Contratada
por R$ 4,65 milhões para fornecer alimentos a iniciativas do Programa Segundo
Tempo, do Ministério do Esporte, entre 2009 e 2010, a JJ Logística Empresarial
Ltda. foi usada para desviar quase 90% desse valor, diz o dono da empresa, João
Batista Vieira Machado. O empresário disse ao repórter Alfredo Junqueira que
sua empresa fazia parte de esquema de fraudes que abasteceu políticos em
Brasília, Santa Catarina e Rio. A empresa, segundo ele, foi subcontratada pelo
Instituto Contato, dirigido por integrantes do PC do B de Santa Catarina e que
manteve dois convênios com o ministério. Documentação, à qual o Estado teve
acesso, mostra que a JJ Logística pagou contas de condomínio, faturas de lojas
de material de construção e de tinta. O Ministério do Esporte vai apurar as
denúncias
Empresário diz que ONG desviou 90% de
contrato do Ministério do Esporte
Subcontratado por
entidade ligada ao PC do B, João Batista Machado afirma que dinheiro que
serviria para pagar alimentação de crianças Foi parar nas mãos de políticos
O dono de uma empresa
subcontratada para fornecer alimentos a crianças atendidas por um programa de
esportes do governo federal diz que cerca de 90% dos R$ 4,65 milhões que
recebeu dos cofres públicos entre 2009 e 2010 foram desviados para políticos de
Brasília, Santa Catarina e Rio.
"Era tudo roubo.
Vi maços de dinheiro serem distribuídos", afirma o dono da JJ Logística
Empresarial Ltda., João Batista Vieira Machado, em entrevista exclusiva ao
Estado.
Machado diz que foi
usado em um esquema montado para fraudar o Segundo Tempo, programa do
Ministério do Esporte que atende crianças em atividades físicas em horário
extraescolar.
A microempresa
sediada no município de Tanguá, na região metropolitana do Rio, foi
subcontratada pelo Instituto Contato, entidade sem fins lucrativos dirigida por
integrantes do PC do B de Santa Catarina que mantinha dois convênios com o
Ministério do Esporte. Machado tinha de fornecer lanches para as crianças.
O dono da JJ
Logística, porém, afirmou ao Estado ter fornecido alimentos cujo valor atingiu
apenas R$ 498 mil. Os outros R$ 4,15 milhões saídos dos cofres públicos
federais que teriam de ser usados para o fornecimento de lanches para as
crianças acabaram desviados "para fins políticos", segundo as
palavras de Machado.
Irregularidades no
Programa Segundo Tempo já custaram o cargo do então ministro do Esporte Orlando
Silva, demitido pela presidente Dilma Rousseff em outubro do ano passado - a
pasta hoje é comandada por Aldo Rebelo, também do PC do B. No último dia 7 de
outubro, Orlando não conseguiu se eleger para o cargo de vereador de São Paulo.
O dono da JJ
Logística aponta como responsáveis pelos desvios a ONG catarinense que a
subcontratou e o empresário José Renato Fernandez Rocha, o Zeca, ex-assessor
parlamentar do deputado federal Dr. Paulo Cesar (PSD-RJ).
"O dinheiro
vinha do Ministério do Esporte para a ONG de Santa Catarina, que passava para
cá. Daqui sacava o dinheiro e mandava de volta para Brasília e Santa Catarina.
Retornava o dinheiro todo", afirma o empresário. "O José Renato
(Fernandez Rocha) sacava o dinheiro, colocava numa sacola e levava tudo embora
para Brasília e Santa Catarina", diz o dono da JJ Logística, que alega não
saber exatamente para quais políticos o dinheiro era encaminhado.
Um terceiro
personagem, identificado pelo denunciante como Wellington Monteiro, era o
articulador entre as pontas do esquema no Rio, Brasília e Santa Catarina.
Mentira anterior
Em fevereiro de 2011,
o Estado revelou as primeiras irregularidades envolvendo o Instituto Contato.
