quinta-feira, 26 de junho de 2014

Luiz Carlos Azedo: Líderes da transição

• Sarney revelou-se um dos mais sagazes líderes políticos do país, capaz de se adaptar às circunstâncias e se antecipar aos fatos. Como agora, ao anunciar a aposentadoria, para evitar uma provável derrota eleitoral no Amapá

- Correio Braziliense

Dois dos principais remanescentes da geração de políticos que comandou no Congresso a transição à democracia estão saindo de cena nestas eleições. O ex-governador do Rio Grande do Sul Pedro Simon (PMDB) resolveu pendurar as chuteiras desde o ano passado, é uma espécie de guardião da ética no Senado, onde tornou-se um Dom Quixote a investir contra os acordos e práticas políticas fisiológicas, inclusive de seu próprio partido. A surpresa foi a decisão do ex-presidente José Sarney (PMDB-MA), que é uma espécie de patriarca do chamado "presidencialismo de coalizão". Nesta semana, desistiu de disputar mais um mandato. Sai de cena depois de receber uma vaia ao lado da presidente Dilma Rousseff, no Amapá, estado que por três vezes o elegeu ao Senado. Dos três políticos, porém, é o que ainda preserva poder de fato na União, com influência real no Congresso, no Executivo e até mesmo no Judiciário.

O pregador
Simon foi eleito senador na leva de 1978, depois de três mandatos de deputado estadual no antigo MDB. De origem trabalhista, tornou-se grande amigo de Ulysses Guimarães, o líder da oposição legal ao regime militar. Por outro lado, virou adversário de Leonel Brizola, que havia voltado do exílio, a quem atribuiu a responsabilidade por sua derrota ao governo do estado nas eleições de 1982, que perdeu para o candidato do PDS, a antiga Arena, Jair Soares. Coordenou a campanha das Diretas Já e apoiou a eleição de Tancredo Neves à Presidência.

Com a morte do político mineiro, foi confirmado no cargo de ministro da Agricultura por José Sarney, que assumira a Presidência na condição de vice eleito no colégio eleitoral. Fora a testemunha da negociação política entre o general Walter Pires, ministro do Exército do último presidente militar, João Batista Figueiredo, e o presidente do PMDB, Ulysses Guimarães, que garantiu a posse de José Sarney e o fim do regime.

No ano seguinte, elegeu-se governador do Rio Grande do Sul, na onda eleitoral gerada pelo Plano Cruzado. Voltou ao Senado nas eleições de 1990 e foi um dos principais articuladores da campanha do impeachment de Fernando Collor, que renunciou ao mandato por causa das denúncias de corrupção no seu governo e das articulações para apeá-lo do poder. Líder do governo Itamar Franco, que assumira a Presidência, desde então destacou-se como um pregador da ética na política e derrubou vários ministros sob suspeita de corrupção, inclusive do seu próprio partido. Tornou-se adversário de Sarney e desafeto do atual presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL).

O patriarca
Mais longevo político brasileiro ainda em atividade, José Sarney controla o estado do Maranhão desde quando se elegeu governador pela primeira vez, em 1966, dois anos após o golpe militar, que apoiou. Ex-integrante da chamada UDN Bossa Nova, Sarney revelou-se um dos mais sagazes líderes políticos do país, capaz de se adaptar às circunstâncias e se antecipar aos fatos. Como agora, ao anunciar a aposentadoria, para evitar uma provável derrota eleitoral no Amapá, estado que adotou como uma espécie de "santuário eleitoral". mas que hoje é governador por um adversário, João Capiberibe (PSB).

Em 1985, na crise governista provocada pela escolha do ex-prefeito de São Paulo Paulo Maluf como candidato do PDS à Presidência da República, com o então governador do Rio Grande do Norte, José Agrpino, e o governador da Bahia, Antônio Carlos Magalhães, liderou a dissidência que apoiou Tancredo Neves. Porém, não se filiou PFL, mas ao PMDB, para ser o vice na chapa de oposição. Acabou assumindo a Presidência da República, com apoio dos militares e de Ulysses Guimarães.

Desafeto de Fernando Henrique Cardoso, em cujo governo foi marginalizado, tornou-se aliado de primeira hora do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, já na campanha eleitoral de 2002. Apoiou o governo Lula em todos os momentos, inclusive na crise do mensalão. Mantém boa relação com a presidente Dilma Rousseff, cuja reeleição apoia, e tem aliados em postos estratégicos da administração federal. Manteve seu prestígio no governo, mesmo depois que deixou a Presidência do Senado, com aliados em postos influentes, como é o caso do senador Edison Lobão (PMDB-MA), atual ministro de Minas e Energia. A governadora do Maranhão, Roseana Sarney (PMDB), é sua principal herdeira política, uma vez que o filho Zequinha Sarney (PV-MA) tem uma atuação mais focada em temas alternativos do que no jogo pesado do poder. Membro da Academia Brasileira de Letras, o patriarca sempre disse que gostaria de se dedicar mais aos romances.

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