domingo, 10 de fevereiro de 2013

Inflação é o desafio de 2013

Para especialista, o aumento dos preços é o vilão da economia e deverá levar o IPCA a 6,8%, em julho, percentual acima da meta do governo

Deco Bancillon

"Para que o Brasil cresça, é preciso controlar a inflação e aceitar, momentaneamente, um aumento (do PIB) mais baixo. Esse é o grande desafio em 2013. Um sacrifício maior a curto prazo para obter um ganho maior a médio prazo"

SÃO PAULO – Em um ano em que até os mais pessimistas preveem a retomada mais forte do crescimento econômico, há uma voz dissonante no mercado financeiro. "Para que o país cresça de forma sustentável, por mais tempo, é preciso, primeiro, controlar a inflação e aceitar, momentaneamente, um crescimento (do Produto Interno Bruto, o PIB) mais baixo. Esse é o grande desafio em 2013", diz Carlos Thadeu Filho, economista sênior para o Brasil da gestora de fundos norte-americana Franklin Templeton Investments. Especialista em preços ao consumidor e juros, Thadeu avalia que o quadro econômico brasileiro suscita mais preocupação do que otimismo, e faz um alerta: "Hoje, a inflação é a grande vilã no Brasil". Nos prognósticos dele, o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) deverá atingir a máxima de 6,8% "ao longo de junho e julho", e encerrar o ano em 6,2%. Essa alta deverá exigir uma ação mais firme do Banco Central (BC), que poderá subir juros em 2013. "O custo de deixar para fazer o ajuste lá na frente será muito maior. Esse é o dilema que o BC vive hoje. Fazer (o ajuste) agora, de modo mais eficiente, ou fazer lá na frente, de maneira mais drástica", pondera. Confira, a seguir, trechos da entrevista concedida ao Correio.

"Com o mundo tranquilo, estável, acredito que o governo não vai criar empecilho para que o real se valorize e o dólar caia. Um dólar mais barato será útil para reduzir o impacto de um aperto monetário, caso venha a ser feito. Então, acredito que o dólar pode ficar abaixo de R$ 2 ao longo do ano"

O que deu errado em 2012?

Foi um ano em que a economia cresceu muito pouco e a inflação ficou próxima de 6%. Houve uma conjunção de fatores para que isso ocorresse. Primeiro, uma redução de ritmo de endividamento dos consumidores. Segundo, uma retração muito forte da indústria. E, terceiro, uma incerteza maior em relação a investimentos, que foi o fator principal a puxar o PIB para baixo. Houve também muita dúvida em relação à crise externa, que só foi se dissipar no fim do ano.

Há uma sensação de que as medidas tomadas pelo governo para mudar esse quadro não foram eficazes. Essa também é a sua avaliação?

Em relação a algumas coisas, não há muito o que fazer. Uma alavancagem muito forte da dívida dos consumidores, por exemplo, costuma ser seguida por uma redução de consumo. É algo endógeno. O que pegou, mesmo, foi a redução na margem de consumo e a queda forte dos investimentos.

Mas o BNDES tem várias linhas de crédito com juros negativos. Por que o empresário não investe?

Por causa das dúvidas em relação ao cenário externo e ao mercado de trabalho, no qual a mão de obra já não está mais tão disponível. Além disso, há outras incertezas sobre regras tributárias, que mudaram bastante em 2012, bem como em relação ao dólar, à energia. Todo o ambiente de investimentos ficou mais incerto no ano passado.

Mas isso é por conta da política intervencionista do governo?

Eu não gosto de usar esse termo. Mas houve muita mudança de regras e isso pode, sim, ter colaborado para a retração do investimento interno.

E a inflação, como fica nesse cenário?

É um dos grandes vilões. Nós esperamos um IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo) de 6,20%. Ao longo de junho ou julho, ele deve alcançar um valor bem acima da meta do governo (de até 6,5%), podendo ser de 6,60% ou 6,80%. Depois, pode recuar para esses 6,20%, que ainda é um número muito alto.

Mas a previsão do Banco Central é bem menor. O BC está enxergando algo que o mercado ainda não vê?

Acho difícil. Acredito que as próximas revisões do BC (para a inflação) vão ser para cima.