Além de problemas formais e de prazo na execução dos projetos, a reportagem
mostrou que a entidade promovia aulas de tênis na rua e com raquetes de
plástico e fornecia suco fora do prazo de validade. Procurado na época, Machado
confirmou que fornecia lanches para a ONG catarinense, mas citou os desvios.
"Fui orientado pelo José Renato a mentir naquela ocasião", diz
Machado.
O dono da JJ
Logística afirma ter sido "laranja" do esquema. Ele diz que se
apresentará amanhã à Polícia Federal para prestar depoimento. Machado também
promete levar documentos para as autoridades: notas fiscais, contrato social e
alterações e cópias de cheques emitidos.
A documentação, a
qual o Estado teve acesso, mostra que a JJ Logística pagou no período em que
recebia repasses do Programa Segundo Tempo contas de condomínio em Cabo Frio,
na Região dos Lagos do Rio, faturas de lojas de material de construção,
oficinas mecânicas e lojas de tinta. Todos os cheques são assinados por
Fernandez Rocha, que também usou as folhas para sacar quase R$ 2 milhões.
O contrato social mostra
que foi Fernandez Rocha quem fundou a JJ Logística em abril de 2005. Mesmo
depois que a transferiu para João Machado em fevereiro de 2008, continuou
assinando os cheques da companhia. Além de atuar na JJ Logística, Fernandez
Rocha também é sócio da MLH Comercial Ltda. A empresa recebeu R$ 1,35 milhão da
ONG ligada ao PC do B.
Machado diz ter
decidido denunciar o esquema por ter sido enganado por Fernandez Rocha.
"Éramos amigos, mas quero botar eles na cadeia. Peguei empréstimos de R$
280 mil e agora me viraram as costas", diz o empresário. "O Segundo
Tempo é complicado. É por isso que decidi falar. Para me livrar ou para me
enterrar mais. Porque depois que você entra numa dessas, você fica vulnerável
com esses caboclos e pode tomar um tiro a qualquer momento."
Empresa também deu
recibo para gastos de deputado
As fraudes com a JJ
Logística Empresarial não se limitaram ao Programa Segundo Tempo, segundo João
Batista Machado. O deputado Dr. Paulo Cesar (PSD-RJ) usou notas e recibos da
empresa para justificar gastos com verba de gabinete e despesas em sua campanha
eleitoral de 2010, no total de R$ 52,5 mil. De acordo com o empresário, no
entanto, nenhum serviço foi prestado ao parlamentar. “Tudo nota fria”, disse
Machado. “O doutor ( Paulo Cesar) pegou as notas com a empresa quando ele foi
candidato. E em Brasília também. É tudo nota fria. O doutor pecou nisso aí”,
afirmou. Na prestação de contas da campanha de Dr. Paulo Cesar, a JJ Logística
consta como fornecedora de imóvel para locação. Um cheque no valor de R$ 20 mil
teria remunerado a empresa, segundo informações dadas pelo parlamentar – eleito
pelo PR – à Justiça Eleitoral. O deputado também usou três recibos da JJ
Logística para justificar o uso de R$ 32,5 mil de sua cota parlamentar. Neste
caso, a justificativa foi a “divulgação da atividade parlamentar”. O deputado
garantiu que os serviços foram prestados. “Eu tenho as notas e recebi o
serviço”, disse o parlamentar. Ele afirmou que entrou em contato com a JJ
Logística por intermédio de seu então assessor José Renato Fernandez Rocha.
Sobre o fato de ter enviado o assessor com passagens pagas pela Câmara quatro
vezes a Santa Catarina, sede do Instituto Contato, o deputado argumentou que
costuma mandar seus auxiliares a outros Estados para ajudá-lo na elaboração e
relatoria de projetos de lei. “Às vezes eu não posso ouvir os diversos
segmentos interessados no projeto.” Paulo Cesar não soube dizer em que projeto
Fernandez Rocha o auxiliou indo quatro vezes a Santa Catarina./ A.J.
Fonte: O Estado de S.
Paulo