sábado, 8 de junho de 2013

Tensão fundiária: Embrapa acusa Funai de demarcar terra sem índio

Texto enviado ao Planalto diz também que indígenas paraguaios ocuparam áreas no Paraná.

Houve aumento de 168% no número de assassinatos de índios nos dez anos dos governos Lula e Dilma em comparação com a gestão de Fernando Henrique, afirma estudo do Conselho Indigenista Missionário (Cimi).

Um relatório entregue pela Embrapa à Casa Civil da Presidência informa que não existem índios em pelo menos quatro áreas indicadas pela Funai como territórios indígenas nos municípios de Guaíra e Terra Roxa, no Paraná, onde há risco de conflitos como os de Mato Grosso do Sul. O documento diz também que índios vindos do Paraguai estariam ocupando terras no Paraná. As informações da Embrapa levaram o governo a mudar as regras de demarcação de áreas indígenas. Embrapa, Incra e outros órgãos serão ouvidos num assunto que, até agora, ficava a cargo exclusivo da Funai.

Terra indígena sem índios

Em relatório, Embrapa questiona dados da Funai em processos de demarcação no Paraná

Jailton de Carvalho

BRASÍLIA - Um relatório da Empresa Brasileira de Produção Agropecuária (Embrapa) põe em xeque dados usados pela Funai em estudos para a demarcação de terras indígenas nos municípios de Guaíra e Terra Roxa, no Paraná. O documento informa que não existem índios em pelo menos quatro áreas indicadas pela Funai como território indígena. A Embrapa também informou à Casa Civil da Presidência que índios vindos do Paraguai estariam ocupando terras no Paraná, em busca de demarcação de território próprio.

As informações da Embrapa ajudaram a embasar a decisão do governo de mudar as regras de demarcação de terras indígenas. A partir de agora, por decisão do Planalto, serão abertas consultas à Embrapa, ao Incra e a outras áreas do governo antes da definição dos decretos de demarcação de áreas indígenas, que antes ficavam a cargo exclusivo da Funai.

Guaíra e Terra Roxa são, hoje, palco de intensas disputas de terras entre índios e fazendeiros, e os conflitos são parecidos com os de Sidrolândia (MS), epicentro de uma das mais graves crises indígenas na História recente do país.

Índios e fazendeiros medem força na Justiça Federal pela posse de 15 áreas em Guaíra e Terra Roxa, quatro delas em áreas urbanas. As duas cidades estão na faixa de fronteira com o Paraguai e próximas ao lago da hidrelétrica de Itaipu. Estudos preliminares da Funai, que dariam base a futuras demarcações, sustentam que as áreas em disputa pertencem aos índios. Mas o relatório encaminhado pela Embrapa à Casa Civil informa que em quatro áreas reivindicadas pela Funai como áreas indígenas não existem tribos.

Em um quadro para exibição em Powerpoint, a Embrapa pergunta: "Hoje há indígenas no local?". Na mesma página, o autor do documento responde que não existem índios em quatro áreas.

Ocupação indígena a partir de 2007

No documento, a Embrapa informa, ainda, que dez áreas foram ocupadas por índios a partir de 2007. As conclusões da empresa ligada ao Ministério da Agricultura estão amparadas em imagens históricas de satélite. As imagens mostram o avanço da ocupação humana na região a cada ano. As áreas reivindicadas pelos índios estão cercadas de plantações.

Os dados sobre a entrada de índios paraguaios em Guaíra e Terra Roxa foram levantadas por servidores da Embrapa em viagens à região, segundo uma fonte do Palácio do Planalto. Quando recebeu a informação, a ministra da Casa Civil, Gleisi Hoffmann, teria dito que o país já tem problemas demais para resolver relacionados aos índios brasileiros, e que não seria justo se responsabilizar também por dificuldades dos índios de outro país.

O prefeito de Guaíra, Fabian Vendruscolo (PT), reforçou a acusação sobre a suposta invasão de índios paraguaios. Segundo ele, índios começaram a chegar à região há menos de dez anos. Em 2006, 50 índios reivindicavam duas áreas na cidade. Agora, o município já tem 800 índios, que disputam posse de oito áreas. Guaíra e Terra Roxa são celeiros agrícolas e têm algumas das terras mais valorizadas do Paraná.

- Em 2006, começaram a vir para cá índios de Mato Grosso do Sul, do Paraguai e de outras regiões do Paraná. A maioria dos índios vem de Mato Grosso do Sul. Mas muitos vêm do Paraguai. Nós somos da fronteira. Nós sabemos quais são os índios daqui e quais não são - disse Vendruscolo.

Segundo ele, a situação é tensa e, se não houver rápida intervenção do governo federal, são altos os riscos de confronto entre fazendeiros e índios. Ele argumenta que os proprietários rurais têm escrituras das fazendas e não vão aceitar, em hipótese alguma, perder terras para índios. Diz ainda que, na próxima sexta-feira, produtores rurais vão fechar a Ponte Ayrton Senna, no município, em protesto contra as propostas de demarcação de áreas indígenas na região. O fechamento da ponte é um dos atos de mobilização de ruralistas convocados pela Frente Parlamentar da Agropecuária da Câmara em pelo menos 14 estados, como mostrou O GLOBO ontem.

- Os produtores vão trancar as rodovias BR-163 e BR-272 e a Ponte Ayrton Senna. Se os índios resolverem fazer um protesto para se contrapor a este movimento, como é que vai ficar ? Pode haver confronto - afirmou o prefeito.

Após examinar o relatório da Embrapa mês passado, Gleisi enviou o documento para o Ministério da Justiça. Até o fim do mês, a presidente Dilma Rousseff deverá assinar um decreto para estabelecer novas regras para a definição de áreas indígenas. Para a ministra Gleisi, o confronto de posições dentro do governo evitaria futuras disputas judiciais, como tem ocorrido hoje. Procurada pelo GLOBO, a Funai não respondeu às perguntas do jornal.

Fonte: O Globo

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