quinta-feira, 12 de setembro de 2013

Roberto Freire homenageia Allende

Para o presidente do PPS, busca permanente pela transformação social deve caminhar ao lado da preocupação inegociável dos valores democráticos

Por: Valéria de Oliveira

O presidente nacional do PPS, deputado federal Roberto Freire (SP), homenageou, em discurso no plenário da Câmara, na tarde desta quarta-feira (11), o ex-presidente do Chile, o socialista Salvador Allende, cuja morte, ocorrida com o golpe militar comandado pelo general Augusto Pinochet, completa exatos 40 anos. Freire ressaltou que a data lembra também outra grande tragédia, os sequestros de aviões e subsequentes ataques terroristas às torres do World Trade Center, em Nova Iorque, que mataram cerca de 3 mil pessoas.

Allende foi eleito democraticamente e governou o Chile por três anos, numa coalizão de forças de esquerda e de centro-esquerda, com viés socialista. Após derrubá-lo, Pinochet mergulhou o Chile numa ditadura que durou 20 anos. Segundo Freire, “os ideais de Allende devem nortear os partidos e atores do campo progressista, cuja busca permanente pela transformação social deve caminhar ao lado da preocupação inegociável dos valores democráticos”.

Esquerdas

Na avaliação de Roberto Freire, as esquerdas que não têm na democracia um valor universal, “que ameaçam a independência entre os poderes constituídos ou tentam restringir a liberdade de imprensa, cujos exemplos mais contemporâneos podem ser encontrados no Brasil e em alguns vizinhos latino-americanos, não são herdeiras legítimas do pensamento político de Allende”. Essas forças representam, segundo o deputado, “uma contrafação ao que pregava o presidente deposto do Chile que, em nenhum momento, atentou contra as instituições democráticas e garantiu, até o derradeiro momento, que a democracia funcionasse a pleno vapor”.

A experiência vivenciada pelo Chile com Allende no início dos anos 70 pode render frutos até hoje, afirmou Freire. “A cobrança por educação de qualidade, melhores serviços de saúde, ética na política, dentre muitas outras demandas da sociedade tão atuais resgatam a memória do sonho chileno que, golpeado pela barbárie, terminou como pesadelo, mas permanecerá vivo em nossos corações”.

O presidente do PPS lembrou que o governo Allende teve “a ousadia” de apresentar à sociedade de seu país um plano que continha medidas como atendimento gratuito nos hospitais públicos, aprofundamento da reforma agrária, bolsa para estudantes de ensino básico, médio e universitário, criação de um sistema de previdência universal, dentre outras medidas. “Tudo isso, sem qualquer tergiversação quanto à importância de se preservar a ordem democrática e institucional”.

Leia abaixo íntegra do discurso

Discurso do deputado Roberto Freire – Quarenta anos do golpe no Chile e o legado de Allende

Quarenta anos após o fim trágico da experiência de um governo socialista eleito democraticamente no Chile, com o golpe que depôs o presidente Salvador Allende e sua morte em pleno palácio presidencial de La Moneda, as forças democráticas de esquerda se veem diante de um desafio do qual não devem abrir mão. As lições que devem ser tiradas daquele período, observadas hoje à luz de um maior distanciamento histórico, podem contribuir decisivamente para entendermos de que forma o socialismo se faz presente no cenário político atual e em que medida o pensamento progressista encontra ressonância diante das novas demandas do século XXI.

Derrubado, em 11 de setembro de 1973, por um golpe de estado liderado pelo chefe das Forças Armadas, general Augusto Pinochet, que mergulharia o Chile em um período sombrio e sanguinário pelas duas décadas seguintes, o governo Allende representou a inédita ascensão ao poder de uma coalizão de viés socialista. Denominado Unidade Popular, esse grupo reunia forças do campo político de esquerda e centro-esquerda e apresentava um programa de governo que defendia importantes transformações nas estruturas econômicas e sociais do país, sem que a ordem democrática e as instituições fossem violadas.

