segunda-feira, 22 de julho de 2013

O fim de uma era - José Roberto Mendonça de Barros

Estamos vivendo o final de uma era. Vários fatores, externos e internos, se conjugam para isso. Vejamos os mais relevantes:

1) Fim do crescimento acelerado da China: como todos nós sabemos, a China passa por um delicado rebalanceamento de sua economia, onde a nova liderança política pretende reduzir o peso do investimento: como fator líder do crescimento, em benefício da elevação do consumo. Este é relativamente baixo, pois é estimado como sendo da ordem de 35% do PIB. Existem outros aspectos importantes desta política, como um esforço para elevar o conteúdo tecnológico das exportações, mas o fato é que o melhor resultado que se pode esperar para este ano é: um crescimento de 7,5%. Olhando mais adiante, o PIB irá se expandir a uma taxa ainda inferior a essa. Mesmo ressalvando que a demanda de alimentos e de petróleo continuará a crescer de forma rápida, os ganhos I de renda via preços de exportação de commodities serão menores, afetando negativamente o Brasil.

2) Fim do período de juros internacionais muito baixos: como todos sabem, o Banco Central americano vem sinalizando uma suave reversão da po¬lítica monetária expansionista. Com isso, o juro de mercado dos papéis longos já subiu algo como 6oo pontos. Es¬te movimento e a volta do crescimento mais robusto em 2014 estão levando a uma valorização da moeda americana e a uma alteração nos fluxos de capitais na direção daquele país. Assim, o custo de capital para o Brasil tende á se elevar. Também nossa política comercial externa mostrará mais uma de suas fragilidades, qual seja, o fato de ter abandonado há dez anos qualquer esforço para elevar a penetração de produtos brasileiros no maior merca¬do do mundo, algo que é parte da explicação de porque nossas exportações estão enfraquecendo rapidamente.

3) Fim do crescimento rápido da nossa demanda interna: como se sabe, a partir de 2010 a demanda das famílias começou a enfraquecer, o que hoje é visível a olho nu. Não se repetirão mais a velocidade da inclusão de novas famílias no mercado de consumo (não exis¬tem outros 13 milhões de domicílios que possam receber o Bolsa Família), a bancarização acelerada de novos clientes e a existência de baixos níveis de I endividamento. Ao contrário, o eleva¬do comprometimento de renda com prestações é hoje uma limitação à expansão rápida do consumo. É por isso que todos os esforços governamentais para bombar a demanda têm tido resultados pífios.

4) Fim da folga fiscal: a arrecadação vai se elevar muito mais lentamente, tornando mais difícil financiar novos gastos, elevações reais do salário míni¬mo e novas concessões de benefícios fiscais.

5) Fim do período de crescimento rápido do PIB: no período 2011 /2013, o crescimento do PIB será inferior a 2%.

Isso não acontece por acaso. Já se discutiu a exaustão que ou as condições de oferta melhoram e, junto com elas, nossa competitividade, ou uma boa parte do modesto crescimento da de¬manda vai vazar para o exterior, na for¬ma de maior importação. Pelo menos dois fatores estão se transformando num obstáculo intransponível para se atingir crescimento mais robusto. Falo aqui do custo total da mão de obra e da carga tributária. O custo do trabalho não para de aumentar (salários, encargos e outros dispêndios) e não tem j qualquer ligação mais sistemática com | a elevação da produtividade. E este é ? um processo ainda em curso, pois, e como já mostrou José Pastore, a legislação trabalhista não para de criar novos j gastos por todos os tipos de razão, e isto sem considerar a nova pauta sindical, onde se inclui a demanda da sema¬; na de 40 horas de trabalho, que será i discutida neste semestre.

Simultaneamente, a complexidade de nossos tributos está atingindo limites insuportáveis para as companhias. Não se trata apenas do tamanho da carga, mas da insanidade da mudança cotidiana de regras dos mais diversos tipos de impostos (PIS/Cofins e ICMS, especialmente). Se estes dois fatores não forem adequadamente encaminha¬dos, nossos custos de produção jamais se tornarão de novo minimamente competitivos. Ao mesmo tempo, é sonho imaginar que uma mega desvalorização cambiai magicamente resolve esses problemas, sem ser dissipada por uma forte inflação.

6) Fim do novo experimento de campeões nacionais: este fenômeno já vinha se delineando desde o colapso dos grupos Independência e Bertin, do caso LBRe outras dificuldades. Entretanto, a derrocada do Grupo X ilustra o ponto de forma definitiva, Embora o ajuste ainda não tenha terminado, é certo que o conglomerado empresa de energia (MPX) terá outro controlador, os dois portos, que são bons ativos, deverão ter continuidade com outra organização empresa¬rial. É nebuloso o futuro dos ativos ligados ao petróleo. Mesmo no melhor cenário, as per¬das resultantes deste processo serão muito expressivas. Por exemplo, se tomarmos o preço das ações das seis empresas abertas, nas datas das respectivas operações, e colocarmos os valores em dólar e compararmos com os preços do último dia onze, chegaremos a uma perda do mercado da ordem de US$ 12 bilhões. A OGXe a OSX tinham coloca¬do no mercado externo bônus da ordem de US$ 4,1 bilhões, sendo que o mais líquido deles está hoje sendo negociado a 16 centavos por dólar.

Muitas dívidas bancárias estão sendo renegociadas, processo que está longe de seu final. Entretanto, é certo que o volume de provisão que o sistema terá de fazer será considerá-vel E fácil antever que o mercado de crédito ficará ainda mais seletivo. Outros credores e fornecedores também estão sendo afetados.

A forte deterioração das expectativas e o desarranjo político atual tem, em parte, a ver com a percepção dessas tendências.

Estamos realmente no final de uma era, especialmente de uma era onde o marketing é mais importam j te que os fatos, onde o discurso é que estamos a um passo do paraíso, enfim, do nunca antes neste País. Vai ser preciso trabalhar muito para voltar a crescer.

* Economista

Fonte: O Estado de S. Paulo

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