terça-feira, 25 de junho de 2013

Dilma propõe plebiscito para reforma política; ação é atacada

Parlamentares e ministros do STF dizem que convocação seria "golpe" à Constituição • Consulta popular é um dos cinco pontos propostos para tentar conter protestos • Saúde, educação e transporte são os outros focos • Manifestações continuam e 2 morrem.

A presidente Dilma Rousseff propôs ontem durante reunião emergencial com os 27 governadores e prefeitos de capitais a realização de plebiscito que autorize a convocação de Assembleia Constituinte específica para fazer a reforma política. O plebiscito é um dos cinco pactos sugeridos pela presidente à classe política para dar respostas aos brasileiros que foram às ruas. Parlamentares e ministros do STF levantaram questionamentos sobre a viabilidade do plebiscito e afirmaram que a convocação de constituinte exclusiva seria um "golpe" contra a Carta em vigor. Ao tratar da proposta de combate à corrupção, Dilma sugeriu uma nova legislação que classifique corrupção dolosa como equivalente a crime hediondo.

Também foram propostos pacto pela saúde, com a contratação de profissionais estrangeiros, investimentos em transporte público e aplicação de verba dos royalties do petróleo em educação. Líderes da oposição criticaram as propostas e disseram que não atendem a sociedade.

Pactos propostos

Responsabilidade fiscal;
Reforma política;
Saúde;
Transporte;
Educação.

Dilma propõe plebiscito e Constituinte exclusiva para fazer a reforma política

Eduardo Bresciani, Felipe Recondo

BRASÍLIA - A presidente Dilma Rousseff propôs ontem durante reunião emergencial com os governadores dos Estados e prefeitos de capitais a realização de um plebiscito que autorize a convocação de Assembleia Constituinte específica para fazer a reforma política. O plebiscito seria um dos cinco pactos propostos pela presidente à classe política para dar respostas aos brasileiros que foram às ruas e protestam por mudanças sociais» A proposta foi vista com receio no Congresso e no Supremo.

Além da reforma política e do combate à corrupção - que incluí a proposta de tipificar corrupção dolosa em crime hediondo os pactos propostos incluem investimentos em saúde, educação e transporte e manutenção da responsabilidade fiscal e combate à inflação.

"Quero, neste momento, propor o debate sobre a convocacão de um plebiscito popular que autorize o funcionamento de processo constituinte específico para fazer a reforma política que o País tanto necessita", afirmou Dilma. Segundo a presidente, "o Brasil está maduro para avançar e já deixou claro que não quer ficar parado onde está". A reforma política, segundo ela, deverá ampliar a participação popular e a cidadania.

O ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, e o governador do Ceará, Cid Gomes, foram os autores da ideia de convocar um plebiscito para a população decidir se apoia a criação de uma Constituinte para votar a reforma política. A ideia não é nova, é bastante polêmica, e já foi defendida pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva na campanha da reeleição (2006) quando o PT foi abatido pela crise do mensalão.

Os partidos de oposição divulgaram nota ontem criticando o governo do PT por não ter se empenhado, nos últimos dez anos, em votar a reforma política apesar de ter maioria absoluta no Congresso. Afirmam ainda ter dúvidas sobre a eficácia de uma Constituinte, acrescentando que cabe apenas ao Congresso definir se deve ou não ser proposto um plebiscito.

Espírito de corpo. Ex-parlamentar, Cardozo disse a Dilma que a reforma política nunca será feita sem uma Constituinte exclusiva, porque o "espírito de corpo" do Congresso sempre prevalece nessas horas. A cúpula do PT também avalia que a aprovação da reforma política é crucial para o governo mostrar que está disposto a enfrentar a corrupção, num momento em que protestos contra desvios de recursos públicos pipocam nas ruas. No ano passado, petistas foram condenados pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no julgamento do mensalão.

"O financiamento público de campanha é essencial para coibir o abuso do poder econômico nas eleições", disse Cardozo.

O combate à corrupção foi incluído no pacto proposto por Dilma. Para ela, o enfrentamento à corrupção deve ser dar "de forma mais contundente" e uma iniciativa fundamental é criar "nova legislação que classifique a corrupção dolosa como equivalente a crime hediondo".

Ao enfatizar um pacto pela saúde, Dilma propôs aos governadores "acelerar os investimentos já contratados em hospitais, unidades de pronto atendimento e unidades básicas de saúde", "Quando não houver a disponibilidade de médicos brasileiros, contrataremos profissionais estrangeiros para trabalhar com exclusividade no Sistema Único de Saúde", disse, antecipando-se também às críticas do setor. "Não se trata nem de longe, de uma medida hostil ou desrespeitosa aos nossos profissionais. Trata-se de uma ação emergencial, localizada, tendo em vista a grande dificuldade que estamos enfrentando para encontrar médicos em número suficiente ou com disposição para trabalhar nas áreas mais remotas do País."

