sexta-feira, 7 de junho de 2013

Quando a conta chega antes à mesa - Maria Cristina Fernandes


Um país que muda está sempre a antecipar suas campanhas eleitorais. Política morna é o fim da história, mas a crise financeira mostrou que até os países que já se imaginavam lá agora pelejam para recontá-la.

Os prejudicados pelas mudanças querem saber quem será capaz de revertê-las. Os beneficiários buscam candidatos a mantê-las e aprofundá-las. O país melhora quando as mudanças que beneficiam a maioria avançam e se consolidam. Com variações de velocidade e adaptações de percurso, este tem sido o caminho do Brasil nos últimos 20 anos.

Não se pode dizer isso do resto do mundo. A geração que chega à vida adulta nos Estados Unidos usufrui de menos conforto material e é menos educada do que a dos seus pais. No Reino Unido, já chega a meio milhão, o dobro do ano passado, o número de dependentes de ongs de caridade.

Eleitor se posicionará sobre freio na redistribuição

A discurseira sucessória de 2014 está na rua desde sempre mas só agora sua agenda começa a mostrar a cara. O debate não é mais o que fazer para o Brasil crescer mas o preço que cada um paga por isso. O acerto de contas costuma ser feito depois do lacre nas urnas. Foi assim com o Cruzado de 1986 e o Real de 1998. Combinados, pibinho, inflação e Copom anteciparam a fatura.

Marca registrada dos anos petistas, os ajustes salariais acima da inflação já não exibem o mesmo fôlego. No Valor de 03/06 lê-se que um terço dos acordos salariais têm sido fechados sem aumento real. Parece pouco para quem não enxerga outra medida contra a inflação, mas é uma mudança e tanto numa conjuntura que registrava a quase totalidade dos aumentos salariais acima dos demais preços da economia.

Paulo Pereira da Silva, principal liderança do sindicalismo de resultados, não parece ter motivos para comemorar a primeira fornada de estatísticas sobre o mundo do trabalho desde sua campanha de 1º de maio em que, num palanque compartilhado pelo senador Aécio Neves (PSDB), exortou seus expectadores a exigir gatilho salarial.

Quem sabe fazer conta não consegue dizer quantos empregos o último Copom vai rifar. O que se sabe é que o país, beneficiado por mudanças demográficas das últimas décadas, tem gerado emprego mesmo crescendo pouco.

De salário e emprego dependem em grande parte os contornos do eleitorado de Dilma. Marcos Coimbra, diretor do Vox Populi, mediu as mudanças que se efetuaram no eleitorado do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva entre 2002 e 2006 e vê se repetir a migração.

Do eleitorado mais homogeneamente distribuído de 2010, Dilma estaria migrando para um voto mais povão, menos classe média. Ignoram-se aqui os eufemismos que atribuem mudança na classe social de um eleitor pela marca do tênis que passou a comprar.

Aquilo que Lula apenas conseguiu no segundo turno de 2006 - incorporação das regiões agrícolas - Dilma investe para conseguir já no primeiro. E não apenas pelo zelo com a bancada ruralista. Entre os dados do pibinho, as melhores notícias vieram da economia rural. Nas contas do Vox Populi, um terço dos brasileiros vive nas 50 maiores cidades do país. O segundo terço nas 500 médias e o terceiro terço na vastidão das cinco mil pequenas cidades.

Dois terços, portanto, vivem em cidades mais diretamente afetadas pelo negócio agrícola que, no primeiro trimestre, teve um crescimento chinês.

As comparações do Brasil com o resto do mundo servem a quaisquer ideologias. Entre os grandes países emergentes, foi o que menos cresceu no ano passado. Mas também foi aquele mais gente incorporou ao mercado de consumo.

Estudioso de opinião pública há 40 anos e consultor frequente do Palácio do Planalto, Coimbra aprendeu que eleitor também compara. Mas prefere fazê-lo com as ferramentas que conhece. Confronta os governos que elege. Constata que a presidente tem dificuldades na política econômica, mas olha como sobreviveu aos últimos governos e prefere renovar os votos de confiança em sua condução.

Nos sete quesitos em que mediu a avaliação do eleitor (emprego, habitação, pobreza, saúde, segurança, educação e corrupção), os governos petistas superam, com folgada margem, aquele que os antecedeu.

A comparação sempre tende a valorizar conquistas mais recentes. O que não as garante frente a confrontos futuros. Daí porque postulantes torturem a língua para produzir sinônimos do Brasil que quer mais.

Nada garante que o eleitor que conseguiu seu primeiro emprego de carteira assinada, quer ascender e se vê premido pelo congelamento do mercado de trabalho fique com Dilma.

Tanto o usufruto de uma rede social em expansão quanto os benefícios de uma política econômica capaz de gerar estabilidade, crescimento e emprego tendem a ser vistos como obrigação do Estado e não como favor a ser alimentado pela lealdade eleitoral.

O eleitor que vai votar pela primeira vez em 2014 tinha seis anos quando os petistas chegaram ao poder. Bolsa Família, Prouni e Pronatec podem soar para eles apenas como decorrência natural da presença do Estado.

Ninguém mais lembra quem criou o real, o 13ºsalário, a aposentadoria ou o passe de idosos nos ônibus. As conquistas só deixam de ser consideradas como parte da paisagem se foram postas em risco.

Foi isso que aconteceu no episódio do vazamento de notícia falsa sobre o Bolsa Família. É possível que o programa tenha esgotado seu potencial de atração de eleitores, mas o desespero visto no episódio mostra que o programa virou cláusula pétrea dos programas eleitorais.

É pelos avanços que coloca em risco que os dados econômicos da conjuntura iluminam o debate de 2014. O governo justifica o freio na redistribuição como necessário ao aumento dos investimentos industriais e de infraestrutura sem os quais não haverá empregos para a geração que virá mais educada.

Para desmontar esse discurso, a oposição terá que apostar no fracasso petista de renovar o pacto social até 2014. Para quem acompanha planilha de pesquisa de opinião este cenário ainda não aparece. O cenário de guerra na noite de ontem em vários capitais que aumentaram a tarifa de ônibus, porém, sinaliza que a conta mais salgada é recebida sob protestos.

Fonte: Valor Econômico

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