sábado, 21 de dezembro de 2013

O peso da Copa no bolso

Para BC, Mundial e Olimpíadas elevarão inflação em 2 pontos percentuais ao longo de 10 anos

Gabriela Valente

BRASÍLIA - A Copa do Mundo de 2014 e as Olimpíadas de 2016 contribuirão para pressionar os preços no Brasil. Em estudo divulgado ontem, o Banco Central (BC) estimou, pela primeira vez, o impacto dos grandes eventos esportivos no Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA, usado nas metas de inflação do governo). E concluiu que o Mundial e os Jogos vão elevar em dois pontos percentuais o IPCA ao longo de 10 anos. Os cálculos do BC levam em consideração o período entre 2007, data em que foi anunciado que o Brasil sediaria a Copa do Mundo de Futebol de 2014, e um ano após a realização dos Jogos Olímpicos de 2016, ou seja, 2017, quando a pressão dos eventos se dissiparia.

“Megaeventos esportivos, como Jogos Olímpicos e Copa do Mundo de Futebol, podem ter impactos significativos na economia do país anfitrião”, diz o texto do BC. “Enquanto o evento em si tem duração de algumas semanas, os preparativos têm início vários anos antes e envolvem investimentos que podem ter efeitos econômicos de longo prazo.”

Impacto maior no Brasil
Segundo o estudo, o comportamento dos preços no Brasil será pior do que o visto em outros países que sediam grandes eventos esportivos, porque, aqui, haverá a coincidência de duas grandes competições em um curto período de tempo. Normalmente, os países que recebem um evento têm um impacto que chega a um ponto percentual na inflação.

O estudo sobre o impacto das competições nos preços foi divulgado ontem, junto com o relatório trimestral de inflação, que traçou um cenário um pouco mais pessimista para a economia brasileira neste e no próximo ano. Segundo o relatório, o Brasil não deve avançar no crescimento em 2014 e ainda terá de lidar com uma inflação persistente nos próximos dois anos. A projeção do Banco Central para a expansão do Produto Interno Bruto (PIB, conjunto de bens e serviços produzidos no país) neste ano caiu de 2,5% para 2,3%, ritmo que deve ser mantido até o terceiro trimestre do ano que vem. Já o IPCA deve encerrar o ano em 5,8%. Em 2014, último ano do governo Dilma, o IPCA cairia para 5,6% nas previsões do BC, e chegaria a 5,4% em 2015, longe do centro da meta, que é de 4,5% ao ano. O relatório, na visão de analistas, sugere que a autarquia pode subir mais os juros do que o previsto pelo mercado.

O Comitê de Política Monetária (Copom) do BC já elevou a taxa básica de juros Selic por seis vezes seguidas. A última elevação foi de meio ponto percentual, para 10%.
A palavra “convergência” para a meta de 4,5% foi retirada do texto do relatório. Mas o diretor de Política Econômica, Carlos Hamilton Araújo, reforçou que o BC permanecerá de olho no combate à inflação:

— Está bastante claro, mas vou ajudar vocês dessa vez. Isso quer dizer que o Copom vai permanecer de olho no combate à inflação. (...) O cenário mais provável não aponta essa convergência (para o centro da meta), o que não implica que não seria possível. Vamos aguardar. Eu entendo sim que esse quadro pode mudar para melhor, pode se tornar mais benigno. Projeção não é promessa. É projeção — disse.

O mercado viu nas declarações do diretor do BC um recado de que os juros subirão por mais tempo:

— Acho que o Carlos Hamilton deixou claro que o aumento (de juros) de janeiro não será o último, porque o BC está realmente preocupado e prefere já fazer o ajuste no primeiro trimestre, que promete ser o mais tenso do ano — analisou o economista-chefe da corretora Gradual, André Perfeito, que mesmo antes do relatório trimestral de inflação, divulgado ontem, já previa mais duas altas de juros.

Segundo o economista-chefe do Credit Suisse, Nilson Teixeira, o BC foi mais duro no discurso agora e, com isso, aumentou a probabilidade de um ciclo de aperto maior do que era esperado antes: mais uma alta de 0,25 ponto percentual na reunião de janeiro, quando os juros básicos chegariam a 10,25% ao ano.

“O relatório de inflação veio um pouco mais hawkish do que o documento anterior, sinalizando que o ciclo de aperto adicional em 2014 pode ser de uma magnitude maior ou mais prolongado do que o que está incorporado em nosso cenário”, avaliou o economista em comunicado.Hawkish (falcão em inglês), no jargão dos economistas, significa uma postura mais dura na condução da política monetária.

Risco de 27% de não cumprir meta
Dentro das previsões divulgadas ontem, o Banco Central trabalha com uma probabilidade de 27% de não conseguir manter a inflação dentro do limite de dois pontos de tolerância da meta de inflação, ou seja, 6,5% tanto para 2014 quanto para 2015.

No relatório, o BC defendeu mais uma vez que o governo faça uma economia para pagar juros que impeça o crescimento da dívida pública. E aposta que a política fiscal caminha para essa neutralidade.

No curto prazo, o BC está mais pessimista em relação ao crescimento. E a agropecuária é a responsável. A estimativa para expansão do setor caiu de 10,5% para 7,3% e o setor de serviços deve crescer apenas 2%. A aposta anterior era de 2,3%. Essas reduções neutralizaram o otimismo em diversos outros setores, como indústria, consumo das famílias e do governo e para o investimento. A indústria, por exemplo, conta com o câmbio mais favorável, a redução de custos por causa da folha de pagamentos e a desaceleração da alta do custo de mão de obra.

Fonte: O Globo

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