ambos estavam só fazendo política, e não corrompendo deputados. Segundo ele, os dois usaram a estrutura do governo para cometer crimes:

- Nem se diga que os réus, notadamente Dirceu e Genoino, limitaram-se a desenvolver atividades políticas, o que tornava necessários os contatos frequentemente mantidos com políticos e dirigentes partidários. O diálogo institucional não autoriza a utilização criminosa do aparelho de Estado e a utilização ilícita do aparato governamental em ordem a viabilizar a consecução de objetivos inconfessáveis de práticas delituosas que transgridem a legislação penal do Estado.

Ayres Britto ressaltou que Dirceu era o homem forte do governo Lula e tinha como tarefa montar a base:

- À medida que prosseguia nas respostas às perguntas da magistrada que o interrogava, ele (Dirceu) foi deixando claro que era de fato o primeiro-ministro do governo. Tudo passava pelas mãos dele. Ele foi coordenador da campanha, foi o comandante da transição. No governo que se instaurou, ele foi o chefe da Casa Civil, mas era plenipotenciário. Ele dizia: "Eu me reunia com praticamente todos os partidos para formar a base". (...) E, no caso, a Suprema Corte assentou que as alianças foram feitas argentariamente.

Para Ayres Britto, o chamado núcleo político não tinha projeto de governo, mas de poder:
- Com a velha, matreira e renitente inspiração patrimonialista, um projeto de poder foi arquitetado. Não de governo, porque projeto de governo é lícito, mas um projeto de poder que vai muito além de um quadriênio quadruplicado, muito mais de continuidade administrativa. É continuísmo governamental. Golpe, portanto, nesse conteúdo da democracia, que é o republicanismo, que postula renovação dos quadros de dirigentes.

Segundo Celso de Mello, os corruptores eram "dirigentes capazes de perpetrar delitos infamantes", "arrogantes" e tinham "senso de impunibilidade". Também disse que os "agentes perpetradores das práticas criminosas" não tinham escrúpulos, tinham "avidez pelo poder", e agiram sem "integridade, honra, decência e respeito aos valores da República". Celso também ressaltou que as migrações de deputados para partidos da base, aliada em troca de pagamento de propina do valerioduto, foram "grave desvio ético-político".

Ayres Britto ressaltou que a formação de alianças entre os partidos é natural na política brasileira. O problema é a forma como o PT fez isso:

- O que é estranhável neste caso é a formação argentária, pecuniarizada de alianças. É um estilo de coalizão excomungado pela Justiça brasileira. É lamentável, catastrófico que partidos foram açambarcados por um deles para uma aliança perene, indeterminada no tempo, no sentido de votar todo e qualquer projeto de interesse do partido hegemônico.

Assim como Cármen Lúcia no dia anterior, Celso de Mello disse ontem que o STF não estava julgando a história de vida dos réus, mas as acusações do Ministério Público Federal. Para ele, há provas suficientes para justificar a condenação dos réus por corrupção ativa:

- Tenho por inadmissível e desconstituída de consistência a afirmação de que este processo busca condenar a atividade política, busca condenar réus pelo só fato de haverem sido importantes figuras políticas ou haverem desempenhado papel de relevo na vida partidária, na cena política ou nos quadros governamentais. Ao contrário, condenam-se tais réus porque existe prova juridicamente idônea a revelar e demonstrar que tais acusados agiram de acordo com uma agenda criminosa muito bem articulada, valendo-se para tanto de sua força, do seu prestígio e de seu inquestionável poder sobre o aparelho governamental e sobre o aparato partidário da agremiação a que estavam vinculados.

Fonte: O Globo

Dirceu, na linha de frente do 'vale tudo'


Petistas dizem que ex-ministro pôs em prática estratégia de cooptação para garantir a reeleição de Lula

Maria Lima, Fernanda Krakovics

UM JULGAMENTO PARA A HISTÓRIA

BRASÍLIA - Passados quase dez anos da subida do PT ao poder, líderes e ex-parlamentares do partido relembram cenas e fatos dos primeiros anos de governo Lula. A percepção de alguns é que, já naquela época, vários episódios indicavam que o comando com mão de ferro de José Dirceu, nas reuniões do Planalto e do partido, desembocaria num escândalo. Desde o início do governo Lula, em 2003, Dirceu tinha a meta de criar uma base para a reeleição de 2006, que passava pela eleição de cerca de mil prefeitos em 2004, projeto ambicioso para um partido que tinha 140.

A base no Congresso já era grande - 93 petistas e, somados os aliados, 130 a 140 deputados. Dirceu, porém, dizia que era pouco para garantir a governabilidade. Daí começou a corrida aos partidos, primeiramente com o PMDB.

- Nas reuniões com a bancada e com o diretório, não havia transigência com os críticos da política de alianças ou política econômica do governo. O Zé chegou a criar a imagem do transatlântico. Dizia que, para manobrar um transatlântico, era preciso fazer devagar, e isso levava tempo - diz um dos petistas que participava das discussões.

Nos planos, uma "imprensa petista"

Raul Pont, ex-deputado do PT gaúcho, que era um crítico ácido da estratégia de tudo ou nada para as alianças, diz que Dirceu executava uma política endossada pelo então presidente Lula.

- Essa política permitiu que Lula fosse reeleito em 2006 e Dilma, eleita em 2010. Mas o preço que se paga é muito alto. O Zé Dirceu foi uma das vítimas disso, de fazer alianças com partidos contraditórios que só se movem por compensações financeiras, cargos e ministérios - diz Pont.

Ex-aliados que conviveram com Dirceu naquela época contam que ele gostava da "estatística da dominação". Ele teria ainda lançado a tese de que era importante criar uma imprensa petista.

- Isso tudo nasceu da mentalidade do Lula, que fala as coisas nas reuniões e espera que apareça alguém que faça. Era uma coisa chavista, kirchnerista. Muita gente no PT caiu nisso e continua pregando o método - relata um ex-membro do diretório nacional do PT.

Em entrevista à revista "Piauí" em 2008, ao falar sobre críticos como Pont e a ex-senadora petista Heloisa Helena, Dirceu disse que eles e outros chegavam para Delúbio (Soares, então tesoureiro do PT) e diziam "preciso de R$ 1 milhão, mas não queriam saber como ele se virava para conseguir".

- Aí estourou o mensalão e esse pessoal vem dizer que o Delúbio era o homem da mala. O que não dizem é que a mala era para eles - afirmou Dirceu.

O episódio de outubro de 2004, quando Lula cortejou o então deputado Roberto Jefferson, num jantar em sua casa, em Brasília - com o anfitrião tocando ao piano "Eu sei que vou te amar" - é citado como o mais significativo.