Reside justamente nesta preocupação com as balizas democráticas vigentes um dos compromissos básicos que deve ser seguido pelas forças de esquerda nos dias hoje. Allende e seu grupo de sustentação tiveram a ousadia de apresentar à sociedade chilena um plano que continha medidas como atendimento gratuito nos hospitais públicos, aprofundamento da reforma agrária, bolsas para estudantes dos ensinos básico, médio e universitário, criação de um sistema de previdência universal, entre várias outras. Mas sem qualquer tergiversação quanto à importância de se preservar a ordem democrática e institucional do país.

Entre os inúmeros obstáculos enfrentados por Allende para levar adiante seu projeto de governo, estavam setores da própria Unidade Popular refratários ao processo gradual de transformações sociais, considerado obediente aos marcos do que chamavam de “institucionalidade burguesa”, além dos agrupamentos tradicionalmente conservadores que se opunham frontalmente aos socialistas.

O desfecho trágico da experiência de um governo de esquerda no Chile, com o golpe militar e a morte de Allende após três anos no comando do país, não deve ser interpretado como uma prova cabal de que socialismo e democracia não podem caminhar juntos. Ao contrário: este talvez seja o maior legado que o episódio chileno tenha nos deixado. Preservar e fortalecer esse legado, 40 anos depois da queda de Allende, é uma obrigação moral de todos os democratas de esquerda.

No livro “Democracia e Socialismo”, de Alberto Aggio, publicado há 20 anos, curiosamente no momento em que o Chile dava os primeiros passos democráticos após a longa e nefasta ditadura de Pinochet, a discussão sobre a derrota da chamada Via Chilena se dá sob o enfoque da aparente oposição entre democracia e socialismo. O autor investiga os fatores que levaram à queda do governo Allende e analisa suas dificuldades internas, ao mesmo tempo em que esclarece que se tratou de uma experiência específica, com características e contexto histórico próprios, que não se aplica necessariamente ao conjunto das experiências envolvendo a esquerda no próprio Chile e em outros países.

Dada a realidade dos dias atuais, é evidente que a experiência chilena não se aplica mais. Entretanto, entre os pontos mais inovadores que podem ser aproveitados como legado daquele período, talvez o mais importante seja o conceito do reformismo forte, ideia que passou a ser defendida pelo Partido Comunista Italiano (PCI). Secretário-geral do PCI, Enrico Berlinguer propôs, logo após o golpe que derrubou o então presidente do Chile em 1973, o compromisso histórico entre as forças majoritárias (democratas-cristãos, socialistas e comunistas), com o intuito de “modificar gradualmente as orientações de base de tais forças políticas e, muito particularmente, da Democracia Cristã, para impulsioná-las de encontro com os comunistas, evitando, assim, o risco de uma reação direitista que, inclusive, poderia ter o apoio das massas”, como escreveu a jornalista Maria José Orbegozo, especialista em política italiana, em texto publicado em 1981.

Quatro décadas se passaram desde o golpe, mas os ideais de Allende devem nortear os partidos e atores políticos do campo progressista, cuja busca permanente pela transformação social deve caminhar ao lado da preocupação inegociável com os valores democráticos. Nós, do PPS, oriundos do Partido Comunista Brasileiro (PCB), acreditamos na construção de uma sociedade mais justa e menos desigual. Para tanto é fundamental que se continue buscando maior igualdade e se preze a democracia como valor inviolável e universal.

As esquerdas que não têm a democracia como valor universal, que ameaçam a independência entre os poderes constituídos ou tentam restringir a liberdade de imprensa, cujos exemplos mais contemporâneos podem ser encontrados em alguns de nossos vizinhos latino-americanos e, por que não, aqui entre nós, no Brasil, não podem ser consideradas herdeiras legítimas do pensamento político de Allende. Representam, na realidade, uma contrafação ao que pregava o presidente deposto do Chile, que em nenhum momento atentou contra as instituições democráticas e garantiu, até o derradeiro momento, que a democracia chilena funcionasse a pleno vigor.

A curta experiência socialista vivenciada por nossos irmãos chilenos no início dos anos 1970 pode render bons frutos até hoje. A cobrança por educação de qualidade, melhores serviços de saúde, ética na política, entre muitas outras reivindicações tão atuais, resgatam a memória do sonho chileno que, golpeado pela barbárie, terminou como pesadelo. Mas que sempre permanecerá vivo em nossos corações e mentes.

Fonte: Portal PPS

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