terça-feira, 15 de outubro de 2013

O espólio de Marina - Tereza Cruvinel

O espólio de Marina Silva é de pelo menos 40 milhões de votos. Conquistá-los tornou-se meta
de todos os candidatos. As migrações agora identificadas ainda são precoces e voláteis

No cenário da pesquisa Datafolha em que a ex-senadora Marina Silva seria candidata a presidente, ela alcança 29% de preferência, única situação em que a disputa iria para o segundo turno. Considerando o eleitorado de 2012, que foi de 138 milhões, Marina teria deixado um espólio de pelo menos 40 milhões de votos ao sair da corrida. A pesquisa apurou alguns movimentos migratórios, mas eles ainda são precoces e voláteis, seja pela proximidade dos fatos que excluíram a ex-senadora da disputa, seja pela distância da eleição. Mas a conquista destes eleitores tornou-se agora meta fundamental para todos os candidatos. Especialmente para Eduardo Campos, que Marina buscou beneficiar com a formação da coligação informal entre o PSB e a Rede, ainda não legalizada.

Os diferentes cenários propiciaram leituras favoráveis a todos, mas, passando os números pela peneira fina das circunstâncias partidárias, o que sobra é o cenário mais provável, em que a oposição teria dois candidatos, Aécio Neves (PSDB) e Eduardo Campos (PSB), possibilitando a reeleição da presidente Dilma Rousseff em primeiro turno. Por isso mesmo, Dilma tratou de declarar ontem que não está de salto alto, que todas as postulações são legítimas, mas que ela mesma está tratando é de governar. Um esforço para neutralizar a derrapada de seu marqueteiro João Santana, que previu uma “autofagia entre os anões” na véspera da união Marina–Eduardo. E foi exatamente Dilma, segundo o Datafolha, que neste primeiro momento recebeu a maior fração do espólio de Marina: 42%, contra 21% herdados por Aécio e 15% por Campos. Tal dispersão mostra que a senadora tem baixa capacidade de transferir votos, indicando um candidato, traço forte do ex-presidente Lula. Restariam ainda 22% de votos marinistas, se tal divisão fosse definitiva. Mas não é. Há eleitores de Marina ainda mal informados sobre seu movimento, ou ainda em fase de assimilação da aliança. Logo, a pescaria está apenas começando. Por isso mesmo, a ex-senadora tratou ontem de bater duro em Dilma. Lembrou os legados de Fernando Henrique e Lula, mas disse que a marca do governo Dilma é o retrocesso.

A disputa pelo espólio é o que também explica a aparente ambivalência de Marina e Eduardo Campos, quando dizem que o cabeça de chapa será escolhido em 2014. O candidato será ele e isso foi devidamente pactuado na noite da aliança. “Para nós, é importante que Marina continue sendo vista como eventual candidata, enquanto sua imagem vai sendo colada à de Eduardo, impulsionando a migração de seus eleitores. Não temos pressa, isso virá naturalmente”, diz o deputado Beto Albuquerque, um dos artífices da coalizão informal, lembrando que, só com o primeiro lance, Eduardo saltou de 8%, na pesquisa anterior, para 15%.

De fato, ele é o herdeiro legitimado, mas a figura do dono de eleitor ficou na República Velha. E tudo indica que o eleitorado de Marina é heterogêneo, o que favorece a dispersão. Os ex-petistas que estavam com ela por decepção com o partido podem refluir para Dilma. Boa parte fez isso em 2010, no segundo turno. Os que são organicamente ligados à questão da sustentabilidade devem ser mais propensos a segui-la para onde for, embora tenham críticas às praticas do governo Eduardo Campos em Pernambuco nesta área. Os que, na pesquisa, migraram para Aécio, talvez estejam buscando o candidato com mais chances de derrotar Dilma e o PT. Mantendo-se na segunda posição, Aécio poderia ampliar a herança. Sobre este cardume heterogêneo e agitado pelo movimento recente das águas, todos agora vão lançar anzóis e redes.

Que diz o procurador?
Munido de alguns exemplares de jornais, inclusive o do Correio que trazia a matéria sobre a validação da assinatura de um motor para a criação do Solidariedade, o deputado Francisco Escórcio foi à tribuna da Câmara ontem cobrar um posicionamento do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, diante dos tantos vícios já confirmados na criação de partidos. Acresceu mais uma denúncia, a de que Bruno Dantas Nascimento, ex-integrante do Conselho Nacional de Justiça, identificou uma assinatura sua que não fez e foi validada para um dos partidos. “Creio que o procurador não deixará de pedir a anulação dos atos do TSE que viabilizaram estes partidos”, disse o deputado. Restaria ao TSE um problemão: como ficariam os deputados que se filiaram às novas siglas, agora que o prazo de refiliação já passou?

Duas ausências
Classificando pela primeira vez os entrevistados segundo a tendência ideológica, o Datafolha concluiu que direita e esquerda têm aproximadamente o mesmo tamanho no Brasil. Entretanto, na disputa presidencial em curso, até agora, não apareceu um candidato autodeclarado de direita. Dilma Rousseff, Aécio Neves e Eduardo Campos–Marina Silva habitam, todos, o centro do espectro, com inclinações para um lado e outro, em função das alianças. Continua faltando, também, um candidato esquerdista no elenco. “Existe esta lacuna mas não irei preenchê-la. Vou ajudar o PSol a ampliar sua bancada na Câmara”, diz o deputado Chico Alencar, já cogitado para o papel.

Boletim
Na queda que sofreu há alguns dias, o ex-presidente José Sarney fraturou uma vértebra. Mas isso só foi descoberto ontem, quando acompanhava dona Marly em uma cirurgia de joelhos. Ontem mesmo, ele passou a usar um colete de aço. Serão 60 dias com restrição de movimentos físicos. Não políticos, com certeza.

Fonte: Correio Braziliense

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