- Naquele jantar, Lula liberou o vale tudo. Ele dava as ordens e Dirceu ia a campo executar. O que na boca de Lula eram metáforas, nas de Zé Dirceu viravam verdade - diz um deputado petista, que diferencia o papel de Genoino: - O Genoino, não. Ele era diferente, afável, aberto a ponderações, muito diferente do Zé, que agia de forma impositiva.

Delúbio, dizem esses petistas e aliados, pouco aparecia nas reuniões de bancadas e do Planalto. Só atuava nos bastidores ou com alguns parlamentares mais ligados a Dirceu.

Fonte: O Globo

'Na política o vale-tudo não pode prevalecer'


Para governador aliado, caso marca limites; Suplicy chora ao ler carta

Fernanda Krakovics, Paulo Celso Pereira

BRASÍLIA - A condenação pelo Supremo Tribunal Federal (STF) dos envolvidos no mensalão, incluindo o ex-ministro José Dirceu, foi considerada importante pelo governador do Ceará, Cid Gomes (PSB).

Aliado do PT no governo federal, Cid Gomes destacou a importância do julgamento para a imposição de limites na política e afirmou que o episódio é "didático para o país".

Após reunião na sede do PSB, ontem, Cid Gomes afirmou que não fica feliz nem comemora condenações de ninguém, mas ponderou:

- Acho que esse processo todo tem sido importante para que a gente demarque bem que a política tem o seu limite, que essa história de que na política vale tudo não pode prevalecer.

O governador destacou a importância do Supremo para impor esse limite:

- Isso é didático para o Brasil. Embora as pessoas estejam cada vez mais afastadas da política, isso contribui para que a gente possa impor limite e as pessoas compreendam que está ali alguém fiscalizando a conduta e o dia a dia dos profissionais da vida pública.

Fonte: O Globo

Dirceu pede que petistas reajam à mídia e à Justiça

Em reunião fechada com a direção nacional do PT, em São Paulo, o ex-ministro da Casa Civil José Dirceu e o ex- presidente do partido José Genoino, condenados por corrupção ativa no processo do mensalão, estimularam os petistas a reagirem à Justiça e à mídia, a quem acusaram de perseguição.

Dirceu disse que a prioridade agora é vencer a eleição no maior número possível de cidades e que foi o partido, e não ele, o principal condenado pelo STF. Genoino demitiu-se de cargo no Ministério da Defesa.

Dirceu prega reação à mídia e ao Judiciário

Ex-ministro reaparece e estimula direção do PT a reagir, mas diz que o importante agora é vencer eleições municipais

Condenado pelo STF, petista defende que partido se concentre no 2º turno e pede esforço especial por Haddad

Catia Seabra, Bernardo Mello Franco

SÃO PAULO - Em reunião fechada com a direção nacional do PT, o ex-ministro José Dirceu, condenado por corrupção ativa no processo do mensalão, pregou ontem que o partido reaja à Justiça e à mídia, a quem acusou de perseguição.

Ele pediu que a ofensiva seja deixada para depois do segundo turno das eleições municipais, para evitar prejuízos a candidatos petistas.

Disse que a prioridade agora é vencer no maior número possível de cidades, e pediu esforço especial por Fernando Haddad em São Paulo.

Para estimular os petistas, o ex-ministro afirmou que foi o partido, e não ele, o principal réu condenado pelo STF (Supremo Tribunal Federal).

"Mais importante do que discutir o julgamento é ganhar a eleição", disse, segundo relatos de petistas. "Vencer as eleições é a melhor resposta aos nossos adversários.

O discurso seguiu roteiro acertado na véspera com o ex-presidente Lula: o fundamental agora, para o PT, é ampliar as vitórias eleitorais.

Quatro horas mais tarde, depois de um inflamado discurso do ex-deputado José Genoino, que também foi condenado pelo Supremo, Dirceu retomou a palavra.

Disse concordar com a avaliação do colega de que o julgamento do mensalão refletiu a luta de classes no país e pregou a criação de controles para a mídia e o Judiciário.

Ele não detalhou seus planos de intervenções, mas deixou claro que considera a imprensa e a Justiça comandadas pela oposição.

Dirceu defendeu ainda que os petistas se lançassem numa campanha pela reforma política como instrumento para combater "a direita".

"Se não aprovarmos o financiamento público, estaremos mortos", disse, ainda segundo relato de petistas participantes da reunião.

O PT divulgou documento em que que diz ter sido diz ter sido vítima de "hipocrisia" e "intolerância" no primeiro turno das eleições, que coincidiu com a primeira parte do julgamento do mensalão.

A sigla afirma ter enfrentado "intensa campanha promovida pela oposição de direita e seus aliados na mídia".

"Não é a primeira vez, nem será a última, que os setores conservadores demonstram sua intolerância, sua falta de vocação democrática, sua hipocrisia, dois pesos, duas medidas", diz a nota, que foi antecipada pelo site da Folha.

Genoino propôs a única alteração no texto original apresentado pela cúpula petista, pregando "defesa enfática" do PT. "Aos ataques e manipulações, contraporemos a defesa enfática de nosso projeto estratégico", diz o trecho redigido por ele.

O presidente da CUT (Central Única dos Trabalhadores), Vagner Freitas, propôs uma manifestação em solidariedade aos condenados, mas o PT optou por esperar a eleição. Em nota, a central acusou o STF de julgar "a serviço dos conservadores".

Dirceu foi à sede do partido em carro com vidros escuros e tentou se esconder dos jornalistas. Na saída, o veículo foi cercado por PMs da reserva, que o chamaram de "ladrão". "Não adianta ir para a cadeia. Tem que devolver o dinheiro", gritou o subtenente Clovis de Oliveira, 71.

José Dirceu:

"Mais importante do que discutir o julgamento é ganhar a eleição"

"Vencer as eleições é a melhor resposta aos nossos adversários"

"O condenado [no julgamento do mensalão] não fui eu, mas o PT"

José Genoino:

"Retiro-me do governo com a consciência dos inocentes"

"A corte errou. A corte foi, sobretudo, injusta. Condenou um inocente"

"O julgamento da população sempre nos favorecerá"

Fonte: Folha de S. Paulo

Ministro diz que mensalão é 'projeto criminoso de poder'


Ao condenar os ex-dirigentes petistas, o ministro do STF Celso de Mello disse que o mensalão foi fruto de um "projeto criminoso de poder" e de "macrodelinquência governamental". Ayres Britto chamou o esquema de tentativa de "golpe". Joaquim Barbosa será o novo presidente da corte.

