quarta-feira, 3 de julho de 2013

Tempo curto para assuntos complexos

Para especialistas, será difícil esclarecer a população sobre o que estará sendo votado

Nice de Paula

Os cinco temas propostos pela presidente Dilma Rousseff para o plebiscito sobre reforma política foram considerados importantes por especialistas, porém muito complexos para serem discutidos com a população num tempo curto demais.

- Consultar a população por meio de um plebiscito é uma decisão equivocada. Foi a forma encontrada pela presidente para recuperar seu prestígio e popularidade, que ficaram arranhados, mas esses pontos demandam um nível de esclarecimento, de debate e de formação de contraditório muito alto. E para valer para 2014, toda a campanha tem que ser feita até setembro, é um prazo muito curto - diz José Álvaro Moisés, diretor-científico do Núcleo de Pesquisas de Políticas Públicas da USP.

Autor de vários livros sobre política, entre eles "Cidadania e participação: ensaio sobre o referendo, o plebiscito e a iniciativa popular legislativa na nova Constituição", Moisés diz que, em países como a Suíça e os Estados Unidos, onde as consultas populares são mais comuns e o nível de escolaridade é muito mais alto do que no Brasil, as convocações são feitas com, no mínimo, cinco meses de antecedência.

- No nosso caso, são temas extremamente complexos, que não se esclarecem em 15 dias de campanha. Imagine discutir o que é voto distrital puro, misto, majoritário. A maioria da população não sabe nem o que é coligação partidária. O risco é ter decisão mal tomada em cima de um suposto consenso, e uma consulta à população virar uma manipulação.

Segundo Moisés, se é para se decidir nesse prazo, seria melhor fazer o debate no Congresso e levar o resultado à aprovação popular, por meio de um referendo.

Marco Antônio Carvalho Teixeira, professor de Ciência Política da Fundação Getulio Vargas (FGV-SP), reforça o coro de que a grande questão é a qualidade da discussão que será possível fazer num espaço de tempo tão exíguo.

- Os temas são importantes, mas muito complexos. Por outro lado, se não se aproveita este momento de pressão popular, a reforma política corre o risco de virar fumaça. Esse é o dilema - diz.

Diante do impasse, Teixeira acredita que a melhor alternativa seria um esforço para decidir agora sobre os três assunto menos complicados: financiamento de campanha, voto secreto e fim da suplência de senadores. Já a discussão sobre o voto distrital e as coligações partidárias, na avaliação do especialista, deveriam ficar para 2016, assim como outros temas que, acredita ele, precisam entrar na pauta.

- Discutir questão distrital num país como o Brasil não é tarefa nada simples.

Para o cientista político David Fleischer, da UnB, o fim do voto secreto e da suplência não devem ser incluídos no plebiscito, porque já são alvo de projetos que tramitam no Congresso Nacional. Os demais ele considera relevantes.

- A mudança no sistema eleitoral é praticamente o clamor da ruas, e o voto distrital é a melhor forma do eleitor se sentir bem representado, porque vai fazer com que ele se lembre em quem votou. Se houver eleição em dois turnos para deputado, como propõe a OAB, melhor ainda, porque isso reduzirá dos atuais 20 mil para 1 .026 o total de candidatos a deputados -explica.

Ele também é favorável ao fim das coligações, para evitar que o eleitor vote num partido e eleja candidato de outro. E acha positivo o fim do financiamento de campanha por empresas, porque, afirma, bancos, empreiteiras e mineradoras patrocinam 90% do custo total das campanhas.

- Depois de receber rios de dinheiro das empresas, os deputados vão votar de acordo com a demanda das empresas, e não do povo.

O professor da UNB acredita que que houve dois itens que não foram incluídos nas propostas da presidente e podem ser acrescentados pelo Congresso:

- A Dilma só não teve coragem de propor o fim da reeleição, que seria uma saída honrosa para ela. Evitaria de se candidatar e perder, e ainda abriria espaço para o Lula voltar. Também faltou o voto facultativo, porque votar é direito, não obrigação.

Fonte: O Globo

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