quinta-feira, 21 de novembro de 2013

Do encantado à Papuda - Tereza Cruvinel

Os ministros do STF parecem ter lavado as mãos, delegando todas as providências relacionadas ao cumprimento de penas dos condenados da ação penal 470 à decisão monocrática do ministro presidente Joaquim Barbosa. Na sessão de ontem, nenhum deles abordou o assunto ou questionou os procedimentos adotados, que vêm tendo a legalidade questionadas por juristas e políticos. Estariam todos extenuados pelo julgamento e decididos a evitar novos e desgastantes conflitos com Barbosa, ouve-se de interlocutores de alguns deles. Por ora, evitarão questionar Barbosa inclusive em relação ao pedido de prisão domiciliar a José Genoino, embora alguns estejam sensibilizados. “Vou decidir logo”, afirmou o ministro, de relance, ao advogado de defesa que o abordou no intervalo da sessão.

O tempo, no caso de Genoino, pode ser decisivo. Embora muda em relação às prisões, até a presidente Dilma permitiu-se ontem manifestar preocupação com a situação dele. Têm circulado informações incompletas ou imprecisas sobre seu estado de saúde. Ora dizem que ele fez uma cirurgia cardíaca, ora que sofreu uma isquemia cerebral. É tudo isso e algo bem mais grave. Já tendo colocado stents no coração, no ano passado, por conta de bloqueios coronarianos, este ano Genoino sofreu uma deseccção da aorta. Isso significa o descolamento das duas paredes da principal artéria do corpo humano, que sai do coração levando o sangue bombeado para outros vasos. Quando ela se rompe, por conta de aneurisma ou de deseccção, a caudalosa hemorragia interna causa morte imediata. Genoino, que estava em Ubatuba quando passou mal, conseguiu chegar vivo a São Paulo, antes da ruptura, sendo operado imediatamente. Mais de 10cm de aorta danificada pela ocorrência foram trocados por uma prótese, algo como uma mangueira plástica. Ela é que tem garantido sua sobrevivência. Stents, próteses internas, marcapassassos e similares precisam ser monitorados para não se deslocarem ou romperem. A pressão arterial elevada pode contribuir para isso. Ele é hipertenso, teve picos de pressão alta na viagem e na primeira noite na Papuda. Isso está documentado, os laudos são minuciosos. Inclusive os periciais, feitos agora a pedido da Justiça. A informação correta sobre seu quadro de saúde é importante para a decisão de Barbosa e para afastar suspeitas de que se trate de “manobra” para sair da prisão.

Fora isso, a prisão de um homem como Genoino, nestas condições, tem algo de desconcertante, embora externar isso não seja de bom tom, e por isso poucos o fazem. O tempo continua sendo de pensamento e sentimento único. E o pensamento e o sentimento corretos parecem ser o de aprovar e aplaudir. Como todos os ministros que o julgaram o condenaram, exceto Ricardo Lewandowski e inclusive Toffoli, que serviu ao governo Lula, estão sendo coerentes na indiferença. Genoino foi condenado por corrupção ativa por, supostamente, ter participado de um esquema de “compra de votos” no Congresso. Afinal, ele era o presidente do PT, embora não tenham surgido provas de que ofereceu “vantagem indevida” a este ou aquele deputado. Foi condenado por formação de quadrilha por ter assinado promissórias de empréstimos tomados pelo PT junto ao Banco Rural. À CPI dos Correios, ele disse ter concordado com a operação de crédito proposta por Delúbio para atender às urgências financeiras de um partido endividado, apostando na nova cota do fundo partidário, que é paga semestralmente. Antes o partido tinha 45 deputados. Em 2002, elegeu 92. Logo, passaria a receber em dobro. E de fato, as cotas serviram para saldar os primeiros empréstimos. Hoje a cota do PT é de mais de R$ 2 milhões mensais. Mas as demandas financeiras prosseguiram, e novos empréstimos foram feitos, já em nome das empresas de Valério. Embora condenado como corruptor e quadrilheiro, Genoino continuou vivendo modestamente, na casa do Butatã onde, por falta de espaço, cultiva um jardim vertical, em vasos colados no muro lateral.

No final de 2006, depois do alarido do mensalão em 2005, e da inclusão de seu nome entre os 40 denunciados pelo procurador-geral Antonio Fernando ao STF, Genoino visitou seus pais, que continuam vivendo como camponeses num distrito de Quixeramobim (CE). Na noite de Natal, seu pai, já octogenário, pediu licença para lhe dizer que não conseguia entender a vida do filho, segundo relato do próprio Genoino: “Você vivia aqui no Encantado com a gente, trabalhando na roça. Aos 13 anos, com a ajuda do padre, foi estudar em Senador Pompeu. Foi para a faculdade em Fortaleza, pensamos que ia virar doutor. Mas você largou tudo e foi fazer guerrilha contra os militares. Foi preso, sofreu tudo aquilo. Mais tarde entrou para o PT, virou deputado e amigo do Lula. Agora vai ser preso de novo? Que crime é este que você cometeu”. Para o velho camponês, e para quem conhece Genoino, não é mesmo fácil compreender.

Rebelião contra Dilma
Desta vez, dificilmente o veto da presidente Dilma deixará de ser derrubado pela Câmara. A aprovação do projeto que autoriza a criação de novos municípios foi negociado com o Planalto, que sabia de sua aprovação. Mas, diante das desconfianças do mercado em relação à situação fiscal, com o superávit primário a caminho de não ser cumprido este ano, Dilma vetou o projeto em nome da contenção de gastos. “Este pretexto não cola, porque as transferências federais aos estados não vão aumentar, vão apenas ser distribuídas entre um numero maior de municípios”, protesta o deputado Francisco Escórcio (PMDB-MA). “Foi um erro. A redivisão municipal contribui para reduzir desigualdades regionais. Haja vista que estados com mais municípios têm melhor IDH”, acrescenta Evandro Milhomem (PCdoB-AP). “Governo que rompe acordo acaba perdendo a confiança dos aliados”, diz ainda Paulo Wagner (PV-RN).

Mais rede
Depois do perfil de Dilma, entrou na rede Facebook ontem o perfil do Palácio do Planalto. Estreou falando dos pactos que ela propôs para responder às manifestações.

Fonte: Correio Braziliense

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