Ministros dizem que projeto de poder de petistas era "criminoso"

Celso de Mello aponta "macrodelinquência governamental" e Ayres Britto vê golpe contra instituições

Julgamento de Dirceu, Genoino e Delúbio por corrupção ativa é concluído com 8 votos a 2 pela condenação

Felipe Seligman, Flávio Ferreira, Márcio Falcão, Nádia Guerlenda e Rubens Valente

BRASÍLIA - O ministro Celso de Mello, mais antigo dos atuais integrantes do STF (Supremo Tribunal Federal), disse ontem que o mensalão foi a criação de um "projeto criminoso de poder", ao condenar o ex-ministro José Dirceu e dois ex-dirigentes do PT por seu envolvimento com o esquema.

O Supremo concluiu ontem o julgamento de Dirceu pelo crime de corrupção ativa. Ele foi condenado por 8 votos a 2 como principal responsável pela organização do mensalão, que distribuiu milhões de reais a parlamentares que apoiaram o governo no Congresso no primeiro mandato do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (2003-2005).

Dirceu foi condenado ao lado do ex-presidente do PT José Genoino e do ex-tesoureiro da sigla, Delúbio Soares. Os ministros do Supremo concluíram que os três organizaram o mensalão para corromper políticos de quatro partidos, o PP, o antigo PL (hoje PR), o PTB e o PMDB.

O crime de corrupção ativa prevê pena de 2 a 12 anos de prisão e multa. O tamanho das penas de Dirceu e dos outros réus e o regime em que elas terão que ser cumpridas só serão definidos pelo Supremo no fim do julgamento.

Para Celso de Mello, o mensalão foi fruto de uma "agenda criminosa" e de um "projeto criminoso de poder engendrado, concebido e implementado a partir das mais altas instâncias governamentais e praticado pelos réus, entre eles Dirceu e o ex-presidente do PT José Genoino".

"Estamos tratando de macrodelinquência governamental, da utilização abusiva, criminosa do aparato governamental", disse Mello.

Para o ministro, o processo revelou uma "grande organização criminosa que se constituiu à sombra do poder, formulando e implementando medidas ilícitas que tinham por finalidade realização de um projeto de poder".

Celso de Mello disse ainda que a "falta de escrúpulos" dos acusados evidenciou "sua avidez por poder" e uma "ação predatória sobre os bons costumes". "O que se rejeita [...] é o jogo político motivado por práticas criminosas perpetradas à sombra do poder. Isso não pode ser tolerado, não pode ser admitido".

"Golpe"

O presidente do STF, Ayres Britto, que também votou pela condenação, também foi duro com os petistas. Ele afirmou que "um projeto de poder foi arquitetado" contra as instituições democráticas.

"Golpe, portanto, nesse conteúdo da democracia, talvez o conteúdo mais eminente da democracia, que é a República, o republicanismo, que postula possibilidade de renovação dos quadros e dirigentes", disse o ministro.

Para Britto, no mensalão não havia um projeto de governo "lícito", mas um plano que ia "além de um quadriênio quadruplicado", ou seja, 16 anos: "Um projeto de governo que, muito mais do que continuidade administrativa, é seca e rasamente continuísmo governamental", disse.

Mello e Ayres Britto disseram que não julgaram os acusados por suas histórias pessoais, mas sim por atos a eles imputados pela acusação.

O STF também condenou o empresário Marcos Valério Fernandes de Souza, operador do mensalão, seus sócios Cristiano Paz e Ramon Hollerbach, seu advogado Rogério Tolentino e sua ex-funcionária Simone Vasconcelos. Outra ex-funcionária, Geiza Dias, e o ex-ministro Anderson Adauto foram absolvidos.

Frases

Celso de Mello:

"Estamos tratando de macrodelinquência governamental, da utilização abusiva, criminosa do aparato governamental ou do aparato partidário por seus próprios dirigentes"

"A falta de escrúpulos evidenciou a avidez por poder, [numa] ação predatória"
"O que se rejeita é o jogo político motivado por práticas criminosas perpetradas à sombra do poder. Isso não pode ser tolerado"

Ayres Britto:

"Os autos dão conta de que, na velha, matreira, renitente inspiração patrimonialista, um projeto de poder foi arquitetado"

"Um projeto de poder quadrienalmente quadruplicado. Projeto de poder de continuísmo seco, raso. Golpe, portanto"

"Um partido não pode se apropriar de outro, menos ainda à base de propina e estendendo sua malha hegemônica"

Fonte: Folha de S. Paulo

PT faz defesa de Dirceu e Genoino


Um dia depois de serem condenados por corrupção pelo STF, os dois foram recebidos como heróis em ato de desagravo feito pelo PT, a portas fechadas, em São Paulo. Dirceu entrou pela garagem.Genoino deixou o governo.

PT sai em defesa dos condenados

Durante encontro do diretório nacional em São Paulo, petistas fazem ato de desagravo a Dirceu e a Genoino. Cúpula da legenda diz que o momento é de defender as gestões de Lula e Dilma

Paulo de Tarso Lyra

Um dia depois de terem sido condenados pelo Supremo Tribunal Federal por corrupção ativa no escândalo do mensalão, o ex-chefe da Casa Civil José Dirceu e o ex-presidente do PT José Genoino foram ovacionados por correligionários no Diretório Nacional do PT, em São Paulo. Antes de o partido debruçar-se sobre os números da eleição, Genoino e Dir-ceu foram apresentados como heróis. O ex-presidente do PT leu uma carta na qual abria mão do cargo no Ministério da Defesa (leia matéria abaixo) e foi recebido por gritos de "Genoino, guerreiro, do povo brasileiro".

Dirceu, mantendo seu estilo pragmático e frio que o caracterizou ao longo de toda a trajetória política, falou pouco sobre a condenação do STF. Tanto ele quanto Genoino ainda serão julgados por formação de quadrilha. Disse que o partido terá de acostumar-se a disputar o segundo turno das eleições municipais com o peso do mensalão. E acrescentou que a prioridade dos petistas deve ser as eleições, não o julgamento. E o foco deve ser a candidatura de Had-dad para a prefeitura de São Paulo.

No início da noite, o Diretório Nacional do PT divulgou uma nota avaliando o resultado obtido pelo partido nas urnas — foi o que mais votos recebeu, com 17,198 milhões, o que representa 16,76% do eleitorado — apesar do escândalo do mensalão, na opinião dos dirigentes petistas. "Nosso desempenho nas eleições municipais ganha ainda maior significado, quando temos em conta que ele foi obtido em meio a uma intensa campanha, promovida pela oposição de direita e seus aliados na mídia, cujo objetivo explícito é criminalizar o PT."

