domingo, 8 de junho de 2014

Resposta do Congresso Nacional às reivindicações foi tímida

• Boa parte dos pleitos não foi atendida, mas pressão das ruas gerou alguns avanços

André de Souza e Evandro Éboli – O Globo

BRASÍLIA - Um ano depois dos protestos de rua que sacudiram o país em junho de 2013, a resposta do Congresso Nacional às reivindicações não atendeu a boa parte dos pleitos. Os manifestantes queriam melhorias no serviço público em geral, mas poucas propostas andaram na Câmara e Senado e viraram lei. No calor da pressão, os congressistas chegaram a criar uma agenda positiva, mas ficaram na intenção.

Com os estudantes à frente, a garantia do passe livre foi uma das principais bandeiras dos atos no ano passado. Foram várias reuniões entre os representantes dos alunos com lideranças políticas. A proposta do passe livre estudantil foi apresentada em 25 de junho, dias após os protestos, por um grupo de senadores, tendo à frente o presidente da Casa, Renan Calheiros (PMDB-AL). Nada menos que 52 senadores são os autores desse projeto. Ainda assim, o texto está encalhado na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado. "Essa circunstância é especialmente dramática no caso dos estudantes, que, em geral, não têm fonte de renda própria e, com isso, restam prejudicados em seus deslocamentos casa-escola, com alguma frequência, tendo até que deixar de frequentar aulas por não ter como custear seu transporte", afirmam os 52 senadores na justificativa do projeto.

Tornar a corrupção um crime hediondo foi outra proposta que não vingou. Apesar de o projeto, do senador Pedro Taques (PDT-MT), ter sido apresentado em 2011, somente em julho de 2013, por conta das manifestações, a iniciativa foi aprovada pelos senadores e encaminhada à Câmara. Os deputados, porém, não deram celeridade ao tema. O projeto, hoje, aguarda entrar na pauta de votação no plenário.

Uma proposta que altera a Constituição previa a diminuição do número de suplentes de senadores e a proibição de que parente possa ocupar a suplência. Vários senadores hoje em exercício são suplentes, não receberam um voto sequer. A proposta, de 2011 e resgatada com os atos de rua, está parada.

Outro assunto da agenda positiva é o fim do foro privilegiado para autoridades em caso de cometerem crimes comuns. Se aprovado, os políticos com mandato responderiam pelo crime em instâncias inferiores. A partir do mensalão, porém, condenados e seus advogados, diante da dura punição do Supremo Tribunal Federal (STF), passaram a entender que direito a foro privilegiado pode ser um dissabor, já que não há outra instância para recorrer.

O fim do voto secreto em sessões de cassação de mandato de senadores e deputados acusados da quebra de decoro parlamentar, outro item das reivindicações dos manifestantes de 2013, foi um dos poucos que avançaram. O projeto foi aprovado, ainda que meses depois dos atos de junho. E também só andou após decisão da Câmara de não cassar o mandato de Natan Donadon (sem partido-RO), em agosto, quando já estava preso na Papuda. Nessa votação, com voto fechado, ele teve seu mandato preservado com 131 colegas a seu favor. Depois de aprovado o voto aberto, com o nome aparecendo no painel do plenário, em fevereiro deste ano, o apoio mingou. Em nova votação, Donadon não teve um voto a seu favor.

Em julho de 2013, o Congresso aprovou a Lei Anticorrupção, que pune empresas privadas acusadas dessa prática contra a administração pública. Pela nova legislação, são punidas empresas que oferecem vantagens indevidas, fraudam licitações e financiam atos ilícitos. Antes, só pessoas físicas podiam ser punidas.

Também foram aprovados mais recursos para a educação, com destinação de 75% dos royalties do petróleo para o setor e 25% para a saúde, além do fim de alguns impostos que incidem sobre o transporte público. Uma das principais bandeiras dos atos, a derrubada da PEC 37 - que limitava os poderes de investigação do Ministério Público em ações criminais - foi alcançada. Pressionados pelas ruas, alguns deputados chegaram a mudar de opinião sobre o tema.

A reforma política, que hiberna no Congresso, entra governo, sai governo, continua parada. A presidente Dilma Rousseff, após as manifestações, defendeu plebiscito sobre uma Constituinte exclusiva para a reforma política. Para a oposição, Dilma queria desviar a atenção de outros problemas. Assim, a reforma não saiu.

Uma questão polêmica que envolve governo e Congresso é a criação de uma lei para reprimir o radicalismo nas manifestações. O ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, chegou a dizer, em abril, que o governo apoiaria uma proposta relatada pelo senador Pedro Taques (PDT-MT) que aumenta as penas de crimes quando ocorrem em protestos. Na época, ficou acertado que o Executivo encaminharia a Taques sugestões para aprimorar o projeto, a tempo de aprová-lo antes da Copa do Mundo.

O Ministério da Justiça informou que já mandou contribuições a Taques, o que foi negado pelo senador.

- O governo não deu mais as contribuições e retirou apoio ao projeto - disse Taques, acrescentando: - Estou há um ano e meio trabalhando para a aprovação do projeto e não consigo colocar na pauta da CCJ (Comissão de Constituição e Justiça).

Dentro do governo, não há consenso quanto à proposta. Enquanto Cardozo dizia apoiá-la, o ministro da Secretaria Geral da Presidência, Gilberto Carvalho, interlocutor do governo com os movimentos sociais, falou o contrário. Em 15 de maio, Carvalho negou que haja apoio do governo e afirmou que a legislação atual dá conta de punir eventuais abusos.

Depois das ruas
Projetos aprovados no Congresso
Voto secreto: Palavra de ordem nas manifestações, o fim do voto secreto foi aprovado cinco meses depois no Congresso, em 28 de novembro. No caso de cassação de mandato, a medida ganhou força após decisão da Câmara de não cassar o mandato de Natan Donadon (sem partido-RO), em agosto. Naquele momento, o deputado já estava preso na Papuda.

Empresas corruptas: Em outra tentativa de responder às demandas das ruas, em julho de 2013, o Congresso aprovou a Lei Anticorrupção, que responsabiliza administrativa e civilmente empresas pela prática de atos contra a administração pública. Foi sancionada em agosto pela presidente Dilma Rousseff. A lei pune empresas que oferecem vantagens indevidas, fraudam licitações e financiam atos ilícitos. Antes, só pessoas físicas podiam ser punidas.

Dinheiro para educação: Também na pauta dos manifestantes, a educação foi contemplada com mais recursos. Foi aprovado projeto destinando 75% dos royalties do petróleo para educação e 25% para a saúde.

Imposto de transporte: O Congresso aprovou, em agosto de 2013, projeto que zera as alíquotas de alguns impostos sobre as receitas da atividade de transporte municipal. Foi sancionado por Dilma Rousseff em setembro.

Rejeitados ou parados

PEC 37: A derrota da PEC 37, que limitava os poderes de investigação do Ministério Público em ações criminais, também foi uma vitória dos manifestantes. Os parlamentares votaram de olho nas ruas. Na comissão especial, na Câmara, a proposta chegou a ser aprovada, em 2012, por 14 a 2. Mas, quando se deu a votação no plenário, oito destes mudaram de opinião. No total, apenas 9 votaram a favor. E 430 contra.

Reforma política. Após manifestações, a presidente Dilma defendeu a reforma política como uma saída para as mazelas políticas. Ela defendeu plebiscito sobre uma Constituinte exclusiva para a reforma política. A oposição acusou a presidente de usar a reforma política para desviar a atenção dos problemas reais do país. Sem empenho de parlamentares da base e da oposição, a reforma nunca andou.

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