terça-feira, 30 de setembro de 2014

Sob orientação do PT, Marina votou contra a CPMF quatro vezes no governo FHC

César Felício, Marina Falcão e Cristiane Agostine – Valor Econômico

SÃO PAULO, CARUARU (PE) e RECIFE - Ao contrário do que afirmou em entrevistas e debates, a candidata do PSB à Presidência, Marina Silva, jamais votou contra a orientação da bancada do PT no Senado, seu antigo partido, quando esteve em pauta temas relacionados à CPMF, o extinto imposto sobre transações financeiras para financiar a saúde.

Marina disciplinadamente votou com sua bancada pela rejeição da emenda constitucional que criava o imposto em 1995 e na sua prorrogação, em 1999. Em todos os momentos da tramitação das diversas emendas no Congresso, Marina não fez uso da palavra para discutir o assunto.

No último ano do governo Fernando Henrique, em 2002, quando o imposto foi mais uma vez prorrogado, Marina não registrou presença para votar, mesmo estando em plenário, o que equivale a uma abstenção. Naquela votação a bancada do PT registrou uma dissidência, a do senador Eduardo Suplicy (SP), que votou a favor da emenda.

A presidente Dilma Rousseff tem explorado as contradições de Marina em relação ao assunto. No debate de domingo à noite na TV Record, a presidente se disse "estarrecida" com o que classificou de falta de clareza da sua principal oponente.

Ontem, a campanha de Marina divulgou uma nota oficial em que nega que Marina tenha sido contra a criação do tributo. Cita como argumento ter sido favorável às propostas que vinculavam a aplicação do recurso para a saúde. Mas nem mesmo nestas circunstâncias Marina desobedeceu propriamente a orientação do PT

Em 1996, o Senado aprovou a regulamentação do tributo, em votação simbólica, com manifestação contrária do então senador Fernando Bezerra (PMDB-RN), presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI) à época. O então líder petista José Eduardo Dutra (SE) encaminhou a votação a favor e Marina não se manifestou.

Três anos depois, Marina apoiou a tramitação de uma emenda constitucional do senador Antonio Carlos Magalhães (1927-2007), do PFL, criando um Fundo de Combate à Pobreza, que seria alimentado com recursos de diversos tributos, inclusive da CPMF. A nota afirma que Marina apoiou o projeto porque "considerava a iniciativa importante para avançar no combate à desigualdade social" e que o PT teria se oposto pelo projeto "ser de autoria de um histórico adversário político".

A senadora, entretanto, terminou votando contra o projeto no plenário do Senado, em 2000. Marina discordou publicamente do relatório preparado pelo então senador Lúcio Alcântara (PSDB-CE), e para isto usou da tribuna do Senado. O substitutivo de Alcântara diminuía pela metade os recursos do fundo.

"Esse movimento é que vem sendo exposto de forma distorcida na propaganda política do PT. Com dados parciais retirados do contexto inventa-se e repete-se uma mentira. Manobra de quem perdeu a cabeça e as medidas. Manobra de desesperados", disse a nota.

Em visita a Caruaru (PE), Marina antecipou as posições que seriam depois formalizadas na nota: afirmou ter sido a favor da CPMF em defesa de recursos para um fundo de combate à pobreza, mas que assumiu uma posição contrária em relação ao tema quando o texto foi alterado em plenário. "Naquela oportunidade defendi sim a CPMF. Fiz um debate na comissão e convenci os parlamentares do PT que eram contra que votassem favoravelmente. Quando houve a mudança foi que votamos contrário", disse.

Durante o comício, Marina atacou o adversário Aécio Neves (PSDB) dizendo que ele só apresentou o seu programa de governo de última hora porque sabe que não vai dar tempo do documento ser debatido.

Um pouco antes, Marina foi questionada por jornalistas sobre um eventual apoio do candidato tucano no segundo turno. "Segundo turno debatemos no segundo turno", afirmou. Marina disse ainda que não tratará Aécio como se ele fosse uma "linha auxiliar" da sua candidatura: "Não vou fazer com ele o que ele tentou fazer comigo".

Marina disse que um dos seus compromisso, caso eleita, é recuperar a eficiência da Petrobras e evitar que a diretoria da empresa seja submetida à política de "toma lá, dá cá". Ela disse lamentar que a empresa, que antes ocupava publicações científicas, hoje não consiga sair das páginas policiais.

A candidata também afirmou que vai honrar os compromissos que o atual governo não tem cumprido em relação ao Nordeste. Segundo Marina, as obras da ferrovia Transnordestina e da transposição do Rio São Francisco são prioridades. "O valor da obras da transposição começou em R$ 8 bilhões. Praticamente dobrou e obviamente que isso é falta de planejamento". Disse ainda que a presidente gosta "de se apropriar dos feitos alheios quando dão certo e não assume suas responsabilidades quando algo dá errado".

À noite, no Recife, Marina participou de um grande ato político com a família do ex-governador Eduardo Campos, morto no mês passado. A viúva Renata e quatro dos cinco filhos do casal dividiram o palanque com a presidenciável, que trouxe consigo Shalom, uma de suas três filhas. Marina tem ainda um filho.

Durante todo o ato político, Renata ficou abraçada com seu filho José, de 9 anos. João Campos, filho mais velho do casal, discursou por 11 minutos e lembrou um político profissional. No palco, João chamou os candidatos do PSB no Estado, Paulo Câmara, que disputa o governo de Pernambuco, e Fernando Bezerra, que tenta uma cadeira no Senado.

João lembrou de seu pai e de seu avô Miguel Arraes, que também governou Pernambuco, e disse que os dois políticos foram homens à frente de seu tempo. "Cada um em seu tempo fez o possível em seu Estado e, como meu avô dizia, o impossível o povo ajudou a fazer", afirmou. João agradeceu a Deus por aproximar seu pai de Marina Silva, "uma mulher de origem humilde, que veio do seringal do Acre". "Infelizmente nosso líder, meu pai, nos deixou, mas fico muito feliz de ver que meu pai se transformou no que esperava, nos seus ideais e nos seus sonhos", disse. "Tenho certeza de que vocês vão subir a rampa do Palácio do Planalto com a bandeira do legado de Campos". Foi a primeira vez que a viúva de Campos viu seu filho mais velho discursar.

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