sábado, 14 de dezembro de 2013

O PT constrange o Planalto, de novo

Em gesto que desagrada ao governo, petistas voltam a homenagear condenados pelo Supremo no julgamento da Ação Penal 470. Apesar de a maioria dos ministros do STF terem sido indicados por Dilma e Lula, militância faz ataques à Corte

Amanda Almeida e Paulo de Tarso Lyra

A contragosto do Palácio do Planalto e dos estrategistas da campanha de reeleição da presidente Dilma Rousseff, o PT voltou ontem a dividir o debate sobre a renovação do partido com as homenagens aos petistas presos no processo do mensalão. Depois de constranger o governo ao exaltar os condenados diante de Dilma, que participava da abertura do evento na noite de quinta-feira, os militantes do partido fizeram ontem o ato oficial de desagravo ao ex-ministro José Dirceu, ao ex-tesoureiro Delúbio Soares, ao ex-deputado José Genoino e ao deputado João Paulo Cunha, colocando-os como “heróis da legenda”.

Com ataques ao Supremo Tribunal Federal (STF) e à imprensa, os petistas voltaram a se colocar como injustiçados e vítimas de um processo político, mas em nenhum momento citaram que, dos 11 ministros do Supremo, oito foram nomeados por Dilma ou Luiz Inácio Lula da Silva. No ato, parentes dos três presos e o próprio Cunha foram saudados aos gritos de “Dirceu, guerreiro do povo brasileiro”, seguidos com a mesma frase, mas com o nome dos outros. Cunha foi o mais enfático no discurso. Disse que “alguns” querem afastar o tema das eleições, mas que é uma “besteira”. “Usaram em 2006, em 2008, em 2010, em 2012. Vão usar em 2014 e sempre. Mensalão virou como um produto na prateleira que, quando eles não tiverem mais nada para falar de nós, tiram da prateleira.”

A repetição do desagravo não agradou ao Planalto. O presidente do partido, Rui Falcão, tentou negar a saia justa. “Não vi nenhum constrangimento na presidente. Ela estava contente, tirando fotos. Ela não me mostrou o discurso dela nem eu o meu”, disse Falcão, que citou o mensalão em sua fala e criticou o STF, formado hoje por maioria indicada pelos governos petistas. Já Dilma se limitou a listar conquistas do PT nos últimos anos e fez cara séria enquanto o colega falava sobre a Ação Penal 470.

No Planalto, a menção ao tema foi considerada quebra de acordo. E o descontentamento da presidente ficou explícito nas imagens expostas nos dois telões. Ontem, o porta-voz da Presidência, Thomas Traumann, esteve no congresso e se reuniu com integrantes da comunicação do partido. Segundo o novo secretário de Comunicação da legenda, José Dias, a conversa foi para “melhorar” a sintonia entre partido e governo.

O Correio apurou que o governo aproveitou o encontro para desenhar uma linha entre o que é a comunicação do PT e o que é a do governo. A preocupação é deixar claro que as manifestações do partido — especialmente no que se refere ao julgamento do mensalão — não encontram ecos no governo. E que cada uma das partes terá o seu papel institucional bem definido nessa política de comunicação. A necessidade de separação ficou ainda mais clara após uma recente pesquisa de opinião mostrando que 87% do eleitorado do PT são favoráveis à prisão dos petistas envolvidos no mensalão.

Exceção
O ato de desagravo deu voz a parentes dos condenados. Emocionada, a filha de Dirceu, Joana Saragoza, leu uma carta e também criticou o STF. “Todos sabem que o julgamento foi marcado pela exceção e com vários objetivos de atingir o partido que ousou mudar a realidade e governar para a maioria. O Supremo violou importantes garantias constitucionais para levar ao banco de réus e à cadeia importantes líderes do nosso partido.” O vereador de Goiânia Carlos Soares, irmão de Delúbio, falou pela família. E o deputado e líder da bancada petista na Câmara, José Guimarães, irmão de Genoino, discursou a favor do ex-deputado.

Em outro momentos de constrangimento para o governo, houve uma mesa de debates com líderes de segmentos sociais e intelectuais. O coordenador nacional do Movimento Sem Terra (MST), João Paulo Rodrigues, disse que é mais fácil marcar audiência com o papa do que com Dilma. “O governo vai acabar o ano tendo assentado apenas 150 famílias. Qualquer hora, vamos chamar a (senadora) Kátia Abreu (do PMDB-TO, uma das líderes da agropecuária), que fala com a Dilma toda hora, para intermediar um encontro com ela”, ironizou.

Hoje, principal dia de debate do evento, pode haver mais constrangimento proporcionado pelo PT ao governo. Os militantes vão votar o texto-base do encontro, que promete polêmica. O documento foi elaborado pelo deputado Ricardo Berzoini e pelo assessor especial para assuntos internacionais da Presidência, Marco Aurélio Garcia, mas, ao longo do encontro, os militantes apresentam emendas. Há pelo menos 10 que não têm consenso e serão votadas. Uma delas diz respeito ao principal aliado do partido, com quem vive uma relação de gato e rato, o PMDB. A emenda entende que a legenda é conservadora e pretende acabar com alianças prioritárias com ela.

Fonte: Correio Braziliense

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