domingo, 31 de agosto de 2014

Luiz Carlos Azedo: As elites e Marina

• O quadro de estagnação da economia, os desgastes do PT no poder, as dificuldades da presidente Dilma Rousseff no trato com os aliados e com o mundo empresarial… São diversas as dificuldades para o continuísmo.

Correio Braziliense

Deve-se ao alemão Robert Michel, ao lado de Gaetano Mosca e Vilfredo Pareto, pais da sociologia política, os primeiros estudos sobre o comportamento dos partidos políticos e suas elites intelectuais. Radicado na Itália, ensinou economia, ciência política e sociologia nas universidades de Turim, Basileia e Perugia.

Desencantado com o Partido Social-democrata Alemão, Michel estudou a burocratizarão dos partidos operários e dos sindicatos de trabalhadores. Aplicou ao fenômeno o conceito de oligarquia que havia sido desenvolvido por Mosca, para quem essa era a principal característica da classe política da época, e Pareto, que via a “circulação das elites” de forma equivalente ao conceito marxista de classe dominante.

Havia certo consenso político sobre o conceito. Na década de 1960, porém, o pau quebrou na academia por causa de uma polêmica entre os sociólogos Wrigth Mills e Robert Alan Dahl sobre a política dos Estados Unidos, cujo governo, na opinião do primeiro, seria controlado por uma elite unitária e restrita.

Mills foi contestado por Dahl, para quem haveria muitas elites capazes de operar tanto em situações de conflito quanto de compromisso, uma vez que os governos eram formados em contextos competitivos e inclusivos, ou seja, por meio de escolhas eleitorais.

Desde então, na sociologia, elite passou a ter uma dominação ampla, designando grupos de indivíduos em posições estratégicas — de partidos, instituições e entidades — e com poder de decisão. É mais ou menos esse o sentido dado ao conceito por Marina Silva ao afirmar que Chico Mendes, o seringueiros assinado no Acre, que foi seu parceiro de lutas, também fazia parte das elites do país.

Divisor de águas
A candidata do PSB fez essa afirmação ao ser questionada durante uma entrevista de televisão sobre as dificuldades que teria para governar o país, se eleita, por pertencer a uma pequena coligação e defender novos paradigmas para a governabilidade e a sustentabilidade econômica.

Abriu, porém, uma grande polêmica na campanha eleitoral sobre a natureza das elites brasileiras e seu papel na vida nacional, que não é nova, mas estava sendo tratada de forma muito maniqueísta. Marina se vê diante de uma situação na qual as principais elites do país estaria aliadas ao PT ou ao PSDB.

Supostamente, o governo Dilma representaria o povo, e a oposição, encabeçada por Aécio Neves (PSDB), as elites do país. Essa era a lógica perversa do “nós contra eles” que acabou ultrapassada pelos fatos.

Quem vai governar?
A discussão sobre quem reúne melhores condições do governar o país, num regime presidencialista como o nosso, eleitoralmente, passa pelo confronto de propostas e de imagens dos candidatos. E pela correlação entre tudo isso e a realidade social em que vivemos.

Mas, do ponto de vista institucional, exige um complexo amplo de relações entre as diversas elites do país, quando nada com a parlamentar, a magistratura, a diplomacia e os militares, que fazem parte do chamado “poder instalado” .

Além disso, na esfera da sociedade, empresários, lideranças sindicais, intelectuais, cientistas e artistas também são protagonistas do que seria uma nova política, cada qual com suas próprias elites. Como esses atores estão se posicionando diante desse novo e complexo cenário?

Há quatro semanas do dia de votação, a eleição aponta para a alternância de poder, o que parecia inimaginável um ano atrás. O quadro de estagnação da economia, os desgastes do PT no poder, as dificuldades da presidente Dilma Rousseff no trato com os aliados e com o mundo empresarial… São diversas as dificuldades para o continuísmo.

A grande incógnita da mudança, porém, não é a nova política — que pode ser apregoada por Marina Silva por meio de gestos e de palavras —, mas se a nova elite seria capaz de governar o país em caso de vitória da oposição. Trata-se de um conceito em busca de lideranças de carne e osso.

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