O documento afirma que esta não é "a primeira nem será a última vez que os setores conservadores demonstram sua intolerância; sua falta de vocação democrática; sua hipocrisia, os dois pesos e medidas com que abordam temas como a liberdade de comunicação, o financiamento das campanhas eleitorais, o funcionamento do Judiciário". Para a direção do PT, muito além do período eleitoral, este é o momento de o partido expor as diferenças entre os projetos nacionais, defender as administrações petistas — a começar pelos governos Lula e Dilma. "Aos ataques e manipulações, contraporemos a defesa enfática de nosso projeto estratégico", conclui o texto.

Reformas

Enquanto o PT curava suas feridas, a Central Única dos Trabalhadores (CUT) também criticava o Supremo pelo julgamento do men-salão. A entidade afirmou "repudiar o comportamento do STF que se colocou a serviço dos conservadores, da imprensa neoliberal e de todos que querem criminalizar os movimentos sociais e seus representantes no parlamento, usando, inclusive, o processo eleitoral a serviço dos reacionários".

Reforçando que sempre defenderá o ex-presidente Lula, a CUT cobrou uma ampla reforma do Judiciário para que "as regras legais sejam adequadas à realidade, diminuindo as subjetividades e aumentando a transparência e o controle social na gestão, evitando manipulações e casuísmos na Justiça".

Fonte: Correio Braziliense

Condenado, Dirceu diz que prioridade é ganhar 2º turno


Ex-ministro afirma no Diretório do PT que meta agora é superar o PSDB em SP; Genoino deixa cargo no governo

Condenado pelo STF por corrupção ativa, o ex-ministro José Dirceu disse ontem no Diretório Nacional do PT que a demanda do mensalão será "uma batalha para muitos anos". Ao conclamar seus companheiros a se mobilizar para o desafio das eleições municipais em São Paulo, ele declarou: "A prioridade agora é o segundo turno, ganhar a eleição em São Paulo. O resto vamos resolver durante toda a nossa vida". O ex-ministro agradeceu "o apoio, a solidariedade" que vem recebendo do PT. Antes de destacar que o importante agora é levar o candidato da legenda Fernando Haddad ao triunfo, ele se disse "injustiçado, condenado sem provas". Também condenado, José Genoino pediu ontem demissão do cargo de assessor especial do Ministério da Defesa. O procurador-geral da República, Roberto Gurgel, autor dos pedidos de condenação, disse que o resultado é "exemplar" e rebateu carta em que Dirceu comparou a decisão do STF a um "juízo político de exceção". Para ele, a afirmação é "absolutamente despropositada".

Dirceu diz a dirigentes petistas que vencer eleição é mais importante que julgamento

Vera Rosa, Fausto Macedo , Fernando Gallo

Vinte e quatro horas após a condenação do núcleo político do PT no julgamento do mensalão, a cúpula petista fez duro ataque ao Judiciário e avaliou que a elite adota "dois pesos e duas medidas" para criminalizar o partido. Mesmo assim, em reunião com o ex-chefe da Casa Civil José Dirceu e o ex-presidente do PT José Genoino - condenados pelo Supremo Tribunal Federal por corrupção ativa -, o Diretório Nacional da legenda decidiu desviar o foco do escândalo e adotar o pragmatismo, na tentativa de vencer as eleições municipais.

"Nossa prioridade, agora, é ganhar o segundo turno, principalmente em São Paulo, contra o PSDB. O mensalão será uma batalha para muitos anos", afirmou Dirceu, ovacionado pela plateia, formada por cem dirigentes, senadores e deputados. Com esse diagnóstico, o PT congelou a intenção de fazer desagravos a ele, a Genoino e ao ex-tesoureiro Delúbio Soares, também condenado pelo Supremo.

A portas fechadas, Dirceu garantiu que não cairá deitado nem abandonará a política, mesmo que seja preso. Não foi só: disse que todo o ataque do PSDB deve ter revide à altura, com a lembrança do mensalão tucano. Antes de chegar ao PT, ele postou em seu blog texto no qual agradece a solidariedade recebida. "O apoio (...) me dá forças e enche minha alma de luz e de vontade de lutar", escreveu.

Enquanto a cúpula do PT atacava a "hipocrisia" e a "intolerância" de "setores conservadores", a presidente Dilma Rousseff e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva se debruçavam sobre o mapa eleitoral. Dilma desembarcou em São Paulo para almoçar com Lula.

Os dois escalaram ministros e dirigentes do PT para apagar incêndios e atrair o apoio do PRB de Celso Russomanno à candidatura de Fernando Haddad (PT). Queriam, também, reverter a decisão do PDT de aderir a José Serra (PSDB). Não conseguiram. O PRB, que se declarou neutro, e o PDT de Paulinho da Força integram a base aliada e estão insatisfeitos com o espaço no governo.

Chamado às pressas por Lula e Dilma, o presidente do PT, Rui Falcão, deixou a reunião do Diretório Nacional logo após ser aprovada a resolução política, mas sem encaixar as emendas ao texto. No documento, que não menciona a palavra mensalão, os petistas se dizem vítimas de uma "intensa campanha promovida pela oposição de direita e seus aliados na mídia, cujo objetivo explícito é criminalizar o PT".

Hipocrisia. A resolução que passou pelo crivo de Lula, na véspera, dá o tom da estratégia do PT para enfrentar os adversários nas 22 cidades onde o partido disputa o 2.º turno. A tática para o duelo ético é bater na tecla de que a democracia não aceita "dois pesos e duas medidas" e, portanto, o mensalão tucano tem de ser julgado com rigor.

"Não é a primeira nem será a última vez que os setores conservadores demonstram sua intolerância, sua falta de vocação democrática, sua hipocrisia, os dois pesos e medidas com que abordam temas como a liberdade de comunicação, o financiamento das campanhas eleitorais, o funcionamento do Judiciário, sua incapacidade de conviver com a organização independente da classe trabalhadora brasileira", diz o texto petista.

Na terça-feira, em reunião com candidatos do PT e prefeitos eleitos, Lula já havia classificado o julgamento do mensalão como "uma hipocrisia". Genoino propôs que o PT convocasse militantes e movimentos sindicais contra a "injustiça monumental" cometida pelo Supremo. Dirigentes do PT argumentaram, porém, que não seria conveniente tratar desse assunto na campanha eleitoral. Delúbio não foi à reunião, mas estava representado pela mulher, Mônica.

