terça-feira, 19 de fevereiro de 2013

Privatização com data marcada: Governo desafia sindicatos e avança na reforma de portos

Ainda no primeiro semestre, áreas nos terminais de Belém e Santos serão licitadas.

Previsão é que o setor receba 54 bilhões em investimentos para garantir mais exportações.

Mesmo diante de ameaças de greve e da ocupação de um navio chinês em Santos (SP) por sindicalistas ligados à Força Sindical, o governo federal deixou claro que insistirá na aprovação da medida provisória (19 MP) 595 — que altera as regras para os portos e amplia a participação da iniciativa privada. Além disso, promete licitar áreas nos terminais de Belém e Santos neste primeiro semestre, num passo decisivo para modernizar o setor e aumentar o comércio exterior, a ministra da Casa Civil, Gleisi Hoffmann, reuniu-se com representantes de empresas que defendem a liberação dos portos.

Pressão no porto

Para aprovar MP, governo quer licitar 10 terminais este semestre. Sindicalistas ocupam navio

Danilo Fariello, Lino Rodrigues

BRASÍLIA e SÃO PAULO - Em meio a ameaças de greves e uma ocupação de navio estrangeiro em Santos (SP) por trabalhadores, o governo resolveu reforçar o discurso em defesa da aprovação da medida provisória (MP) 595 - que altera regras do setor de portos, ampliando a participação da iniciativa privada - e indicou ontem a possibilidade de fazer licitações de pelo menos dez arrendamentos, em valor de R$ 730 milhões, já neste semestre, em Belém (PA) e Santos (SP).

Depois de receber representantes dos portuários contrários à essência da MP na semana passada, a ministra da Casa Civil, Gleisi Hoffmann, reuniu-se ontem com representantes de empresas que defendem a liberalização dos portos para estimular o comércio exterior. Eles se manifestaram a favor do pacote do governo, que prevê investimentos de R$ 54,2 bilhões nos portos brasileiros, basicamente privados.

Os empresários defenderam a liberalização da MP para que novos portos sejam construídos pela iniciativa privada, sem a necessidade de que seus empreendedores transportem cargas próprias nos terminais. Para os trabalhadores, a brecha para a expansão de novos portos poderia enfraquecer os atuais portos públicos, onde eles entendem ter mais direitos trabalhistas. Os empresários ontem refutaram a tese dos representantes dos trabalhadores.

Governo quer evitar novo "código florestal"

Para Paulo Godoy, presidente da Associação Brasileira das Indústrias de Base (Abdib), os investimentos do pacote de portos vão, invariavelmente, resultar em mais postos de trabalho. Enfática, a senadora Kátia Abreu (PSD-TO), presidente da Confederação Nacional da Agricultura (CNA), declarou que as pessoas que têm se manifestado contra a MP 595 podem vir a prejudicar o Brasil ao sair em defesa das deficiências no setor:

- Ficar como está hoje é fazer reserva de mercado para esses portos públicos, porque eles continuarão sem ter com quem concorrer. Eficiência não ocorre sem concorrência.

A senadora observou, ainda, que a MP não altera o regime trabalhista dos portos. Na semana passada, a Casa Civil decidiu abrir para a imprensa a reunião com representantes trabalhistas na tentativa de mostrar a fraqueza de seus argumentos. Ontem, porém, a reunião com empresários foi fechada.

- É uma greve que ninguém entendeu ainda o porquê - disse a senadora ao GLOBO.

O ministro da Secretaria dos Portos, Leônidas Cristino, disse ontem após a reunião que uma eventual greve dos portuários "não é razoável". Para ele, a melhor saída é o diálogo. Cristino indicou que os portos prioritários na lista dos terminais a serem licitados ainda este semestre são três em Belém e sete em Santos. Seriam os primeiros arrendamentos dos 159 já identificados como passíveis de serem licitados pela secretaria, dos quais 42 são novos.

Participaram também da reunião na Casa Civil representantes das confederações de indústria, comércio e transportes, além da associação que representa os petroquímicos. Todos teriam sido a favor da aprovação da essência do texto e colocaram-se à disposição para defender a MP no Congresso. Ainda nesta semana, Cristino deverá receber novamente os representantes dos trabalhadores.

O governo entende que os trabalhadores têm sido usados por empresários que terão de ser mais competitivos com a nova lei. A convocação do apoio dos principais setores exportadores ontem teve como objetivo apressar a tramitação da MP 595. O governo teme que as polêmicas em torno da MP dos Portos possam levar a uma derrota no Congresso, como ocorreu com o Código Florestal, no passado, quando o governo perdeu em temas que considerava cruciais.

Em parte como um protesto contra a MP dos Portos, um grupo de cerca de 50 trabalhadores e sindicalistas portuários invadiu na madrugada de ontem o navio chinês "Zhen Hua 10". A embarcação está atracada no Porto de Santos desde sexta-feira e transportava equipamentos para serem utilizados na operação do novo terminal da Empresa Brasileira de Terminais Portuários (Embraport). Até as 20h, o navio permanecia ocupado e a previsão era que os sindicalistas passariam a noite lá. Em uma reunião, sindicalistas e representantes da empresa tentavam chegar a um acordo para o impasse, que já durava mais de 16 horas. O outro alvo do protesto era o uso de mão de obra chinesa no desembarque dos equipamentos.

A Embraport, controlada pelo Odebrecht, trader Coimex e pela DP World, dos Emirados Árabes, chegou a divulgar nota, no início da tarde, solicitando aos trabalhadores que permitissem o reinício do desembarque dos equipamentos. Já os sindicalistas queriam que o trabalho fosse realizado por mão de obra brasileira, não pelos chineses do navio. No comunicado, a empresa alegava que "o desembarque e a montagem dos equipamentos são realizados pelo fabricante, como usual em todos os portos".

- Queremos que eles (a Embraport) contratem mão de obra brasileira. Para nós, todos esses chineses estão irregulares no Brasil - disse o deputado Paulo Pereira da Silva (PDT), presidente da Força Sindical, lembrando que a empresa fez acordo com o Sindicato dos Estivadores de Santos e região, pelo qual se compromete a utilizar apenas mão de obra brasileira.

Paralisação em 18 de março

Com relação à MP 595, os portuários também são contra, entre outras disposições da lei, o fim da exigência de contratação de trabalhadores avulsos (sem vínculo com empresas) por meio do Órgão Gestor de Mão de Obra (Ogmo), entidade que controla a escala de operários para trabalhar no porto.

Para a sexta-feira, já está marcada uma paralisação de seis horas no Porto de Santos e, hoje, uma plenária nacional dos sindicatos dos portuários vai definir as datas para o movimento que deverá paralisar todos os portos do país a partir de 18 de março, como forma de protesto à MP, que, segundo os trabalhadores, fragiliza as relações trabalhistas.

Fonte: O Globo

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