Um salto de qualidade no transporte público é outra parte do pacto proposto por Dilma, Ela disse que vai destinar R$ 50 i bilhões para novos investimentos em obras de mobilidade urbana. "Avançar mais rápido em direção ao transporte público de qualidade e acessível".

Dilma concluiu sua proposta de pacto dizendo que é preciso cuidar da educação. Afirmou que a ampliação de acesso à educação e valorização dos profissionais exige recursos. "Meu governo tem lutado, junto ao Congresso Nacional, para que 100% dos royalties do petróleo e 50% dos recursos do pré-sal (...) sejam investidos na educação. Confio que os senhores congressistas aprovarão esse projeto que tramita no Legislativo com urgência constitucional", disse a presidente.

Pactos propostos pela presidente

1.Responsabilidade fiscal e estabilidade: Todos os entes da federação devem se empenhar em manter a inflação e os gastos sob controle.
2.Plebiscito/corrupção: Defende consulta popular sobre uma Constituinte específica para fazer a reforma política; corrupção seria crime hediondo.

3.Saúde: Presidente pediu que políticos "acelerem" gastos com saúde publica (como UPAs) e defendeu entrada de médicos estrangeiros na País.

4.Transporte público: Afirmou que será ampliada a desoneração de FIS/Cofins sobre diesel, o que auxilia no controle das tarifas; prometeu liberar R$ 50 bi para investimentos em mobilidade e disse que criará o conselho de transporte público.

5.Educação pública: Governo federal pediu votação em regime de urgência constitucional da proposta que destina 100% dos royalties do petróleo e 50% dos royalties do pré-sal para investimentos em educação pública.

Proposta é mal recebida no STF e no Congresso

Ministros do Supremo Tribunal Federal afirmam que convocação de constituinte exclusiva seria um "golpe" contra a Carta em vigor

Deputados, senadores e ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) questionaram ontem a viabilidade da realização de um plebiscito sobre a convocação de uma constituinte exclusiva para debater e reforma política, proposta feita pela presidente Dilma Rousseff.

O anúncio de Dilma foi recebido com surpresa por surgir em uma reunião com chefes de Executivo e não na presença de integrantes do Legislativo. A convocação do plebiscito, na forma como defendido pela presidente no discurso, teria de acontecer por meio de emenda constitucional, proposição que tem trâmite lento e precisa da aprovação de 2/3 dos parlamentares na Câmara e no Senado.

Um ministro do STF destacou não haver na Constituição previsão de convocação de constituintes exclusivas - integradas não por parlamentares, mas por pessoas eleitas apenas para esse fim. Para outro integrante da Corte, essa possibilidade não está na legislação justamente para dar segurança jurídica ao País. Na visão desses ministros, a atitude seria um golpe contra a i Constituição de 1988. Observam que, como o tema é amplo, seria possível mudar o sistema de presidencialista para parlamentarista, por exemplo.

O ex-presidente do Supremo Carlos Velloso classificou como "uma forma de distrair o povo que está nas ruas" o anúncio feito pela presidente. "Que o povo deseja uma reforma política, não há dúvida" disse. "Deseja muito mais: que se ponha fim à gastança desenfreada e deseja reformas que aperfeiçoem o regime político e tornem mais saudável a vida das pessoas", afirmou Velloso, que presidiu o STF de 1999 a 2001.

O presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, Marcus Vinicius Furtado, criticou a proposta de Dilma, destacando ser possível fazer alterações no sistema de forma mais simples. "É muita energia gasta em algo que pode ser resolvido sem necessidade de mexer na Constituição. Basta alterar a Lei das Eleições e a Lei dos Partidos."

No Congresso, a proposta foi recebida com perplexidade por oposicionistas. "Todos aqueles que eu consultei disseram que, conceitualmente, está errado", afirmou o líder do DEM na Câmara, Ronaldo Caiado (GO).

Interesses. Na base aliada, líderes manifestaram apoio, mas reconheceram confusão na proposta. "É preciso ainda esclarecer por que a presidente também fala em extrair da população pontos para a reforma, mas a ideia demonstra um respeito pela população", afirmou o líder do governo no Senado, Eduardo Braga (PMDB-AM).

Os defensores da proposta avaliam que o Congresso atual não faria mudanças profundas por não desejar mexer em seus próprios interesses. "Nós sabemos que não vai ter reforma para valer com o Congresso que temos aqui", disse Wellington Dias (PI), líder do PT no Senado. "Defendo a constituinte exclusiva porque não se faz uma reforma política com um Congresso eleito por este sistema que se deseja mudar", disse o líder do PSB no Senado, Rodrigo Rollemberg (DF).

Datas

Na reunião de Dilma Rousseff com governadores e prefeitos no Planalto foram sugeridas duas datas para a realização do plebiscito proposto pela presidente: 7 de setembro ou 15 de novembro.

Fonte: O Estado de S. Paulo

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