"Não sei mais se vai ter desagravo. Isso não é uma coisa pessoal. É política", afirmou o deputado Pedro Eugênio (PT-PE). O Estado apurou que a iniciativa passou a ser questionada por grupos do PT não alinhados à corrente majoritária Construindo um Novo Brasil, de Lula e Dirceu. "De qualquer forma, quem usar a desgraça dos outros para ganhar a eleição vai quebrar a cara", previu o líder do PT na Câmara, Jilmar Tatto (SP).

Fonte: O Estado de S. Paulo

Golpe contra a democracia - Merval Pereira


A democracia foi o centro da sessão de ontem do Supremo Tribunal Federal que formalizou a condenação do núcleo político do PT por corrupção ativa com resultados que não deixam dúvidas da decisão do plenário: apenas dois ministros absolveram o ex-ministro José Dirceu; só um absolveu o ex-presidente do PT José Genoino, e o ex-tesoureiro Delúbio Soares foi condenado por unanimidade.

No mesmo dia em que se conheciam as cartas em que Dirceu e Genoino não poupam elogios às suas próprias pessoas e se colocam como mártires de uma ação política que está sendo perseguida por uma elite reacionária, os ministros do STF puseram os pontos nos ii, demonstrando que o que está sendo condenado é uma tentativa de golpe contra a democracia brasileira.

Na definição do presidente do Supremo, Ayres Britto, "(...) sob a inspiração patrimonialista, um projeto de poder foi feito, não um projeto de governo, que é exposto em praça pública, mas um projeto de poder que vai além de um quadriênio quadruplicado. É um projeto que também é golpe no conteúdo da democracia, o republicanismo, que postula a renovação dos quadros de dirigentes e equiparação das armas com que se disputa a preferência dos votos".

Já Celso de Mello analisou que o ato de infidelidade ao eleitor estimulado por venalidade governamental, além de constituir "grave desvio ético-político e ultraje ao exercício legítimo do poder", acaba por gerar desequilíbrio de forças no Parlamento, tirando poder da oposição. Aqui, ele tocou em ponto crucial: a migração de políticos, à custa de pagamento com dinheiro público, da oposição para siglas da base, que cresceram às custas desses expedientes, enquanto a oposição minguava.

Hoje temos a menor oposição numérica desde a volta da democracia, apenas três partidos assumem esse papel: PSDB, DEM e PPS. Os demais estão na base governista ou aspiram estar nela, como o novíssimo PSD. O que começou com a compra de votos em dinheiro, denunciado o esquema que hoje está em julgamento, passou a se dar através da entrega de ministérios e cargos em órgãos públicos, numa montagem de coalizão tão ampla quanto heterogênea, que só o exercício do poder une.

O presidencialismo de coalizão esteve na raiz das análises dos dois últimos votos pela condenação do núcleo político petista. A compreensão de que é preciso fazer negociações políticas para organizar base partidária que permita a governabilidade foi explicitada pelos ministros, mas a "maneira argentária" com que elas foram comprovadamente feitas no início do primeiro governo Lula, organizada por Dirceu e Genoino, foi considerada por Celso de Mello "um atentado ao estado de direito".

Para ele, essa maneira "subverte o sentido das funções, traduz gesto de deslealdade, compromete o modelo de representação popular e frauda a vontade dos eleitores, gerando como efeito perverso a deformação da ética de governo".

Já para Ayres Britto, "com esse estilo de fazer política, excomungado pela lei brasileira, o resultado de cada eleição, naturalmente, seria alterado do ponto de vista ideológico".

Segundo Celso de Mello, "há políticos, governantes e legisladores que corrompem o poder do Estado, exercendo sobre ele ação moralmente deletéria, juridicamente criminosa e politicamente dissolvente". Ele lembrou a famosa frase de Lord Ackton, historiador, político e escritor inglês do século XIX, "O poder tende a corromper, e o poder absoluto corrompe absolutamente", para ressaltar "a falta de escrúpulos dos agentes perpetradores da falta criminosa, a ação criminosa por eles exercida, a arrogância por eles demonstrada e estimulada por um senso de impunidade e o comportamento desonesto no desempenho de suas atividades".

O decano concluiu sua análise sobre a compra de apoio político ressaltando "a perigosa situação a que o país está exposto, dirigido por dirigente capazes de perpetrar delitos difamantes".

Para Ayres Britto, "esse catastrófico modo interpartidário de fazer política", que ele definiu como a formação "pecuniarizada de alianças argentárias, um tipo de coalizão excomungado pela Constituição", leva a que o perfil ideológico que sai das urnas fique adulterado, ferindo a democracia.

Fonte: O Globo

O novo Brasil - Eliane Cantanhêde


Num mesmo dia, 10 de outubro de 2012, o Supremo Tribunal Federal condena o antes todo-poderoso chefe da Casa Civil de um dos governos mais populares do país e elege um ministro negro para presidi-lo pela primeira vez na história. Esse é o novo Brasil.

José Dirceu de Oliveira e Silva tem uma biografia exuberante.

O moço bonito de sotaque caipira que sai da cidadezinha mineira de Passa Quatro para liderar os estudantes do Brasil inteiro contra uma ditadura (e, de quebra, partir corações femininos de norte a sul).

O jovem líder que é preso, trocado por um embaixador sequestrado, treinado em Cuba e que muda o rosto e a identidade para voltar ao país e reconstruir a vida.

O clandestino que divide a cama, a mesa, as finanças e um filho com uma mulher por anos, sem lhe dizer quem é, de onde vem, para onde vai.

O político que ressurge das cinzas para retomar, vibrante, a vida política e criar o Partido dos Trabalhadores, embalar o mito Lula e garantir-lhe condições práticas de vitória -tapando o nariz, mergulhando no sistema, deixando-se levar alegremente pela correnteza política.

O braço direito do primeiro presidente "de esquerda", que instalou dentro do Planalto sua capacidade de mando, sua influência sobre o PT e a imensa experiência em manipular aparelhos. Antes, os militantes. Depois, os partidários. Por fim, os de governo. Estado e partido, os fins justificam os meios?

Cai José Dirceu, sobe Joaquim Barbosa, o negro, o filho de pedreiro, o homem que inebria o país com seu carisma e seus votos implacáveis no que se convencionou chamar de "julgamento do século". E que presidirá a mais alta corte brasileira.

Quis o destino, ops!, quis o processo político, social e econômico que o grande condenado, quando a lei passa a valer para todos, seja justamente quem tanto se empenhou para construir esse novo Brasil. O réu Dirceu é vítima do próprio Dirceu.

