sábado, 24 de agosto de 2013

Detalhes da armadilha - Denise Rothenburg

A estratégia governista com o Programa Mais Médicos tem dado certo até agora. Tudo foi amarrado de forma eficiente, o que é uma solução em políticas públicas. O problema é quando a ideia é fixa, por motivos meramente eleitorais

O governo Dilma Rousseff preparou a armadilha para os críticos do Programa Mais Médicos e mais especificamente para os contrários à “importação” de profissionais cubanos. A estratégia foi amarrada a partir de lógica jurídica capaz de evitar questionamentos ao acordo com o país dos irmãos Castros. Pelo menos é que espera o governo. Mas, de certa forma, até aqui os governistas estão em vantagem.

Parte da artimanha foi descoberta logo no início pelo Conselho Federal de Medicina (CFM), quando, em nota, o órgão classificou a medida como planejada “nos bastidores da cortina de fumaça do malfadado Programa Mais Médicos”. Nada foi tomado no improviso — e isso está longe de ser uma crítica ao Palácio do Planalto, afinal é tarefa de governo amarrar programas. O problema é quando a ideia é fixa, por motivos meramente eleitorais. Sobre isso, falamos mais tarde.

Antes, à Medida Provisória nº 621/13. O texto foi preparado por funcionários dos ministérios da Saúde e das Relações Exteriores. Foram eles que traçaram as linhas básicas da medida, interpretada como um texto-bomba por causa das controvérsias, incluindo a não revalidação dos diplomas nas universidades. Aqui, uma explicação à parte. Não incluir o Revalida na lei a ser confirmada foi uma ação para evitar confrontos maiores com as entidades de classe brasileiras, afinal, caso os médicos estrangeiros fossem aprovados, poderiam reivindicar de imediato o diploma por aqui.

Essa será a cartada usada pelo governo para, no futuro, justificar a não inclusão do exame para os médicos cubanos, por exemplo. Sem possibilidade de revalidação do diploma em universidades brasileiras, o estrangeiro só poderá permanecer no país por três anos, prorrogáveis por mais três — pelo menos é o que está na lei, que trata o acordo como um intercâmbio, algo singelo. Aqui vale qualquer ilação sobre a possibilidade de os cubanos pedirem asilo ao fim do prazo. Mas será uma ilação.

Ao anunciar a MP, Dilma jogou uma isca. A ação inicial de entidades médicas foi questionar a MP no Supremo Tribunal Federal (STF). No fim do mês passado, ao validar o programa e desconsiderar o pedido de liminar da Associação Médica Brasileira (AMB), o vice-presidente do Supremo, Ricardo Lewandowski, disse que é comprovada a carência de médicos no país. “Vê-se, pois, que o ato impugnado configura uma política pública da maior importância social, sobretudo ante a comprovada carência de recursos humanos na área médica no âmbito do Sistema Único de Saúde.”

Tempo
A decisão de Lewandowski precisa ser confirmada pelo plenário do Supremo, mas deu tempo ao governo de anunciar o que já estava planejado há mais tempo: a contratação, por um prazo de três anos, dos médicos cubanos. A dificuldade de preencher as vagas por outros profissionais estrangeiros apenas reforçou a necessidade de trazer os cubanos, a ação principal do governo até agora.

A marca
Em 17 de julho, escrevi neste Correio que, com o Programa Mais Médicos, assessores do Planalto comemoravam que Dilma Rousseff finalmente havia encontrado a marca própria do governo. A estratégia apenas foi reforçada com a “importação” dos cubanos a partir de contrato com o país dos irmãos Castro, depois das dificuldades nas inscrições iniciais de brasileiros e estrangeiros.

Engana-se quem pensa que a controvérsia em torno da medida assusta Dilma. Quanto mais barulho melhor. A guerra entre os defensores e os críticos apenas cola a marca do Mais Médicos na petista, assim como o Bolsa Família está vinculado ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Se o Mais Médicos não for derrubado na Justiça e conseguir se concretizar, Dilma vai bater bumbo na campanha eleitoral. O ministro da Saúde, Alexandre Padilha, também estará na banda.

Fonte: Correio Brasiliense

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