quinta-feira, 17 de abril de 2014

Nestor Cerveró: Não enganei Dilma de forma nenhuma

André Borges e Rafael Bitencourt - Valor Econômico

BRASÍLIA - O ex-diretor da área internacional da Petrobras, Nestor Cerveró, afirmou nesta quarta-feira, durante audiência pública na Comissão de Fiscalização Financeira e Controle da Câmara dos Deputados, que a polêmica cláusula de saída (put) que a presidente Dilma Rousseff disse desconhecer em relação à aquisição de Pasadena é “mais do que comum” em contratos da Petrobras.

Cerveró disse que não teve a intenção de enganar a presidente Dilma Rousseff. “De forma nenhuma. Não há nenhum sentido em enganar ninguém”, afirmou. “Não existem decisões individuais, nem na diretoria nem no conselho da Petrobras”.

Cerveró chegou a dizer que tanto a sócia belga Astra quanto a Petrobras tinham direito à cláusula put. Ele só não detalhou, porém, se a Petrobras também teria direito a um ágio de 20% sobre o valor negociado, caso a put tivesse sido exercida pela estatal brasileira.

O ex-diretor da área internacional da Petrobrasafirmou que a cláusula Marlim – que Dilma também disse desconhecer – foi uma defesa da Astra para a transferência do lucro da produção, por conta do volume de petróleo que seria refinado da Petrobras. “A cláusula Marlim nunca foi usada. Ela não significou nenhum risco para a Petrobras”, disse.

Cerveró ainda não esclareceu na audiência pública se as cláusulas foram omitidas do resumo executivo do empreendimento, mas deixou claro que era cláusulas irrelevantes para mudar a posição do conselho da Petrobras em aprovar o negócio.

Roda
Cerveró disse que a companhia não “inventava a roda” ao tomar a decisão de investir em refinaria de petróleo nos Estados Unidos, no início dos anos 2000. “Em 2005, a compra uma refinaria e adaptá-la ao processamento de óleo pesado estava totalmente alinhada à estratégia da Petrobras”, disse o ex-diretor.

Cerveró afirmou que o planejamento estratégico da Petrobras apontava para a expansão de refino no exterior já em 2000 envolvendo o processamento de petróleo pesado produzido no Brasil. A escolha dos EUA veio como forma de aproveitar o potencial do grande mercado consumidor americano.

Ele destacou que as grandes petroleiras internacionais já estão nos EUA e a Petrobras seria apenas mais uma delas. Neste contexto, surgiu a oportunidade de comprar a refinaria de Pasadena, considerada “perfeitamente integrada ao planejamento estratégico” da Petrobras.

Cerveró defendeu na audiência pública que a entrada da estatal nos EUA era um “movimento natural” de mercado. “Sabíamos que o mercado americano é um consumidor voraz de petróleo”, disse o ex-diretor.

Além de estar atento à oportunidade propiciada pelo mercado americano, havia o entendimento de que seria possível aproveitar as facilidades que a Petrobras teria por já contar com a presença na produção no Golfo do México. Com isso, Cerveró considera que a companhia brasileira teria uma atuação “verticalizada”, cuidando das etapas de produção e refino do óleo a ser processado.

Segundo o ex-diretor, o cenário do petróleo brasileiro em 2005 estava apoiado no refino de petróleo pesado, que demanda mais investimento em seu processamento que o óleo leve. A meta era refinar 300 mil barris de petróleo pesado no exterior.

Ao rememorar as etapas de negociações para a compra de Pasadena, Cerveró informou que em 23 de fevereiro de 2005 foi recebida carta da Astra propondo parceria para refino. Já na época não foi oferecida venda completa da refinaria, mas uma “parceria no negócio”.

Havia o acordo de confidencialidade entre Astra e Petrobras, assinado em 27 de março de 2005, segundo o ex-diretor. Com o memorando de entendimento de 4 de maio de 2005, ficou prevista a utilização de 70 mil barris por dia de refino de petróleo pesado brasileiro.

Segundo Cerveró, a diretoria aprovou de forma colegiada a oferta de aquisição de 70% de Pasadena em 18 de agosto de 2005. Naquele mesmo mês a Astra ofereceu a venda de 70% da refinaria por US$ 475 milhões ou 60% por US$ 407 milhões. No mês seguinte teve início o processo de negociação.

Ele lembrou que o negócio foi auditado pelo Citigroup em novembro de 2005. No mês seguinte, a operação foi fechada no valor de US$ 189 milhões pela refinaria e US$ 170 milhões pela comercializadora e seus estoques. Cerveró disse que, em fevereiro de 2006, a diretoria da Petrobras aprovou o negócio por US$ 359 milhões e submeteu sua decisão ao conselho de administração.

Festa
A aquisição de 50% de Pasadena veio em fevereiro em 2006. Segundo Cerveró, houve festa no Texas para comemorar a compra. Na comemoração, o ex-presidente da Petrobras, José Sergio Gabrielli, foi recebido pelo governador do Texas para comemorar fechamento de negócio.

Durante sua apresentação, Cerveró defendeu a compra de Pasadena. Segundo ele, todas as refinarias dos EUA são antigas, sendo a mais nova de 1976. Ele assegurou que Pasadena tinha todas as condições para expansão de refino da companhia brasileira.

Pagamento
Cerveró confirmou a informação dada ontem pela presidente da empresa, Graça Foster, sobre o preço de aquisição da refinaria de Pasadena pela sócia Astra.

Até agora, os números davam conta de que a Astra teria pago US$ 42,5 milhões pela operação da refinaria, que pertencia a Crown. O valor total, no entanto, conforme mostrou Graça e hoje defendeu Cerveró, teria sido de cerca de US$ 360 milhões.

Durante a sua exposição, ele apresentou um histórico sobre as negociações. Disse que em fevereiro de 2006 começaram ao estudos para ampliar a capacidade de refino de Pasadena. Os projetos de ampliação foram concluídos em agosto de 2006.

Cerveró disse que a Petrobras tinha planos de dobrar capacidade de refino, chegando a 200 mil barris por dia. A diretoria da Petrobras aprovou planos de dobrar a capacidade de refino em setembro e um membro da Astra na sociedade aprovou o plano, mas a “alta direção” se recusou a investir no projeto, disse.

Em setembro de 2007, teve início a negociação para compra dos 50% restantes de Pasadena. A Petrobras propôs inicialmente US$ 550 milhões para a Astra, que queria US$ 1 bilhão. Em fevereiro de 2008, a diretoria da Petrobras aprovou proposta de US$ 700 milhões para comprar toda a refinaria mais outros US$ 98 milhões que estavam atrelados a custos da primeira etapa. O conselho administrativo então resolveu não aprovar o aporte total de US$ 798 milhões da segunda etapa, por conta de decisão de refinar no Brasil.

Segundo Cerveró, o custo total da refinaria de Pasadena foi de US$ 555 milhões, envolvendo mais US$ 343 milhões pela trading e custo de garantias bancárias de US$ 156 milhões. O custo total da aquisição de Pasadena atingiu US$ 1,23 bilhão.

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