Fonte: Folha de S. Paulo

Falta lastro à bravata - Dora Kramer


A autocrítica não é da personalidade petista. Não que não existam defensores da utilidade do exame de consciência no partido: de memória cito Tarso Genro, José Eduardo Cardozo e Aloizio Mercadante.

Este último, ainda no início do primeiro governo Lula, recomendava uma revisão de procedimentos em relação às reformas do governo anterior que o PT tanto combateu e depois acolheu. Aconselhava que o partido reconhecesse o equívoco e explicasse à sociedade as razões da nova posição.

Na época, José Dirceu abordava o tema de outra forma: o novo governo simplesmente não devia satisfação a respeito. Disse isso quando perguntado em entrevista ao Estado se não era incoerente o PT atacar e depois defender a reforma da Previdência.

No quente do escândalo do mensalão, Genro e Cardozo reclamaram a necessidade de um urgente inventário. Os dois propuseram uma reflexão seguida de reformulação interna, inclusive com a edição de novo código de ética para balizar a conduta de filiados ao molde do que antigamente cantava a musa no partido.

Falaram sozinhos. Passado o susto, vencida a perplexidade inicial, construído o muro de arrimo na tese do caixa 2, o PT se escorou na força de Lula, na incerteza da sociedade de que princípios deveriam valer também para a política, e tocou o barco.

Sem a mesma aura, já com uma legião de decepcionados, mas com vigor suficiente para ganhar duas eleições presidenciais.

Agora ensaia de novo reação, não obstante as evidências prescrevam como mais prudente uma pausa para meditação, uma resolução dos passivos, a fim de não solapar o enorme capital que ainda lhe resta.

Pela simples razão de que as condições objetivas agora são desfavoráveis. Vejamos alguns exemplos.

A adversidade não resulta de luta política, mas de condenação judicial em instância suprema depois de cinco anos de processo, assegurado amplo direito de defesa.

O julgamento terá efeito em decisões judiciais daqui em diante, além de inibir ações baseadas na certeza absoluta da impunidade.

O uso do caixa 2, antes aceito como inevitável, depois de ter sido tratada pelo STF como prática criminosa não serve mais como desculpa.

Lula não fala mais da tribuna presidencial. Os aliados de hoje não têm a mesma referência de ontem e, amanhã, querem ver a fila do poder andar.

Enfim, o mar não está para peixe como já esteve.

José Dirceu exorta o partido a dobrar a aposta: concentrar-se na luta eleitoral e vencer em São Paulo. Ou seja, a lógica de sempre, o "vamos que vamos" que deu no que deu.

Tal visão menospreza a essência do que se passa: sim, o PT ganha a Prefeitura de São Paulo, mas de que isso serve para a reconstrução da confiabilidade do partido?

Vários políticos foram reeleitos depois de envolvidos em escândalos e, no entanto, voltaram sem o prestígio de antes. Muitos o perderam para sempre. Outros vêm perdendo gradativamente.

Dirceu terá dificuldade, para dizer o mínimo, de manter a influência no PT devido à contingência de precisar sair por algum tempo de circulação.

A despeito da presumível romaria de jornalistas que continuarão a procurá-lo para dar opinião, a cadeia, convenhamos, não é o espaço mais confortável para o exercício de liderança partidária.

José Dirceu pode até fazer barulho para tentar motivar a militância. Mas não pode fugir do fato de que é um homem vencido.

Desmentido. O Supremo não demorou dois meses para contrariar as expectativas de descrença na eficácia da Justiça.

Pesquisa do Datafolha de agosto indicava que 73% das pessoas achavam que os crimes deveriam resultar em castigo.

Apenas 11% acreditavam que os réus seriam punidos, 37% apostavam em condenações sem prisões e 43% cravaram a alternativa da absolvição.

Fonte: O Estado de s. Paulo

Ironia da história - Carlos Alberto Sardenberg


Vamos falar francamente: os jovens da esquerda revolucionária dos anos 60 e 70 nunca lutaram pela democracia. Não, pelo menos, por esta que temos hoje e que vem sendo aperfeiçoada desde 1985. Todos que participaram dos partidos, movimentos, vanguardas e alas daquela época sabem perfeitamente que se lutava pela derrubada do capitalismo e pela implantação aqui de um regime tipo cubano. E, se não quiserem ou não acreditar em depoimentos pessoais, basta consultar os documentos produzidos por aqueles grupos.

Poderão, então, verificar, que a única grande divergência entre eles estava no processo. Para alguns, a revolução comunista viria pela guerrilha a partir do campo, no modelo cubano. Para outros, o capitalismo seria derrubado pela classe operária urbana que se formava no Brasil em consequência do próprio desenvolvimento capitalista.

Derrubar o regime dos militares brasileiros não era uma finalidade em si. Aliás, alguns grupos achavam que a instauração de uma "democracia burguesa" seria contraproducente, pois criaria uma ilusão nas classes oprimidas. Estas poderiam se conformar com a busca "apenas" de salários, benefícios, casa própria, carro etc., em vez de lutarem pelo socialismo.

Pois foi exatamente o que aconteceu. E, por uma dessas ironias da história, sob a condução e a liderança de Lula! Uma vez perguntaram a Lula, preso no Dops de São Paulo: você é comunista? E ele: sou torneiro-mecânico.

Uma frase que diz muito. De fato, o ex-presidente jamais pertenceu à esquerda revolucionária. Juntou-se com parte dela, deixou correr o discurso, mas seu comportamento dominante sempre foi o de líder sindical em busca de melhores condições para os trabalhadores da indústria. Líder político nacional, ampliou seu objetivo para melhorar a vida de todas as camadas mais pobres, não com revolução, mas com crédito consignado, salário mínimo e bolsa família, bens de consumo e moradia, churrasco e viagens. Tudo pelas classes médias.

Mas por que estamos falando disso? Certamente, não é para uma cobrança tardia. É por causa do julgamento do mensalão, mais exatamente por causa das reações de José Dirceu, José Genoino e tantos outros membros do PT.

Os dois ex-dirigentes condenados deram notas escritas, cujo conteúdo tem dois pontos contraditórios. De um lado, tentam passar uma ilusão, a de que lutavam pela democracia desde os anos 60. De outro, desqualificam essa democracia ao dizer que a decisão do Supremo Tribunal Federal, poder central no regime democrático, foi um julgamento de exceção e de ódio ao PT, promovido por elites reacionárias que dominam a imprensa e a Justiça. Eis o velho discurso: a democracia é burguesa, uma farsa que só favorece os ricos.

