quinta-feira, 16 de maio de 2013

Ecos da batalha - Tereza Cruvinel

Num parlamento mais racional, apesar de complexa e polêmica, uma medida como a dos portos seria aprovada em tempo bem menor, com menos ruído e índices de civilidade mais elevados

A insana votação da MP dos Portos pela Câmara entrou de novo noite adentro ontem, aumentando as evidências reveladas ao longo da batalha sobre o estado da coalizão governista. Quando todos os destaques tiverem sido votados, será possível mapear mais detalhadamente o que se passou, mas, de antemão, ficou evidente que, sem o PMDB, a chamada base não garante maioria ao governo. Os números falam. O Planalto conseguiu transpor o cipoal de obstruções armado pela oposição e aprovar o texto básico, mas quando o líder peemedebista Eduardo Cunha arrastou sua bancada para o voto contrário, o governo recolheu apenas 210 votos. A maioria dos presentes garante vitórias pontuais mas o que assegura a estabilidade a um governo é a maioria absoluta de 257 votos.

Se o objetivo de Eduardo Cunha e seus liderados era fazer valer aos olhos do governo a importância do PMDB, o objetivo foi alcançado. Mas a principal sequela dessa batalha será no relacionamento entre o PMDB e o Planalto. Os sinais foram contraditórios: Henrique Eduardo Alves, presidente da Câmara, contentou a presidente Dilma com seu indiscutível empenho em garantir e concluir a votação. Renan Calheiros manteve o Senado de plantão por duas noites seguidas, tentando assegurar a leitura da medida, que perde a validade hoje se não for votada, tão logo terminasse a votação na Câmara. O vice-presidente Michel Temer fez uso intensivo de sua capacidade de negociação. O ministro da Agricultura, Antônio Andrade, foi ao plenário cabalar votos e ouvir deputados. Tudo isso o Planalto registrou. Já Eduardo Cunha deve sair do processo como a ovelha negra do partido.

Cordato ele não é, mas passou a obstruir a votação, com os partidos de oposição, quando o governo derrotou emendas que ele havia aglutinado em uma só proposta. Concordou com o desmembramento sob a promessa de algumas seriam aprovadas, mas depois o vagalhão governista o derrotou. Quando esse processo terminar, veremos como o governo e o partido vão se comportar. Ele mesmo recomendava ontem o esfriamento dos ânimos: “Não se cura fratura com a perna inchada”.

Vale registrar ainda o comportamento do PSD de Gilberto Kassab, que parece ter sido o mais leal da base, depois do PT. Ou melhor, empataram. Já o PSB do governador Eduardo Campos não fugiu à cultura da dissimulação que acompanha neste momento os socialistas. O líder quase sempre acompanhou a orientação do governo, mas a bancada fez o que quis nas diferentes votações: obstruções, votos contra, abstenções. O PP também já foi mais leal em outras horas difíceis.

A batalha está em curso e o governo ainda não pode cantar vitória. O mapa desta que está sendo a mais dura disputa parlamentar de Dilma será de grande utilidade. Com ele nas mãos, o Planalto poderá saber exatamente com quem conta e com quem não conta. Dilma terá que se recordar de recentes palavras do ex-presidente Lula: “Não podemos trincar nossa relação com o PMDB”. Trincada está, não com o partido, mas com o líder na Câmara e seus seguidores, pelo menos.

Ninguém merece

Definitivamente, o regimento da Câmara está obsoleto e precisa ser mudado. Em um parlamento mais racional, mesmo sendo complexa e polêmica, uma matéria como a MP dos Portos seria votada em muito menos tempo (18 horas anteontem e sabe-se lá quantas de ontem para hoje), com taxa de ruído menor e índices de civilidade mais elevados. O representado não merece as baixarias de seus representantes. Há que haver no regimento alguma exigência de concentração no assunto em pauta. Os deputados, de um lado e outro, fizeram dezenas de pequenos discursos sobre os mais variados temas que não tinham nada a ver com os portos: cumprimentos a times de futebol de suas cidades, louvores e protestos acerca da contratação de médicos cubanos, exaltação de visitantes e todo o tipo de divagação. A obstrução é um recurso legítimo da minoria, mas deve ser usada com alguma racionalidade. Os sucessivos pedidos de verificação, depois do texto básico já aprovado, beiraram a histeria. Nesta cultura, de que adianta adotar novas tecnologias legislativas, como a votação eletrônica e o registro biométrico de presença, se o regimento permite todo tipo de chicana?

Outra guerra

Houve festa e foguetório para a fusão do PPS com o PMN para gerar o novo partido Mobilização Democrática, mas na prática ele ainda não existe. A direção não apresentou o pedido, de registro ao TSE, à espera de que o tribunal responda a uma consulta do presidente do PSD, Gilberto Kassab, perguntando se partidos decorrentes de fusão são considerados partidos novos. Embora o TSE e o STF já tenham tratado da matéria, considerando que sim, a consulta gerou insegurança. Os deputados de outros partidos que pensavam aderir à nova legenda estão em compasso de espera. Se eventualmente a resposta for não, a migração pode acarretar até a perda de mandato por infidelidade partidária. O MB deixaria de ser uma janela aberta para a migração sem punição e a fusão pode até subir no telhado.

Pressa

O senador Rodrigo Rollemberg, do PSB, está visitando cada ministro do STF, pedindo atenção ao mandado de segurança contra a aprovação do projeto sobre migrações partidárias, que afetaria o MB e a Rede de Marina Silva, ora nas mãos do ministro Gilmar Mendes. Ontem, visitou Dias Toffoli.

Fonte: Correio Braziliense

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