segunda-feira, 10 de fevereiro de 2014

Luiz Carlos Azedo: Três frentes da batalha

Costuma-se explicar as diferenças entre uma guerra de posições e uma guerra de movimentos comparando-se a Primeira com a Segunda Guerra Mundial, na qual os alemães surpreenderam a Europa com a velocidade e poder de fogo de suas blitzkriegs (guerra-relâmpago) contra as velhas fortificações dos Aliados, como a Linha Maginot, que fora construída pelos franceses na década de 1930 para proteger suas fronteiras com a Alemanha e a Itália. Aqui no Brasil, um bom exemplo é a Guerra dos Farrapos (1835-1845), na qual os republicamos gaúchos desafiaram a Corte Imperial. O escritor gaúcho Tabajaras Ruas, no romance Varões assinalados, descreve a longa guerra de cavalarias, na qual os farrapos só foram derrotados depois que o gênio militar de Luís Alves de Lima e Silva, então Barão de Caxias, mudou a estratégia das tropas federais, que até então se baseava na supremacia da artilharia e da infantaria. Ao trazer para o seu lado o general farrapo Bento Manoel com sua cavalaria, Caxias derrotou as tropas de Bento Gonçalves, o líder dos revolucionários da República de Piratini. Não foi à toa que somente as tropas gaúchas conseguiram derrotar os jagunços de Antônio Conselheiro na quarta campanha da Guerra de Canudos.

Os conceitos de guerra de posições e guerra de movimentos também são empregados na análise política. Deve-se isso ao marxista italiano Antônio Gramsci, ao mostrar que as tentativas de imitar os revolucionários russos, que tomaram o poder de assalto em 1917, resultariam em fracasso na Itália e em outros países do Ocidente com estruturas sociais mais complexas. Grosso modo, porém, podemos usar os conceitos nas análises eleitorais. As vitórias de Jânio Quadros, em 1960; de Collor de Mello, em 1989; e de Luiz Inácio Lula da Silva, em 2002, são casos típicos de campanhas com características de guerras de movimentos. Já a reeleição do presidente Lula, em 2006; e da presidente Dilma Rousseff, em 2010, se caracterizariam mais como guerras de posições, nas quais uma grande parcela do eleitorado, que até então oscilava de um lado a outro nas eleições, já estava posicionada no pleito: a população pobre beneficiada pelo programa Bolsa Família e outras políticas de transferência de renda. Trata-se de 13,5 milhões de famílias.

Coalizão
Estamos às vésperas de mais uma eleição com características aparentes de guerra de posições. Preparam-se para o confronto uma ampla coalizão de governo, que controla a União e a maioria dos governos estaduais, representada pela presidente Dilma Rousseff e seu vice, Michel Temer (PMDB), com apoio do ex-presidente Lula. E oposições encasteladas no Sul e Sudeste (principalmente São Paulo, Minas e Paraná), cujo candidato, o ex-governador e senador mineiro Aécio Neves (PSDB), é apoiado pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardozo; e no Nordeste, sobretudo Pernambuco, cujo governador, Eduardo Campos (PSB), é candidato e tem o apoio da ex-senadora Marina Silva. Com essa disposição de forças, a disputa só deverá se resolver no segundo turno. A presidente Dilma Rousseff vai à guerra, pois, em duas frentes de batalha, com uma postura mais ofensiva do que defensiva, uma vez que o PT pretende não somente reelegê-la, mas conquistar os governados de São Paulo, Minas e Paraná. Sem falar de Pernambuco, onde não tem candidato próprio, mas apoia um aliado. Ou seja, pretende cercar e aniquilar a oposição.

Redes sociais
Ocorre, porém, que a estratégia de guerra de posições que orienta a campanha oficial pode não ser o bastante para vencer as eleições, principalmente no segundo turno. Há uma terceira frente de batalha, irregular, com características de guerra de movimentos, ou seja, Dilma enfrenta um tipo de nova oposição, à margem das esferas de poder e dos partidos, que emergiu das redes sociais em junho do ano passado e permanece viva nos grandes centros urbanos do país. Desta vez, não é a grande massa de pobres excluídos, nem a classe média empobrecida o imponderável na eleição, mas um contingente de 50 milhões de jovens entre 15 e 29 anos, a maioria pobre, dos quais 10 milhões não estudam nem trabalham. São descolados em sua maioria dos partidos políticos, mas servem de base social para essa nova oposição. Ninguém sabe para onde o contingente de eleitores que emerge dessa juventude pretende ir. É um campo de disputa tanto para Dilma e como para os dois candidatos de oposição, que buscam um discurso em sintonia com esses novos atores e a adesão eleitoral de seus líderes.

Enquanto se discute o passado e o presente, esses jovens querem antecipar o próprio futuro, o que é sempre a forma de traduzir os sonhos de uma geração. Ocorre que ele está comprometido por fragilidades fiscais, deficiências de infraestrutura, falta de investimentos, educação deficiente, dificuldades de acesso à cultura e ao lazer e a oferta de empregos mal-remunerados ou que exigem alta qualificação, daí tanta insatisfação.

Fonte: Correio Braziliense

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