Ao mesmo tempo, dizem que a vida do povo, dos mais pobres, melhorou e muito sob o governo do PT. Ora, em qual ambiente o PT cresceu, o presidente Lula ganhou e governou? Nesta nossa democracia que, entre outras coisas, levou a este extraordinário momento: Lula e Dilma indicaram os juízes do STF que condenaram Genoino e Dirceu.

O movimento estudantil dos anos 60 e 70 foi uma tragédia. Foram para a política os melhores rapazes e moças. E a política, por causa da ditadura local e da guerra fria global, e mais a ideologia esquerdista então dominante na intelectualidade e na academia, levou à luta armada. Tratava-se de um tremendo engano político. Como acreditar que uma guerrilha dentro da floresta amazônica poderia terminar com a tomada do poder em Brasília? Estava claro que a nova classe operária, como os trabalhadores da indústria automobilística, com seu líder Lula, sequer pensava em Cuba, mas sonhava com o padrão de vida dos colegas de Detroit. E os sindicalistas, com posições no governo.

E assim, jovens idealistas e com o sentimento de dever, perderam a vida, foram massacrados em torturas, banidos pelo mundo, famílias arrasadas. É um milagre que tantos deles tenham conseguido recolocar de pé a vida e estejam aí prestando serviços ao país.

Mas não serve para nada tentar esconder essa história. Em vez de tentar mudar o passado, melhor seria uma revisão, uma crítica serena, favorecida pelo tempo passado. Mesmo porque, sem essa crítica, ocorrem as recaídas que, estas sim, podem perturbar o ambiente político.

Felizmente, a democracia, modelo clássico, de Ulysses, Tancredo, Montoro, venceu, não sem uma ajuda dos jovens dos anos 60 e 70.

Fonte: O Globo

Muito além do mensalão - César Felício


É sintomático que José Dirceu evoque o Congresso de Ibiúna na primeira linha de seu manifesto na Internet após ser proscrito, aparentemente de maneira definitiva, do cenário político brasileiro. O ex-ministro torna-se mais interessante pelo seu passado do que pelo seu futuro e tende a merecer, cada vez mais, uma perspectiva histórica em sua análise.

No texto que divulgou em seu blog, Dirceu cita vários revezes de sua trajetória pública, como se repetisse as palavras de Churchill: na guerra só se morre uma vez, mas, na política, se morre muitas vezes. O ex-ministro não cita, entretanto, o período em que imprimiu de maneira definitiva a sua marca na história partidária do Brasil, algo que antecedeu e transcende o mensalão.

O sobrevivente de Ibiúna ganhou de maneira apertada a presidência do PT em meados da década de 90. Reduziu a influência que as bases tinham sob a cúpula do partido até então. Em um momento de declínio industrial do País, Dirceu tornou-se o grande operador do enquadramento, progressivo e inexorável, da burocracia sindical pela cúpula partidária. Foi a partir de sua presidência que ficou claro quem mandava em quem.

A partir de Dirceu, PT mudou sua lógica de poder

A correia de transmissão já estava instalada quando Dirceu começou a despachar na Esplanada dos Ministérios e a elite sindical ligada ao petismo começou a ocupar espaços na administração, dentro de uma lógica de comando político vertical.

Ao longo dos últimos anos, a relação entre o sindicalismo e o poder no Brasil foi ganhando características semelhantes as da Argentina, guardadas as enormes diferenças. Os dois países se aproximam pelos pactos que se estabeleceram. O caixa das entidades engorda, em troca de lastro para o grupo político que proporciona o aumento de recursos.

No Brasil, o poder público permitiu às lideranças sindicais ter influência sobre fundos estratégicos para a economia, como expôs de maneira inaugural o cientista político e ex-militante petista Francisco de Oliveira.

A Argentina tinha 4 milhões de trabalhadores filiados a sindicatos em 1955, ano de queda do peronismo, número igual ao estimado para a atualidade (como em muitos outros temas no País, não há cifras oficiais). A central sindical CGT chegou a ter entre seus integrantes um terço do Congresso e a ser convidada para participar de reuniões ministeriais.

Do ponto de vista político, havia muito de ilusão. Ser ministro ou deputado na época de Perón valia pouco e a exuberância do poder econômico da elite sindical jamais correspondeu a um poder político concreto. Mas uma simbiose começou a ser gestada.

Nenhum presidente argentino nos últimos cinco anos conseguiu se estabilizar no poder sem aliar-se ao meio sindical. A voragem consumiu democratas como Arturo Illia, Raúl Alfonsín e Fernando de la Rúa e ditadores como o dos regimes militares de 1955 e 1966. Mesmo o feroz regime militar de 1976 procurou estabelecer uma convivência.

Os dirigentes sindicais que tentaram se libertar da tutela de Perón ou dos militares foram calados à bala nos anos 70. Passaram a voar mais baixo do ponto de vista político, mas preservaram força no cotidiano econômico do país.

Na Argentina, quem tirou jornais de circulação nos últimos meses foram os sindicatos, que se fazem ouvir no momento de se definir trabalho e renda. Empresas do porte da mineradora Vale precisam negociar com as centrais a sua lista de contratações e o índice de salário médio real em dólar entre 2000 e 2010 subiu 70,3%. No Brasil, houve uma queda de 16,2% no mesmo período, de acordo com dados do Dieese, mas há um processo de recuperação iniciado em 2003.

Os fundos de pensão na Argentina estão estatizados desde 2008 e o poder econômico atual dos sindicatos nasce do sistema de saúde. Metade da população é atendida pelas "obras sociais", planos de saúde mantidos pelas entidades sindicais. É um caixa da ordem de US$ 10 bilhões ao ano, algo como 2,5% do PIB argentino, chancelado pelo Estado.

"O governo nunca cumpre as ameaças de avançar sobre esta fonte de recursos e os sindicatos jamais fazem uma confrontação do ponto de vista político", explica o cientista político Marcos Novaro, da Universidade de Buenos Aires. A lei das obras sociais foi criada em uma ditadura militar, a de Juan Carlos Onganía, e mantida na seguinte, a que se notabilizou por desaparecer com 8 mil pessoas.

"Claramente se procurou estabelecer um pacto com líderes sindicais que na Argentina não se caracterizam por serem leitores de Marx e Engels", disse um estudioso do setor, Santiago Senen.

O sindicato na Argentina ganha peso na negociação econômica ao se organizar por ramo de atividade e fechar acordos com base nacional. "Tudo o que está sobre quatro rodas me pertence", disse uma vez o secretário da CGT, o líder caminhoneiro Hugo Moyano, que representa do transporte de cargas ao de valores, passando pelo de resíduos e de entregas.

