sexta-feira, 10 de outubro de 2014

Delação detalha fatiamento de propinas dentro da Petrobras

Organograma da corrupção

• Delatores detalham como funcionava esquema que abasteceu campanhas de PT, PP e PMDB

Cleide Carvalho e Germano Oliveira – O Globo

SÃO PAULO - O áudio dos depoimentos de Paulo Roberto Costa, ex-diretor de Abastecimento da Petrobras, e do doleiro Alberto Youssef à Justiça Federal, ao qual o GLOBO teve acesso, revela em detalhes o loteamento político e a sangria de recursos impostos à estatal. O esquema de corrupção, disseram, era chefiado pelo PT, que arrecadava a maior parte das propinas. Segundo Youssef, o esquema vingou porque o presidente Luíz Inácio Lula da Silva cedeu à pressão de políticos para emplacar o nome de Costa, uma indicação do deputado José Janene (PP-PR), morto em 2010, entre os diretores da estatal. Para forçar Lula a ceder, esses "agentes políticos", segundo Youssef, trancaram a pauta do Congresso por 90 dias, no primeiro semestre de 2004. O esquema de propina delatado por eles entrou em vigor em setembro de 2005, cerca de dois meses depois do então deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ) denunciar o mensalão.

- Na época, o presidente Lula ficou louco (com a obstrução parlamentar) e teve de ceder e empossar Paulo Roberto Costa na Diretoria de Abastecimento - disse Youssef.

O PT cedeu na Diretoria de Abastecimento, mas ficou sozinho com três das cinco diretorias que, segundo Costa, superfaturavam contratos da estatal em até 20% para retirar um percentual de 2% a 3% para os políticos. O ex-diretor afirmou que o PT comandava o esquema de propina nas diretorias de Serviços, Exploração e Produção e Petróleo e Gás, abocanhando sozinho a comissão. Na diretoria de Abastecimento, o PT ficava com 2%, e o PP e o PMDB dividiam o 1% restante. Já a Diretoria internacional era comandada pelo PMDB.

Graças à delação premiada de Costa, acompanhada por Youssef, a Justiça detalhou o funcionamento do esquema na Diretoria de Abastecimento. Costa era o negociador dos contratos, com poder de vetar qualquer um que ferisse o interesse dos políticos do PP. Na maioria das vezes, recebia pronta a lista das empresas que participariam das licitações e o nome da futura vencedora. Os valores da negociata e da propina eram discutidos em reuniões, com participação dos "agentes políticos" ou de seus representantes. Pelo PT, negociava João Vaccari Neto, tesoureiro do partido, e pelo PMDB, o lobista Fernando Soares, conhecido como "Fernando Baiano". Pelo PP, até 2010, o responsável era o deputado José Janene. Com sua morte, Youssef e Costa passaram a negociar em nome do partido.

O doleiro afirmou que as reuniões ocorriam geralmente em hotéis do Rio ou de São Paulo e, muitas vezes, na casa dos próprios políticos envolvidos. Os encontros eram formalizados em atas, uma forma de garantir que o compromisso das empresas fosse cumprido.

Para receber o dinheiro de pelo menos 13 empresas, entre elas algumas das maiores empreiteiras do país, Youssef criava firmas de fachada. O dinheiro saía do cofre das fornecedoras da Petrobras legalmente, com nota fiscal e contratos de prestação de serviços que nunca foram efetivamente prestados.

Era o doleiro quem repartia a propina. Os políticos recebiam sua parte em dinheiro vivo. Na lista de beneficiados em poder do Ministério Público Federal e do Supremo Tribunal Federal (STF), devido ao foro privilegiado dos envolvidos, estão nomes de governadores, senadores e deputados federais. Na Diretoria de Abastecimento, 60% da comissão paga pelas empreiteiras e empresas parceiras se destinavam a políticos. Costa ficava com 30%, e os 10% restantes eram divididos por Youssef e por João Cláudio Genu, já condenado a cinco anos de prisão no julgamento do mensalão. Os políticos exerciam controle ferrenho. Youssef contou que se reunia quase diariamente com eles. Costa citou no depoimento a oração de São Francisco para explicar o esquema na estatal:

- É dando que se recebe.

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