terça-feira, 22 de julho de 2014

Traições elevam incerteza no Rio

Renata Batista – Valor Econômico

RIO - A existência de quatro candidatos ao governo estadual com chances concretas e a falta de um alinhamento claro com os candidatos à Presidência colocaram os analistas políticos fluminenses em alerta. Eles temem fazer previsões e apostam em uma corrida disputada para chegar ao segundo turno.

Na mesma situação, prefeitos e candidatos a deputados federais e estaduais prolongam a fase de negociação de alianças e fazem seus acordos à revelia do que já foi registrado na Justiça Eleitoral. Já a Procuradoria Regional Eleitoral também se prepara para analisar caso a caso a propaganda eleitoral gratuita.

"Não lembro de uma eleição tão confusa, com esse grau de fragmentação. Precisamos ver para onde caminham as alianças que ainda estão sendo feitas", diz o cientista político César Romero, da PUC-Rio.

São quatro os principais candidatos ao governo do Estado: o governador Luiz Fernando Pezão, em uma aliança com o PMDB e mais 17 partidos; o ex-governador e deputado federal Anthony Garotinho, que uniu PR, PTdoB e Pros; o senador Lindbergh Farias (PT, PV, PCdoB e PSB); e o senador Marcelo Crivella (PRB).

A presidente Dilma Rousseff conseguiu confirmar, na reta final, o alinhamento com os quatro. Tem o PMDB em nível nacional e a promessa de apoio de Pezão no local; o compromisso de Garotinho e Crivella; e Lindbergh, candidato de seu próprio partido. Tudo isso apesar do rompimento dos partidos da base no Rio de Janeiro, das articulações do presidente regional do PMDB, Jorge Picciani, para apoiar o presidenciável do PSDB, senador Aécio Neves (MG), e da aliança entre o PT local e o PSB de Eduardo Campos. "O problema é que o grau de traição também está alto", resume Romero.

Exemplos não faltam. Depois de anunciar apoio a Pezão, mas romper a coligação formal com o PMDB por se opor à coligação que deu a vaga ao Senado para o ex-prefeito Cesar Maia (DEM), o presidente do PDT, Carlos Lupi, interveio no diretório do partido em São João do Meriti e deu posse a um novo diretório. Motivo: o prefeito Sandro Matos, principal liderança local, rompeu com o PDT para apoiar Lindbergh. Lupi não quer o candidato petista, embora apoie Dilma e tenha se lançado ao Senado para dar palanque à presidente, que não tinha um candidato no Estado. Na chapa de Lindbergh, a vaga de senador ficou com Romário, do PSB, legenda que tem o ex-governador Eduardo Campos como candidato à Presidência.

"Sem alinhamento na esfera federal e com essas alianças suprapartidárias, os movimentos no plano municipal são díspares. São 92 municípios, cada um com um interesse", diz Romero, para quem o tradicional rótulo de esquerda e direita também não ajudará a clarear a situação. "O Lindbergh diz que está à esquerda, mas o PMDB de Pezão pode dizer que está com Dilma."

Em outro exemplo de traição, a ala do PMDB que diz estar com Dilma, a do ex-governador Sérgio Cabral, flerta com o grupo que apoia Aécio. Em um panfleto do candidato a deputado estadual Marcelo Queiroz (PP), a chapa completa traz Pezão para governador, Aécio para presidente e Marco Antonio Cabral, o mesmo que esteve no evento do PDT que apoia Dilma, para deputado federal. O espaço de senador - que deveria ser de Cesar Maia - está em branco.

"O diálogo foi deixado às margens do bom senso para entrar em disputas pessoais", disse o candidato do PRB, senador Marcelo Crivella, último a anunciar sua chapa pela dificuldade em formar uma aliança. "Mostramos nossa viabilidade eleitoral, mas o processo político no Rio entrou em convulsão", completa.

Pesquisa realizada pelo Datafolha nos dias 15 e 16 de julho aponta Garotinho e Crivella empatados na liderança da disputa, com 24% das intenções de voto. Pezão e Lindbergh estão empatados tecnicamente na terceira posição, com 14% e 12%, respectivamente, uma vez que a margem de erro do levantamento é de três pontos percentuais para mais ou para menos. Chama atenção ainda a rejeição dos candidatos. A mais alta é de Garotinho, 39%. Crivella tem 16%; Pezão, 19%, e Lindbergh, 17%. Com exceção de Crivella, todos os outros registraram índices de rejeição maior do que a intenção de voto.

"A rejeição é alta, mas não é igual para todos os candidatos. Em alguns casos, tem mais a ver com desconhecimento e pode diminuir, principalmente quando a campanha eleitoral gratuita na TV começar", explica o cientista político da empresa de pesquisa Informa, Fábio Gomes.

Para Crivella, as alianças locais, qualificadas de "bacanal eleitoral" pelo prefeito do Rio, Eduardo Paes (PMDB), foram motivadas pela preocupação com o tempo de TV. Nessa disputa, Pezão - que também tem a máquina, sai na frente, com quase nove minutos. Lindbergh tem cerca de quatro minutos e meio. Garotinho fica com dois minutos e meio e Crivella, com pouco mais de um minuto. "Bacanal é essa disputa por tempo de televisão. Eles acham que isso decide eleição. Mas no segundo turno, o tempo é igual. Os dois candidatos têm dez minutos", diz Crivella.

De acordo com a Justiça Eleitoral e com Ministério Público Eleitoral (MPE), as avaliações serão feitas caso a caso. Para a procuradora e professora da Faculdade de Direito da Fundação Getulio Vargas (FGV) Silvana Batini, o maior problema será definir quem pode aparecer na propaganda eleitoral de quem, já que há candidatos que se declaram aliados e não são coligados, e outros que são coligados, mas não se declaram aliados. "O tipo de confusão que se criou vai ser difícil de disciplinar. Ninguém sabe o que fazer. Nenhuma legislação previu a bagunça que está acontecendo", diz Batini.

De acordo com o MPE-RJ, além da proibição de uso de imagens externas, gravações de inaugurações realizadas por um candidato não poderão ser usadas na campanha de outros sem que haja uma coligação formal. Já a exibição de trechos de discursos, "é possível, mas cada caso precisa ser analisado individualmente", informou o MPE.

Para Silvana, que atuou como procuradora eleitoral em eleições passadas, o legislador deverá seguir dois princípios gerais: preservar a clareza, de forma geral, e a fidelidade partidária nos termos entendidos pelo Supremo Tribunal Federal (STF). "As regras são criadas para preservar a clareza para o eleitor. Provavelmente, será decidido caso a caso, mas é importante que haja preocupação em seguir o princípio de não confundir o eleitor", diz.

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