É possível, em uma reunião com dez "gordos", como costumam ser chamados os caciques sindicais da Argentina, parar o país. A operação é mais complexa no Brasil, em que a base de 17 milhões de trabalhadores sindicalizados está dividida em 7,4 mil sindicatos.
O que não é possível na Argentina é que um deles se eleja presidente da República. "O meio sindical na Argentina se estruturou por meio da subordinação", comenta Novaro. Cabe perguntar se no formato político atual do Brasil há espaço para um novo Lula.

Fora do PT, o pífio resultado eleitoral obtido nos últimos anos por lideranças como Luiz Medeiros e Paulo Pereira da Silva fala por si. Dentro do partido, sempre será possível lembrar exemplos como o de Luiz Marinho, mas desde os anos 90 a recrutamento dentro do partido se dá por outros meios. Na eleição para prefeito de capitais de agora, o único candidato com alguma ligação com o sindicalismo é o baiano Nelson Pelegrino, advogado trabalhista em sua origem.

Fonte: Valor Econômico

Mais do mesmo -Tereza Cruvinel


As condenações de José Dirceu, José Genoino e outros por corrupção ativa, pelo Supremo Tribunal Federal, já eram atos inexoráveis, pela evolução do julgamento. Não surpreenderam, mas contentaram as torcidas. Eles poderão, ainda, ser condenados por formação de quadrilha e, pelos discursos dos ministros, infere-se que isso ocorrerá. Receberão, daqui a alguns dias, na fase da dosimetria, penas elevadas, que terão de ser pelo menos parcialmente cumpridas em regime fechado. Certamente eles serão algemados e presos, produzindo fotografias que farão a dor de uns e a delícia de outros. E o que esperar, tanto agora, no plano imediato, como no devir da política brasileira, deste fato tão excepcional?

Não se viu ontem, na reunião do diretório nacional do PT, disposição dos condenados e do partido para uma reação imediata mais vigorosa. Talvez os advogados não achem isso recomendável agora, antes da fase da dosimetria, para não piorar ainda mais a situação. Mas, mesmo assim, as condenações e a sequência do julgamento influenciarão o segundo turno eleitoral, agregando mais radicalização à campanha. Como Serra e outros adversários vão explorar ao máximo as condenações dos petistas, a reação virá, tanto de candidatos como de dirigentes e militantes. Será um tempo quente mas curto, pois teremos o menor intervalo entre o primeiro e o segundo turno de todos os tempos pós-Constituinte.

Para o médio e longo prazo haverá consequên-cias de ordem propriamente política. Se as urnas já reforçaram a polarização do eleitorado brasileiro entre PT e PSDB, depois das condenações por um tribunal que o partido julga estar agindo politicamente e excepcionalmente, o antagonismo tenderá a se aprofundar.

O PT cobrará, para começar, o julgamento do mensalão mineiro, supostamente montado pelo PSDB, e o STF talvez resolva dar alguma satisfação à opinião pública fazendo isso. Embora, neste caso, o tribunal tenha aceitado o desmembramento da ação, ao contrário do que fez na ação que atinge o PT. 

Com isso, todos os réus do chamado mensalão mineiro serão julgados em Minas, pela primeira instância. Pelo STF, só o serão os senadores Clesio Andrade e Eduardo Azeredo, pelo direito que têm ao foro privilegiado. O Ministério Público e a Polícia Federal, sabemos todos, são instituições rachadas entre uma ala pró-PT e uma ala pró-PSDB. Suas máquinas vão entrar em ação para produzir novas denúncias. Enfim, o Fla-Flu vai continuar, com tudo que isso tem de regressivo para a política nacional. A emergência de duas siglas no primeiro turno, o PSB, pela esquerda, e o PSD, pela direita, são fatos promissores, que podem ajudar a quebrar a bipolaridade PT-PSDB.

O Supremo, como disse no início do julgamento o ministro Marco Aurélio, "está passando por uma virada" e colhe aplausos por isso. Ministros votam completamente diferente de como votaram no passado. Em relação a Collor, por exemplo, que absolveram por falta de provas, desprezando as da CPI, que agora tiveram valor. Recentemente, o ministro Joaquim Barbosa declarou que "o Supremo não tem que dar satisfação a ninguém". Institucionalmente, não tem mesmo. Suas sentenças são irrecorríveis. Quem nomeou os ministros nada lhes pode cobrar. Vem depois o registro da História, uma senhora que sempre chega anos depois dos fatos.

Queixas de Dilma

No encontro que tiveram ontem, o ex-presidente Lula e sua sucessora, Dilma Rousseff, tratariam do segundo turno. Certamente, da participação dela, que foi modestíssima no primeiro turno.
Ainda que a conversa tenha ficado só nisso, está começando a tomar forma, dentro do PT, uma insatisfação com o que chamam de "egoísmo da Dilma". No primeiro turno, ela foi apenas a São Paulo, a pedido de Lula, e a Belo Horizonte, onde a candidatura petista foi articulada por ela mesmo. E, ao longo do julgamento do chamado mensalão, acham os petistas que ela esteve mais preocupada em se blindar. Dilma, na verdade, não poderia fazer nada e até chegou a corrigir o relator Barbosa por uma citação descontextualizada de seu depoimento sobre o tema. Mas esse é o ambiente no PT. E como Dilma vai precisar do partido e dos aliados se quiser se eleger, terá que começar a fazer afagos e buscar recomposições.

Aí está o PR do ex-ministro Alfredo Nascimento, que não apenas negou apoio à candidata Vanessa Grazziotin (PCdoB) em Manaus contra o tucano Arthur Virgílio, como proclama, sempre que pode, ter sido "maltratado" pela presidente.

Recurso externo

Se houver recurso do PT a cortes internacionais contra as condenações de Dirceu e Genoino, não será à OEA, e sim à Corte Interamericana de Direitos Humanos. Embora o pronunciamento da Corte, condenando os métodos do julgamento, não tenha qualquer valor jurídico, dada a soberania nacional, como lembrou o ministro Joaquim Barbosa, produziria constrangimento político no plano externo. O voto do relator Lewandowski seria uma peça do recurso, com as seguidas cobranças a seus pares de provas, e não deduções para condenar Dirceu e Genoino.

Serventia

O julgamento do chamado mensalão mineiro teria uma utilidade. Não para empatar o jogo, colocando tucanos no banco dos réus, mas para deixar bem claro como são financiadas as atividades políticas no Brasil (que entram pela entressafra, ao contrário do que pensa o ministro Ayres Britto). E, quem sabe, com isso, fazer o Congresso tomar tino e aprovar a reforma política.

Fonte: Correio Braziliense