terça-feira, 26 de fevereiro de 2013

Entre propaganda e crítica - Eliane Cantanhêde

Qual a diferença decisiva entre o vencedor "Argo" e o derrotado "Lincoln", que concorreu a 12 prêmios do Oscar e só levou dois?

"Argo" tem todos os componentes hollywoodianos da alma norte-americana: um herói bonitão e corajoso, o "bem" contra o "mal", uma trama de conteúdo épico e o velho oba-oba de como eles são mais justos e mais espertos do que todo mundo.

"Lincoln", ao contrário, é mais realista, menos ufanista. A emenda que aboliu a escravatura foi aprovada por um triz, por dois votos, e graças aos truques sujos de ontem, hoje e sempre: chantagens, ameaças, compra de votos. Os republicanos eram a favor; os democratas, contra.

Não foi por acaso que Michelle Obama foi escolhida e aceitou estrelar o grande momento: "E o Oscar vai para...". Democrata, chique e mulher do primeiro presidente negro do país, estava perfeita no papel ao anunciar o propagandístico "Argo". Já se fosse o crítico "Lincoln"...

E não é sem razão que o Irã reclama do resultado. Quanto mais espertos são os americanos em "Argo", mais os iranianos parecem idiotas, como jogadores que deixam a bola passar entre as pernas. O regime tem culpa no cartório, mas estou doida para ver a versão -ou réplica- deles.

No mais, não é preciso ser nenhum gênio em cinema para aplaudir a estatueta de melhor ator para Daniel Day-Lewis, mas é preciso se render à psicologia de Hollywood e do próprio país para entender como Jennifer Lawrence bate Emmanuelle Riva como melhor atriz.

Jennifer é talentosa, jovem e bonita, mas, convenhamos, sua adversária era imbatível. Hollywood, conservadora até na solenidade de premiação -todo ano antecedida de promessas de renovação e sempre mais do mesmo-, vive de sangue fresco. Riva é uma velha francesa. Lawrence, a cara nova dos EUA para o mundo.

Modestamente, pois conheço um pouquinho de política, mas cinema não é minha praia, preferia "Lincoln" e Riva. Se o critério fosse justiça.

Fonte: Folha de S. Paulo

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