terça-feira, 23 de julho de 2013

Filme antigo - Miriam Leitão

Nos últimos dois anos, o governo fez o mesmo que ontem: anunciou corte de gastos contando que as despesas não aumentariam como o previsto. E elas aumentaram. No passado, foram anunciados cortes em seguro-desemprego e na folha de salários, através do combate às fraudes. Os dois itens subiram. Agora, anunciam reduções de despesas do INSS e na lista dos gastos cotidianos.

Os ministros de Planejamento e Fazenda anunciaram cortes em viagens, contas de luz, fabricação de notas e moedas, alguns concursos, que serão postergados, locação de imóveis, material de limpeza. Ou seja, todo o ano, a lista é a mesma.

O que há de novo é a desistência de fazer o truque de transformar em receita imediata os recebíveis de Itaipu. Eles fariam assim: lançariam títulos para ter agora o dinheiro que receberiam da usina até 2023. Esse dinheiro capitalizaria uma conta chamada CDE, que cobre o aumento do custo da energia quando se usa térmicas em época de seca. Antes, isso era pago pelo consumidor. Com a decisão de reduzir o preço da energia, abriu-se um rombo nessa conta, até porque o baixo nível dos reservatórios exigiu muito uso de térmicas. Agora será feito de forma mais simples: o Tesouro vai transferir dinheiro na medida da necessidade. A próxima parcela será de R$ 400 milhões.

O economista Gil Castelo Branco, do site Contas Abertas, conta que vários dos objetivos dos anos anteriores não foram alcançados. Em termos reais, descontando a inflação do período, as despesas aumentaram.

- Os gastos com pessoal e encargos da União no primeiro semestre de 2012 foram de R$ 107,6 bilhões e em 2013 foram de R$ 108 bi. O pagamento do seguro-desemprego subiu de R$ 13,6 bilhões para R$ 14,4 bilhões. Os gastos com passagens aéreas e diárias, também no primeiro semestre, saíram de R$ 615 milhões, em 2011, para R$ 882,5 milhões, no ano passado, e R$ 942 milhões, este ano - explica.

O governo fez o de sempre: anunciou intenção. Isso não se cumpriu nos últimos anos. E em 2011 o governo chegou a garantir que conseguiria essas reduções no gasto da folha, porque havia contratado uma consultoria para avaliar as despesas e verificar fraudes.

Uma diferença forte é que em 2011 o anúncio do corte foi de R$ 50 bilhões; no ano passado, de R$ 55 bilhões; e este ano, de R$ 10 bilhões. Mas ele se soma a outros R$ 28 bilhões já contingenciados.

Por causa da inflação alta, o corte este ano deveria ser maior para ajudar no combate à alta dos preços. O problema é que a arrecadação está decepcionando e já não há mais folga na receita. Segundo a Receita Federal, a arrecadação cresceu apenas 0,49% no primeiro semestre. Chega-se a esse número baixo percebendo o que aconteceu com as desonerações - recursos que o governo abre mão - que dispararam 75%, de R$ 19,9 bilhões, no mesmo período de 2012, para R$ 35,1 bi, este ano.

Os ministros anunciaram outros cortes que não se sabe se conseguirão cumprir. Um deles é o dos R$ 4,4 bilhões do INSS, de recálculo de despesas que eles tinham feito antes com as desonerações da folha salarial das empresas. Aliás, 79% dos cortes em gastos obrigatórios, que apresentaram, saíram de cálculos refeitos das contas que eles mesmos tinham feito, segundo Gil Castelo Branco.

Para o economista Felipe Salto, o corte foi tímido diante da necessidade do governo de economizar para cumprir o superávit primário. Alertou que o gasto que vai cobrir a CDE não entrou nas contas ainda, nem foi detalhado o corte de R$ 2,5 bilhões com subsídios, e fica uma enorme dúvida de onde virá.

O anúncio de ontem não trouxe a confiança esperada. Apenas deixou a sensação de filme antigo e muito visto.

Fonte: O Globo

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