Existe algum espaço para um corte adicional de juros destinado a estimular a atividade?


Não. É uma chance remota, a não ser que haja uma crise ou uma reversão do quadro externo muito abrupta. Eu acho que há uma possibilidade bastante alta de os juros subirem este ano.

Ainda há espaço para o governo usar o dólar para estimular a economia?

Com o mundo tranquilo, estável, acredito que o governo não vai criar empecilho para que o real se valorize e o dólar caia. Um dólar mais barato será útil para reduzir o impacto de um aperto monetário, caso venha a ser feito. Então, acredito que o dólar pode ficar abaixo de R$ 2 ao longo do ano.

As manobras feitas na política fiscal no fim do ano, para aumentar o superavit primário, podem ter criado uma insegurança adicional, a ponto de desestimular investimentos produtivos?

A questão fiscal nem é o que causa mais ruído no mercado. O maior problema é manter uma política expansionista num momento em que deveria haver contração monetária. O governo deveria reduzir a demanda interna a fim de controlar a inflação.
Dentro do governo já se discute fazer um esforço fiscal menor para ajudar a economia.
Não acredito que seja a melhor opção. Menos esforço fiscal em um ambiente de inflação alta não vai ajudar o país a crescer mais.

Qual é o grande desafio para 2013?

Para que o Brasil cresça por mais tempo, é preciso, primeiro, controlar a inflação e aceitar, momentaneamente, um aumento (do PIB) mais baixo. Esse é o grande desafio em 2013. Um sacrifício maior a curto prazo para obter um ganho maior a médio prazo.

Qual a expectativa da consultoria para o crescimento da economia brasileira neste ano?
Entre 2,5% e 3,5%.

Como equacionar o baixo nível de produtividade e o alto custo da mão de obra?

Os Estados Unidos têm aumentado muito a produtividade e reduzido o custo da mão de obra. Então, a medida do trabalho em relação ao produto tem caído bastante. No Brasil é o contrário. Aqui, a participação da mão de obra sobre o produto está aumentando, enquanto a do capital está caindo. Esse viés de mais trabalho sobre capital tem efeito de reduzir o PIB potencial. Ou seja, qualquer crescimento nosso, a curto prazo, é mais inflacionário do que era no passado.

Na sua visão, qual é a taxa de crescimento sustentável do Brasil sem gerar distorções?
É difícil avaliar. Mesmo aqui dentro (da Franklin Templeton) há divergências com relação a isso. Nossos cálculos vão de 2,7% a 3,5%. Eu acho que seria um pouco abaixo de 3%.

O fato de a produtividade não acompanhar os ganhos da massa salarial não se deve à baixa qualificação dos trabalhadores?

Acho que não. A questão é mais de incerteza quanto à atividade e ao risco de demitir e não encontrar mão de obra qualificada. O custo de demitir é alto e a chance de encontrar trabalhadores qualificados é baixa. Por isso, a indústria prefere reter pessoal, apostando que a atividade voltará a aumentar. Mas, se se isso não acontecer em 2013, o desemprego começará a crescer.

O BC está demorando a dar a resposta certa para combater a inflação?

Esperamos uma sinalização mais firme daqui em diante, o que já se justifica, tendo em vista o comportamento dos preços. É preciso lembrar que 75% dos produtos e serviços pesquisados pelo IBGE estão em alta, ou seja, a inflação está disseminada.

Existe espaço para usar outros instrumentos, além de aumento de juros?

O real problema da inflação é que a demanda está crescendo mais do que a oferta. Agora, qualquer coisa que se faça ajudará a conter os preços. O mais importante é mostrar intolerância maior em relação à inflação a curto e a médio prazos.

Uma sinalização mais forte do BC, então, já ajudaria a conter as expectativas?

Tão importante quanto subir juros é o Banco Central deixar claro que vai fazer de tudo para reduzir a inflação a curto e a médio prazos. O custo de deixar para fazer o ajuste lá na frente será muito maior. Esse é o dilema que o BC vive hoje: fazer (o ajuste) agora, de modo mais eficiente, ou fazer lá na frente, de maneira mais drástica.

Fonte: Correio Braziliense

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