domingo, 26 de maio de 2013

Sete teses sobre o mundo rural brasileiro

Antônio Márcio Buainain1
Eliseu Alves2
José Maria da Silveira3
Zander Navarro4

O artigo na íntegra será publicado na Revista de Política Agrícola, junho de 2013 – ano XXII, número 2.


Resumo: O artigo apresenta sete teses que procuram interpretar a situação atual e as tendências do desenvolvimento da agropecuária e das regiões rurais brasileiras. A partir da primeira tese, que argumenta sobre a existência de uma nova etapa na história agrícola e agrária do país, instituindo um novo padrão de acumulação, as demais se associam em função de facetas diversas, porém necessárias para interpretar o momento atual e seus desafios futuros - dos novos desafios para a produção e difusão de inovações na agricultura à crescente inviabilidade econômica dos estabelecimentos rurais de menor porte; da necessidade de melhor ajustamento da ação governamental à inexistência de uma política de desenvolvimento rural. O texto também sugere, como outra tese, que esta nova fase pode estar marginalizando a relevância de debates que no passado discutiram as regiões rurais e suas particularidades.

Primeira tese: uma nova fase do desenvolvimento agrário

A partir do final da década de 1990, o desenvolvimento agrícola e agrário passou a experimentar uma nova, inédita e irreversível dinâmica produtiva e econômico-social no Brasil - um verdadeiro divisor de águas em nossa história rural.

Segunda tese: “inovação na agricultura” – o maior de todos os desafios

O processo de produção e difusão de inovações na agropecuária mudou completamente a sua natureza, quando comparado com algumas décadas passadas. É hoje um desafio gigantesco, pois opõe distintos interesses sociais e econômicos (rurais e não rurais). Sob o tema das mudanças climáticas, ultrapassa inclusive as fronteiras nacionais.

Terceira tese: o desenvolvimento agrário bifronte

A nova fase vem concretizando uma dupla face - a dinâmica econômica concentra a produção cada vez mais e, de outro lado, aprofunda a diferenciação social, promovendo intensa seletividade entre os produtores rurais. Em nenhum outro momento da história agrária os estabelecimentos rurais de menor porte econômico estiveram tão próximos da fronteira da marginalização.

Quarta tese: a história não terminou, mas o passado vai se apagando.

O último meio século desmentiu diversas antevisões: da exacerbação da questão agrária, simbolizada nas disputas pela terra, às supostas tendências da concentração da propriedade fundiária e, mais ainda, as teses sobre “campesinatos”. Desaparecem assim alguns temas do passado, entre os quais a reforma agrária.

Quinta tese: o Estado – da modernização às novas tarefas

Durante o período inicial de modernização esgotou-se um conjunto de “primeiras tarefas” de transformações rurais induzidas pelo Estado, combinando crédito rural, pesquisa agrícola e serviços de ATER estatais. Foi fase que constituiu diversos agentes privados que passaram a se dedicar à produção de pesquisa e difundir inovações, além de disputarem o bolo da riqueza. Paralelamente, o Estado foi “saindo à francesa”, o que é comprovado pelos gastos públicos na agricultura. Abre-se assim uma nova fase, sob as quais os agentes privados serão os principais atores do desenvolvimento.

Sexta tese: a ativação de uma relação perversa

Mesmo nas regiões rurais que prosperaram em função de alguma “dinâmica agrícola”, acaba prevalecendo uma tendência perversa em relação aos estabelecimentos rurais de menor porte econômico, ainda que apenas por duas razões. Primeiramente, os filhos migram para não mais voltar, pois existe um custo de oportunidade muito elevado. E, segundo, porque a oferta de trabalho contratado também se reduz, pelo abandono do campo, o que eleva os salários rurais.

Sétima tese: rumo à via argentina de desenvolvimento

Jamais ocorreu no Brasil uma política de desenvolvimento rural. Inexistindo tal ação governamental, o desenvolvimento agrário brasileiro vai impondo uma “via argentina": o esvaziamento demográfico do campo, o predomínio da agricultura de larga escala, a alta eficiência produtiva e tecnológica, mas o posicionamento, no caso brasileiro, como o maior produtor mundial de alimentos.

Conclusões

Este artigo recolhe a experiência, relativamente longa, de quatro pesquisadores do “mundo rural brasileiro”, e propõe sete teses sobre o desenvolvimento recente da agropecuária, também comentando sobre aspectos sociais das regiões rurais do país. São proposições que têm, em especial, um inquestionável lastro empírico para sustentá-las como argumentos gerais que mereceriam a atenção dos responsáveis e tomadores de decisão sobre os rumos de uma atividade econômica que, de fato, vem “salvando” a economia brasileira desde a grande crise econômica do início da década de 1980.

1 Economista. Doutor, pesquisador. 
2 Economista. Doutor, pesquisador. 
3 Engenheiro Agrônomo. Doutor, pesquisador. 
4 Sociólogo. Doutor, pesquisador. 

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